Com as principais cidades europeias a enfrentarem vagas cada vez mais poderosas de turismo, encontrar um WC na via pública é tarefa que se afigura delicada. A tendência tem ditado o progressivo desaparecimento destes espaços comuns. Inclusivamente em Portugal.
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O crescimento global do turismo nas principais cidades coincidiu no tempo com um fenómeno transversal a praticamente todos os grandes centros urbanos: o da drástica redução no número de casas de banho públicas. Muita massa de pessoas para tão poucas opções em hora de maior aperto é tendência que, aparentemente, não tem retorno visível em toda a Europa. Portugal não escapa.
Se nas grandes urbes europeias, sobretudo em Londres e Paris, tal evidência tem colocado problemas aflitivos, por cá a realidade não atingiu escalada tão preocupante. Mas para lá ameaça caminhar. O caso do Porto é paradigmático. A cidade é servida atualmente por um total de 21 WC públicos, segundo contabilidade revelada no próprio site da Câmara, a qual engloba sanitários, balneários públicos e lavandarias. Todos têm casa de banho, nem todos servem somente para o efeito, portanto.
Na Baixa, estão disponíveis um total de nove - menos de metade do total em relação ao resto da cidade. Isto na zona mais procurada de um Porto que no ano passado recebeu 2,39 milhões de turistas - número calculado pelo Euromonitor International e que o coloca entre os 100 destinos mais visitados ao nível mundial.
É tempo de estudar uma solução junto dos comerciantes para que estes disponibilizem os seus sanitários e sejam compensados por isso
"Os WC estão situados em locais estratégicos, é verdade. Mas é tempo de estudar uma solução junto dos comerciantes para que estes disponibilizem os seus sanitários e sejam compensados por isso de alguma forma, através da redução de taxas, por exemplo", considera António Fonseca, presidente da União de Freguesias do Centro Histórico, responsável pela gestão destes espaços. "Até porque o horário normal de funcionamento das casas de banho vai apenas das 8.30 às 18 horas e a noite é sempre um problema", explica.
A medida preconizada por António Fonseca foi avançada, em dezembro de 2017, por Rui Moreira, presidente da Câmara do Porto. No entanto, nunca passou do papel. "Não houve qualquer contacto connosco nesse sentido", garante Joel Azevedo, presidente da Associação dos Comerciantes do Porto. Fonte da Autarquia disse ao JN "desconhecer" qualquer avanço.
Esta mudança de paradigma apontada por António Fonseca encaixa na explicação que justifica o declínio das casas de banho comuns Europa fora.
"As pessoas, locais e turistas, mudaram de hábitos e passaram a frequentar os sanitários de cafés, restaurantes e outros comércios. É uma característica global, que começou por ser visível nas cidades mais movimentadas e foi depois alastrando a todas as outras, nomeadamente em Portugal", descreve o geógrafo Rio Fernandes.
Há cada vez menos investimento por parte das autarquias na segurança e limpeza públicas
Ao contrário do Porto, Lisboa não divulga o total de casas de banho passíveis de usufruto comum - o JN tentou obter tais dados junto da Câmara da capital, mas tal não foi disponibilizado em tempo útil. Novidade na capital são os sanitários que têm vindo a ser inaugurados em várias estações de metro desde dezembro de 2017 (que no Porto não existem).
"Há cada vez menos investimento por parte das autarquias na segurança e limpeza públicas", constata, por sua vez, Paula Teles, engenheira especialista em mobilidade urbana, para quem "os novos padrões de cidade trazem novos desafios que deveriam passar por mais equipamentos para as pessoas que nela circulam". Uma das soluções preconizadas por esta especialista passa pela "concessão municipal de redes de casas de banho para todos". Uma forma de lançar mais espaços do género e, até, de "gerar emprego".
Reduzir é palavra de ordem
A diminuta oferta de casas de banho atinge preocupações maiores em cidades como Paris e Londres, onde nos últimos anos se verificou uma drástica queda da oferta de locais de asseio. Na capital britânica, por exemplo, um estudo divulgado pela BBC revelou que entre 2010 e 2018 foram encerradas ou deixaram de ter manutenção 13% de WC públicos. O objetivo foi reduzir custos, a consequência foi a cada vez maior procura, lá está, de estabelecimentos comerciais.
Em Paris, onde no ano passado a instalação de indiscretos mictórios em plenos passeios causou polémica e desconforto, uma ida à casa de banho pode atingir preços que chegam aos três euros. Nas principais cidades da Alemanha, as entradas mínimas rondam um euro.
Tal cenário de escassez de WC ao nível mundial deu azo a projetos em que a imaginação, o engenho e a necessidade se juntaram num só caminho. Multiplicaram-se aplicações e sites que monitorizam em permanência todos os pontos onde é possível aliviar ocorrências que surgem sem hora marcada