Concelhos com menos receitas próprias devem ter reforço. Governo e municípios discutem esta segunda-feira alterações aos critérios de financiamento.
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As câmaras municipais querem que o Governo altere a Lei das Finanças Locais para torná-la mais coesa e justa, introduzindo fatores de majoração de municípios que, por exemplo, têm menos receitas próprias. Esta e outras propostas vão estar em cima da mesa, hoje, na reunião entre a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e o ministro das Finanças, Fernando Medina.
O ponto de partida da reunião é a preparação para o Orçamento do Estado (OE) de 2023, mas a alteração à Lei das Finanças Locais é uma pretensão essencial para os municípios. Atualmente, a verba entregue a cada Câmara é calculada em função da população e da área. "A nova lei tem de dar um contributo mais forte para aumentar a coesão social e territorial", argumenta José Ribau Esteves, presidente da Câmara de Aveiro e vice-presidente da ANMP que, em dezembro, no congresso daquela associação, apresentou e viu aprovada uma moção que pugna por profundas alterações à lei.
O reforço das verbas para os municípios mais pobres tem a concordância de Isilda Gomes, presidente da Câmara de Portimão e da Associação dos Autarcas Socialistas: "A coesão territorial é muito importante e eu concordo que haja uma diferenciação positiva para aquelas áreas que têm menos capacidade económica". A socialista considera que o Governo "deve olhar para as diferentes regiões do país, tentando colocá-las o mais possível ao mesmo nível, porque não podemos ter regiões pobres e regiões ricas. Portugal até é um país pequeno e não se justifica essa desigualdade".
Isilda Gomes é ainda a favor de uma atenção para os municípios mais turísticos que "são geradores de receita e exportadores", mas deparam-se com a ameaça da falta de água: "Têm de ter um investimento do Estado". Ribau Esteves concorda com o aumento da receita do IVA "turístico" e soma-lhe uma discriminação positiva para valores ambientais (ler entrevista). O autarca defende que os concelhos com maiores áreas de Reserva Ecológica Nacional, parques naturais ou floresta de conservação sejam beneficiados. E advoga pela alteração ao Fundo Social.
compensados pelas isenções
A Lei das Finanças Locais é, há vários anos, um tema de difícil consenso entre municípios e Governos. Este ano, pela primeira vez, foi cumprido o regime transitório do Fundo Social Municipal, que atribui às câmaras 2% da média aritmética simples da receita do Estado, proveniente do IRS, IRC e IVA: "Foi um desiderato pelo qual lutamos ao longo de muitos anos e finalmente conseguimos", assinala Isilda Gomes, que foi vice-presidente da ANMP até dezembro. Contudo, ficaram pendentes as regularizações referentes aos anos de 2019 a de 2021, o que contribuiu para que a ANMP desse um parecer negativo à proposta de OE.
Outras aspirações dos municípios que não foram correspondidas no OE de 2022 também deverão estar em cima da mesa agora, nomeadamente a distribuição dos 7,5% da receita de IVA de alojamento, restauração, comunicações, eletricidade, água e gás. Ou a compensação pelas isenções de impostos municipais, concedidas pelo Estado, como, por exemplo, isenções de IMI dos centros históricos. Ambas estão na Lei das Finanças Locais.
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Distribuição
Encontrado o montante total a entregar às câmaras, cada uma recebe um valor diferente. Entre os critérios, a população (65%) é o que mais pesa, seguido da área (30%). Os restantes 5% são para todos por igual.
Longe da Europa
Até ao final do ano passado, os municípios recebiam uma média de 9,7% do total das receitas do Estado, o que está aquém da média europeia de 23,2% da receita.
Entrevista a José Ribau Esteves, presidente da Câmara de Aveiro e vice da ANMP
Baixo valor da receita do Estado é problema
Que problemas tem a lei?
Residem no baixo valor da receita do Estado que é afeta aos municípios, com uma fórmula de distribuição muito condicionada pelo número de habitantes e pela área, que não contribui para diminuir as assimetrias. A fórmula não pondera fatores relevantes para o território, como valores ambientais, fluxos turísticos e índices de desenvolvimento socioeconómico.
Que alterações defende?
As que corrijam os constrangimentos, nomeadamente a maior participação dos municípios nos impostos do Estado, a introdução de fatores de cálculo na distribuição das verbas que compensem, de forma relevante, os que têm menor capacidade de gerar outras receitas e a introdução de fatores de ponderação que valorizem o papel do território na preservação de valores ambientais, a sua capacidade de fixar carbono, os seus potenciais de crescimento e desenvolvimento.
A inflação tem impacto?
Com a inflação crescente, os municípios perdem capacidade financeira e isso torna-os menos capazes. Os que têm menor capacidade de gerar receitas próprias são os que mais perdem. A reformulação do Fundo Social Municipal, capacitando-o em dotação e objetivando os seus usos, é muito importante, para que os municípios respondam com sustentabilidade às solicitações crescentes nesta área.