André Ventura Candidato ataca o presidente da República por ter acusado a ministra da Saúde de ter mentido na questão das vacinas da gripe, sem que isso tenha provocado a sua saída. Líder do Chega defende demissão de Eduardo Cabrita
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André Ventura afirma que Marcelo Rebelo de Sousa foi desautorizado pelo Governo, porque assumiu que Marta Temido mentiu na questão das vacinas contra a gripe e a ministra da Saúde não foi demitida. Diz que também foi manipulado, com os decretos dos estados de emergência. O candidato e líder do Chega defende, ainda, que Eduardo Cabrita deve sair. E declara-se orgulhoso por ter ao seu lado Marine Le Pen.
Como é que um católico que quer ser presidente da República passa a vida a "espingardar" contra uma comunidade, como a de etnia cigana?
Eu não "espingardo" contra uma comunidade. Entendo que essa comunidade, em termos de padrão de comportamento, tem questões difíceis face ao Estado de direito que recusa cumprir. As pessoas sabem isso. Só que têm medo de dizer, por causa do politicamente correto. Eu não tenho. Temos tribunais a aceitar que crianças possam ser retiradas da escola aos 12 anos por considerar que isso é cultura ou tradição. Não aceito isso num Estado de direito! Se fosse a minha filha, provavelmente teria problemas com a Justiça. As crianças não podem ser retiradas da escola aos 12 anos, só porque são ciganas! As meninas não podem casar aos 12 anos, só porque são ciganas! Não podemos ter uma comunidade em que só 15% vivem dos rendimentos do trabalho.
Se for eleito, também vai ser presidente da comunidade cigana? É que já disse que a comunidade está entre "os que vivem à custa do sistema"...
Dos ciganos que vivem à conta do sistema, não serei. Serei o presidente dos ciganos que trabalham, que se inserem, pagam impostos e contribuem. E não é só dos ciganos. Não serei o presidente de todos que vivem à conta, deliberadamente, do Estado. Não serei o presidente dos pedófilos nem dos terroristas.
Um cidadão foi morto por inspetores do SEF e a sua reação foi que o SEF "está a ser humilhado". E responsabilizou Eduardo Cabrita. Como presidente, vai pressionar António Costa a demitir Cabrita?
Sim. Eduardo Cabrita devia sair do Governo. Politicamente, está muito fragilizado. É um desastre como ministro e está desautorizado. Já achava isso quando Eduardo Cabrita reagiu como reagiu ao caso do bairro da Jamaica, quando sistematicamente se põe ao lado dos bandidos contra a Polícia, quando desautoriza a Polícia... No caso das golas, ficou muito pouco claro o que se terá passado. Neste caso do SEF, mostrou total desorientação novamente. Temos um ministro que deixa um diretor nacional da Polícia ir à Presidência da República e dizer que está a ser estudada a fusão das polícias, em articulação com o MAI. Depois, apercebe-se da escorregadela e deixa o diretor nacional da Polícia isolado. Agora, ou o diretor nacional da Polícia sai por ter inventado uma história ou o ministro está a mentir e tem que se demitir.
Outra ministra criticada é Marta Temido. Marcelo, ao admitir que os portugueses foram enganados na vacina contra a gripe, não estava a pressionar a saída da ministra? Concorda, Temido deve sair?
Mais um desastre de comunicação. Marcelo Rebelo de Sousa sempre quis ser cúmplice do Governo. Todos vimos as pressões que fez para aprovar os orçamentos, para segurar o Governo nas situações mais difíceis. Agora, vê-se em campanha e toca a tentar mudar o disco. Marcelo, com a lei da nacionalidade e com a questão da ministra da Saúde, procurou dar uns trunfos à Direita e saiu-lhe mal. Não teve nenhuma consequência. Mostra até que um presidente pode ser desautorizado. Num dia em que um presidente aparece a dizer que uma ministra mentiu, enganou, no dia a seguir a ministra tem que sair! Quando foi dos incêndios, as palavras de Marcelo Rebelo de Sousa foram fundamentais para a saída de Constança Urbano de Sousa. Aqui, parece que as palavras de Marcelo já valem menos.
E a forma como Marcelo tem gerido a pandemia e os sucessivos decretos de estados de emergência parece-lhe a mais correta?
A primeira fase foi um desastre. Misturou a hipocondria dele com a questão da doença. Depois, houve um momento em que Marcelo apelou ao consenso nacional e, aí, acho que esteve francamente bem. Quando chegou ao fim, falhou novamente, porque não foi capaz de perceber que o Governo estava a manipulá-lo em matéria de restrições. Marcelo falhou ao não ser o presidente capaz de ter uma conversa com o Governo para saber o que ia ser feito. Não o fez porquê? Porque tem medo. Acha que a sua viabilidade política está, intimamente, ligada à viabilidade política do Governo.
Ao assumir que luta com Ana Gomes pelo segundo lugar, não está a admitir que não tem hipóteses de ganhar? Nesse caso, porque concorre?
Se acho que é possível vencer à primeira volta? Não. À segunda, sim. Porque somos dois. E, numa segunda volta, as pessoas votam também naquele com o qual não se identificam, mas que é o mal menor.
"Tenho muito orgulho em ter Marine Le Pen ao meu lado, em Lisboa"
O acordo PSD/Chega nos Açores é repetível a uma escala nacional?
Não ponho completamente de fora uma coligação com o PSD. Acho que o PSD está disponível e que o Rio concorda comigo em muitas coisas, como na redução do número de deputados e da subsidiodependência, além das penas mais elevadas. Por isso, acho possível um dia termos um Governo PSD/Chega. Mas tem que ser um Governo de rutura.
Exigiu um pedido de desculpa de António Costa por ter apelidado o Chega de "partido de extrema-direita xenófoba". Mas, quando se coloca ao lado de Marine Le Pen, que ideologia está a defender?
O Chega fez uma proposta sobre o abate de animais para fins religiosos, em atordoamento, ou seja, é feito um corte e os animais ficam a morrer como parte de um ritual religioso. Diz-se que o Chega estava a replicar uma proposta da Alemanha Nazi de 1933. Isso seria o mesmo que eu dizer que a eutanásia replica uma proposta da União Soviética de 1939 ou de 1941. Esta diabolização permanente do Chega é maldosa, é intencional e é apenas para meter medo às pessoas. Estive com o Salvini, em Itália. Tem ideias como eu de que a Europa não pode ficar descontrolada, em matéria de imigração. Isto é responsabilidade. Extrema-direita é apelar à violência contra estas pessoas. Coisa que nunca vi o Salvini fazer, o Chega nunca fará e nunca vi a Marine Le Pen fazer. Marine Le Pen estará comigo em Lisboa e eu orgulho-me muito disso.
Se a crise económica se agravar, prefere aumentar os impostos sobre os mais ricos ou penalizar todas as classes?
Pela lógica, os mais ricos devem pagar mais. O problema é que, em Portugal, já temos impostos absurdos. Preferia uma solução de corte da despesa do que de aumento de tributação. Sei que é difícil. Terá que ser feita uma reestruturação da despesa do Estado. Algum investimento público, em matéria de obras públicas e em alguns setores menos urgentes e prioritários, teria que ficar para trás.
Como se posiciona em relação a casos como a TAP, o Novo Banco e os CTT?
O que puder funcionar bem no mercado deve estar no mercado. A privatização dos CTT trouxe vantagens evidentes. Na TAP, a última solução é deixar falir. Devemos salvar a TAP, mas não devem ser os contribuintes a pagar totalmente esse esforço. Devemos procurar parceiros, uma sinergia europeia e não chinesa, que torne a TAP uma empresa sustentável, com capitais privados e não como uma empresa totalmente pública. Isso seria criar um novo cancro como o Novo Banco.
No campo da Saúde, defende um SNS forte ou que os privados tenham também um papel?
Defendo que o Serviço Nacional de Saúde deve ser forte, mas, se pudermos ter um serviço privado de saúde acessível e igualmente forte, é sempre melhor.
E na energia elétrica e na água, os privados podem substituir-se ao Estado?
O grande erro, quer na água, quer na luz, está nos momentos iniciais, em que foram criadas margens muito amplas para os operadores. Há uma coisa que deixo clara. Não gosto de ver a China, pouco a pouco, a tomar controlo de setores estratégicos em termos de energia. Preferia que estivesse nas mãos de europeus.
Curtas
Mudaria a lei da caça para se evitarem mais chacinas como a da Azambuja?
Sim. Não podemos voltar àquilo a que assistimos ali. Eu, pessoalmente, fiquei horrorizado. Sou um grande defensor dos animais. Respeito muito a atividade da caça, mas ali houve uma chacina. Fez bem o Ministério Público em abrir um inquérito. Uma sociedade que trata mal os animais diz muito de si própria e o que aconteceu neste caso merece uma ação firme do Estado.
Eutanásia: sim ou não. Porquê?
Sou contra a eutanásia, como princípio. É um tema muito, muito difícil. Compreendendo os argumentos de quem passou por situações muito difíceis com familiares, mas é muito difícil a um político fazer um juízo sobre o sofrimento. Qual é o meu medo? Que uma lei genérica, porque a lei tem que ser geral e abstrata, crie condições para que isto vá deslizando... Como presidente, só promulgaria a lei da eutanásia caso fosse muito bem regulamentada e ficassem bem claros os limites a partir dos quais não se pode flexibilizar a eutanásia.
Devia ser proibido o acesso ao Exército a pessoas que mudaram de sexo?
Tenho dúvidas sobre isso. Mudar de sexo exige toda uma transformação emocional e hormonal, que eventualmente é pouco compatível com padrões militares.
Concorda com a legalização do consumo recreativo da canábis?
Sabendo que, para efeitos medicinais, há elementos que podem ser fundamentais, essa separação tem que ser feita. Tudo o resto, tudo o que seja aumentar, flexibilizar, liberalizar, a presença de drogas na sociedade, o Chega estará sempre no lado contrário. Não se chega às drogas duras de qualquer maneira. Chega-se, dando-se um passo de escalada nas drogas.
Fica chocado quando lê sobre casos de pedofilia na Igreja?
Fico. E acho que devem ter o mesmo tratamento que todos os outros: castração química. A pedofilia é ignóbil, é destruir uma vida antes de haver uma personalidade formada. Não me chocaria que um pedófilo condenado por ter abusado de 30 ou 40 crianças ficasse preso a vida toda. A mesma solução que aplicaria a qualquer criminoso, aplicaria a um membro da Igreja Católica. E até seria mais grave, porque quem respeita Deus não pode fazer mal a crianças.