A Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed) autorizou, no ano passado, 843 pedidos de alterações substanciais a ensaios clínicos, o número mais elevado de sempre, num aumento de 53% face a 2018.
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Sendo que, no nosso país, os medicamentos experimentais utilizados nos ensaios clínicos são maioritariamente classificados como antineoplásicos e imunomoduladores, desempenhando um papel fundamental no tratamento de cancro e de doenças autoimunes.
Depois de iniciar um ensaio clínico, o promotor - 90% são patrocinados pela indústria farmacêutica - pode introduzir alterações. Quando são substanciais, isto é, quando, de acordo com o Registo Nacional de Estudos Clínicos, "tiverem incidência na segurança dos participantes ou alterem a interpretação das provas científicas em que se baseia a realização do ensaio clínico", carecem de autorização do Infarmed e/ou parecer da Comissão de Ética para a Investigação Clínica.
Da dosagem aos participantes
Questionado pelo JN, o Infarmed elencou três alterações que estão entre as mais requisitadas. A começar pela metodologia do ensaio clínico: a título exemplificativo, se entenderem ter de alterar as visitas entre participantes e médicos, previamente programadas.
É aquilo a que, explica ao JN a diretora do Departamento de Ensino, Formação e Investigação do Centro Hospitalar da Universidade do Porto, se designa por protocolo, "documento que descreve os objetivos, a metodologia e toda a organização de um ensaio clínico". Sendo que, sublinha Luísa Lobato, "podem ter de sofrer modificações, versões diferentes, algumas delas consequência da descrição de reações adversas".
Em segundo lugar, prossegue o Infarmed, temos "a informação clínica e não clínica base que sustentam a utilização do medicamento experimental em ensaio". Em que no caso da clínica poderemos estar a falar de uma alteração de dosagem e na não clínica de informação recolhida de testes realizados em animais e que entretanto foi atualizada no decorrer do ensaio. Por último, tudo o que tenha a ver com a " informação sobre o fabrico do medicamento experimental". Por exemplo, a intenção do promotor alargar o tratamento a uma nova população.
Como frisa Luísa Lobato, "um ensaio clínico implica um controlo rigoroso de todas as alterações que se passem com o participante (doente)". Situações como "as mudanças do investigador principal" ou "alterações do promotor". Sendo que, afirma, "as reações adversas que justifiquem um ajuste do protocolo não são uma raridade e o procedimento obrigatório é apresentar esta proposta de ajuste ao Infarmed".
Lembrando o Infarmed que "a rápida evolução da investigação clínica conduz a novo conhecimento que é continuamente integrado nestes documentos que sustentam a realização do ensaio clínico", sendo que "sempre que isso acontece são submetidas alterações". Ao Infarmed compete, assim, verificar se se mantêm as "condições de benefício/risco" e "se possibilitam a continuação de recolha de dados sobre a hipótese em estudo com a manutenção da segurança e bem estar dos participantes no ensaio clínico".
Outros dados
Ensaios clínicos
No período em análise, o Infarmed autorizou 142 ensaios clínicos, tendo melhorado o tempo médio de decisão em seis dias para os 34 dias. Assim, 85% dos pedidos foram autorizados dentro do prazo. Desde 2015, o Infarmed autorizou a realização de 1761 ensaios clínicos.
Oncologia
Em 2019, verificou-se um número mais elevado de ensaios clínicos autorizados nas áreas de oncologia (53, no total) e sistema nervoso central (27) e um aumento do número de ensaios clínicos submetidos de fase I e de fase IV. Dos 142 ensaios autorizados, 90% eram promovidos pela indústria.