Ordens dos médicos e dos Psicólogos Portugueses têm dois meses para se pronunciarem. Se não o fizerem, a gestação poderá avançar.
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Os pedidos de gestação de substituição têm de ser alvo de apreciação pelas ordens dos Médicos e dos Psicólogos Portugueses, mas os pareceres não são vinculativos e, se os especialistas não se pronunciarem em dois meses, o processo avança mesmo sem essa pronúncia. O projeto de decreto-lei que regulamenta as barrigas de aluguer permite à gestante abortar nas primeiras 10 semanas. Esse arrependimento tem custos: terá de reembolsar os beneficiários de todas as despesas médicas.
O diploma, a que o JN teve acesso, especifica que cabe à Comissão Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA) dar aval à gestação de substituição. Num primeiro momento, será rejeitado ou admitido um pedido de autorização prévia. Se for concedida essa autorização, a comissão pedirá às ordens dos Médicos e dos Psicólogos Portugueses que emitam pareceres sobre os candidatos. No entanto, essa pronúncia tem de chegar em 60 dias. Findo o prazo, a CNPMA pode prosseguir com o processo.
"A falta de qualquer um dos pareceres não faz interromper o procedimento, que deve prosseguir mesmo na ausência daqueles", lê-se no projeto de decreto-lei, que visa regulamentar a lei n.º 90/2021, de 16 de dezembro, aprovada pela Assembleia da República.
Direito a indemnização
Durante a gravidez, há dois momentos em que a gestante tem uma palavra a dizer. Desde logo, tem direito ao arrependimento. Pode denunciar o contrato e abortar nas primeiras dez semanas de gestação. Ao fazê-lo, "fica obrigada a reembolsar os beneficiários" das despesas médicas. Caso o feto apresente doença grave ou malformação congénita, o casal, que fornece o material genético, não pode tomar sozinho a decisão de interromper a gravidez.
A decisão cabe, "conjuntamente, aos beneficiários e à gestante". Se esta, contra a vontade do casal, recusar o término da gravidez, terá de indemnizá-lo por "danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes do nascimento de criança que sofra, de forma incurável, de grave doença ou de malformação congénita".
A gestante não poderá ter mais de 44 anos e só pode dar à luz dois bebés, enquanto barriga de aluguer. Para salvaguarda da saúde da mulher e do futuro bebé, é proibida a transferência de mais do que um embrião. Se a gestante for casada ou viver em união de facto, o/a cônjuge "não pode, em caso algum, ser considerado pai ou mãe do bebé", mesmo que aquela tenha recusado entregar o recém-nascido ao casal beneficiário.
Internada no Hospital
Tanto a grávida como os pais do bebé têm direito a licença parental e a dispensa para as consultas pré-natais. Os hospitais estão obrigados a "criar condições" para que um dos beneficiários permaneça "junto da criança nascida de gestação de substituição durante o período de internamento pós-parto". A entrega do bebé deve ser acompanhada por um assistente social.
O diploma deixa claro que a gestação de substituição não terá prioridade no acesso ao Serviço Nacional de Saúde face a outras técnicas de Procriação Medicamente Assistida. "Deve obedecer aos mesmos critérios (...) e não pode ser objeto de tempos de espera distintos", determina. Em 2022, o tempo médio de espera era de cerca de 18 meses.
À LUPA
Estrangeiro só com residência
A gestação de substituição não é vedada a estrangeiros, mas os beneficiários, que fornecem o material genético, só podem ser candidatos se tiverem título de residência permanente.
Registo imediato sem decisão
Após o parto, a gestante deve manifestar se cumprirá ou não o contrato celebrado no início do processo. Cumprindo o acordo, assinará uma declaração que permitirá aos pais o registo imediato do bebé. No entanto, a regulamentação permite que o recém-nascido seja registado logo após o parto, sem que haja uma decisão da gestante. Nesse caso, os beneficiários devem apresentar uma declaração de honra, que "ateste o desconhecimento de revogação do consentimento".
Só dois pais no registo civil
Se a gestante renunciar ao acordo e quiser ficar com o bebé, pode fazê-lo até ao momento do registo da criança. Mas, nessa situação, os beneficiários que tenham contribuído com gâmetas "podem exigir à gestante que um dos seus nomes" faça parte do assento de nascimento como "progenitor ou progenitora da criança".
Revisão dentro de três anos
O regulamento entrará em vigor 60 dias depois de ser publicado em Diário da República. Neste momento, ainda está em circuito legislativo. No entanto, o projeto de decreto-lei determina que a regulamentação da gestação de substituição será "objeto de avaliação no prazo de três anos".