Marcelo mantém reserva e só fala após Conselho de Ministros de sábado. Governo segue Europa e acelera rumo a restrições duras no pós-calamidade.
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Quase oito meses depois, António Costa volta a estar sob pressão para adotar medidas musculadas que consigam travar a multiplicação dos casos de covid que, mais uma vez, tem no Norte o primeiro sinal de alerta nesta segunda vaga. Do recorde de 3960 novos infetados registados na quarta-feira em Portugal, 53% reportam-se àquela região, de onde surgem apelos ao Governo para que se instaure um recolher obrigatório.
Se há 15 dias, em Aljezur, Marcelo Rebelo de Sousa foi o primeiro a equacionar um regresso ao estado de emergência - que constitucionalmente permite ao Governo restringir várias liberdades -, agora é o primeiro-ministro a dar passos nesse sentido: convocou os partidos para sexta-feira em São Bento, antes de um Conselho de Ministros extraordinário no sábado para "tomar novas medidas de controlo da pandemia".
Vários elementos do Executivo deixaram no ar que restrições mais duras serão inevitáveis a partir das zero horas de 4 de novembro, quando termina a situação de calamidade. A ministra da Saúde já tinha admitido um pico de internamentos por covid-19 dentro de sete dias. Na quarta-feira, o secretário de Estado da Saúde, Lacerda Sales, reafirmou que "estamos numa fase crítica". Horas depois, o Governo estava a ouvir os epidemiologistas das reuniões do Infarmed e esta quinta-feira segue com audições.
Dissipar dúvidas legais
Em cima da mesa está a possibilidade de um novo estado de exceção - igual ao que vigorou um mês e meio, de março a maio -, para não haver dúvidas legais sobre restrições a direitos específicos impostas após o fim da situação de calamidade, disse, ao JN, fonte do Governo. Podem ser medidas específicas para setores económicos e de controlo de movimentos juvenis, como pediram ontem os autarcas do Grande Porto [ler pág. 6], e a inibição do direito à greve (recorde-se que há uma paralisação de enfermeiros marcada para de 9 a 13 de novembro). Mas jamais haverá um regresso a um confinamento, realçou a mesma fonte.
O assunto terá estado na reunião semanal do chefe de Estado com Costa (antecipada devido à reunião do Conselho Europeu de hoje). Mas Marcelo Rebelo de Sousa, a quem compete pedir ao ao Parlamento a convocação do estado de exceção, tenciona manter para já o silêncio, resguardando-se de iniciativas públicas - para "dar o exemplo" aos portugueses.
Findas as audições de quarta-feira em Belém, por onde passaram as personalidades que tutelaram a saúde pública nos últimos 20 anos e organizações do setor, Marcelo não falará antes do Conselho de Ministros, apurou o JN. O guião de Belém será igual ao de 17 de março, quando o Governo discutiu a implementação do primeiro estado de emergência e Marcelo só se pronunciou depois, apontaram fontes ligadas a este processo. Ao JN, o constitucionalista José Fontes defendeu que o facto de ser um Governo de Esquerda não deve inibir a declaração do estado de exceção. "António Costa não tem de recear o cumprimento de regras, em vez de insistir em medidas restritivas de liberdades sem estar a coberto do texto constitucional", defendeu.
Portugal pode seguir a linha dura de alguns países europeus, como a Alemanha e a França. António Costa reúne esta quinta-feira com os seus homólogos por videoconferência, onde será discutida a estratégia conjunta contra a segunda vaga. Na quarta-feira, a líder da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, já admitiu que o Natal poderá ter um formato diferente.
