PSD recorre à Comissão de Transparência após reunião de CEO com socialistas e Direita pede demissão de Galamba. Medina e grupo de Pedro Nuno Santos sofrem desgaste.
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A Oposição exige explicações a António Costa e João Galamba, pedindo a cabeça do ministro das Infraestruturas após revelações de Christine Ourmières-Widener sobre uma reunião com deputados e assessores do Governo antes da sua audição. E o PSD chama a Comissão de Transparência a intervir. Do interior do PS, chegam relatos de descontentamento e incómodo das bases pela forma como o Executivo está a gerir o dossiê da TAP. Fontes do partido atribuem a exoneração da CEO à estratégia de Fernando Medina na alegada guerra aberta com o grupo de Pedro Nuno Santos, considerando que ambos saem "queimados" pelos estilhaços para a sucessão de Costa.
O ataque cerrado regressou após a CEO demissionária da TAP, Christine Ourmières-Widener, ter revelado na comissão de inquérito que, por iniciativa de Galamba, teve uma reunião a 17 de janeiro com deputados do PS, assessores e chefes de gabinete do Governo, na véspera de ser ouvida no Parlamento a 18 de janeiro. Por sua vez, a ex-administradora Alexandra Reis foi ontem ouvida naquela comissão (ler pág. 7).
Para a polémica contribuiu a revelação de que o ex-secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, pediu à TAP que adiasse um voo para manter Marcelo Rebelo de Sousa como aliado, com Belém a garantir que nada solicitou à companhia nem ao Governo.
PSD pede áudio da reunião
Na mira dos partidos está o ministro das Infraestruturas. Pedem que seja ouvido na comissão de inquérito, entre apelos à sua demissão.
Para além de´requerer a presença do ministro na comissão, o PSD pede, "com caráter prioritário, a extração da ata da audição à CEO da TAP, bem como a exportação do áudio". O objetivo é saber se foram violados o regime jurídico dos inquéritos parlamentares, o estatuto dos deputados e o código de conduta no encontro com deputados do PS, revelado por Christine Ourmières-Widener na comissão de inquérito. O PSD pede à Comissão de Transparência que se pronuncie. O social-democrata Paulo Moniz explicou que, segundo a CEO, o Governo convocou para esta reunião Carlos Pereira, que foi, depois, escolhido para coordenador da bancada do PS na comissão de inquérito.
O líder do PSD, Luís Montenegro, exigiu, "com urgência, uma posição pública do primeiro-ministro". Incluiu na lista de ministros "diminuídos politicamente" os das Finanças, das Infraestruturas e dos Assuntos Parlamentares. A seu ver, Galamba e Ana Catarina Mendes estão "moribundos nas teias da promiscuidade e confusão" entre Estado e PS devido à reunião de janeiro. E "tiveram um comportamento que, do ponto de vista democrático, é inaceitável".
contra secretismo
A Iniciativa Liberal, que tinha pedido a demissão de Galamba, requereu ontem a lista dos eleitos do PS presentes na "reunião preparatória" com a CEO, bem como "todas as comunicações, e-mails e notas de calendário entre o Ministério das Infraestruturas, dos Assuntos Parlamentares e a TAP".
O líder do Chega, André Ventura, destacou que, para além de Costa, também o líder parlamentar do PS, Eurico Brilhante Dias, deve dar explicações sobre a reunião.
O comunista Bruno Dias disse ser "preciso acabar com o secretismo na gestão pública, reuniões secretas e acordos de confidencialidade", e a bloquista Mariana Mortágua exigiu que Costa assuma "as suas responsabilidades" em relação à TAP, quando o "Governo não esteve à altura da gestão" da empresa.
Belém
Pedido foi da agência de viagens
"A Presidência da República nunca solicitou a alteração do voo da TAP, se tal aconteceu terá sido por iniciativa da agência de viagens", referiu Belém. Em causa está a troca de e--mails entre o então secretário de Estado Hugo Mendes e a CEO da TAP. "A viagem foi tratada pela agência de viagens habitual, que terá feito várias diligências e acabou por encontrar uma alternativa com a TAAG, via Luanda, no dia 23, mas o regresso de Moçambique acabou por se verificar a 21 de março de 2022, num voo regular da TAP", diz Belém. Já Luís Montenegro acusou o Governo de usar Marcelo como "peão ao serviço da sua agenda", deixando-o "numa situação incómoda do ponto de vista institucional".
Principais revelações
Reunião secreta na véspera da audição
A CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, revelou, no Parlamento, que se reuniu com o deputado do PS, Carlos Pereira, e membros do gabinete dos ministros das Infraestruturas e da ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, na véspera da audição de 18 de janeiro. O encontro terá sido promovido pelo ministro João Galamba. A CEO afastou, porém, a ideia de que tenha havido "combinação de perguntas". Carlos Pereira recusou dizer quem o convidou: "Foi a minha secretária que recebeu o convite".
O voo de Marcelo que o Governo queria alterar
Outra novidade da Comissão de Inquérito foram as instruções dadas pelo ex-secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, a Christine Ourmières-Widener, para que alterasse um voo do presidente da República. "Não podemos perder o apoio político do presidente. Ele é o nosso principal aliado político, mas pode transformar-se no nosso pior pesadelo", escreveu Hugo Mendes. A CEO recusou alterar o voo.
Administrador Financeiro desmentido
Gonçalo Pires, atual administrador financeiro da TAP, disse, na Comissão de Inquérito, que, apesar de ter na sua alçada as contas da empresa, não teve interferência na indemnização a Alexandra Reis. A CEO desmente-o e diz que "houve mensagens eletrónicas trocadas, quando o acordo foi concluído".
Christine culpa divergências sobre o plano
Embora Alexandra Reis diga não saber por que motivo saiu, Christine Ourmières-Widener justificou a saída com "divergências sobre o plano de reestruturação".
Medina pediu a CEO para renunciar
Fernando Medina reuniu-se com Christine Ourmières-Widener um dia antes de a demitir pela televisão, em conferência de imprensa e não a avisou. "Durante a reunião, o ministro sugeriu que podia ser bom para a minha reputação demitir-me", disse a CEO, explicando por que razão recusou: "Demitir-me seria admitir que fiz algo mal. E não fiz nada mal". Quanto às causas, disse que "foi por razões políticas".
Ambas negam ter informado as Finanças
Christine Ourmières-Widener e Alexandra Reis disseram que não informaram nem falaram com o Ministério das Finanças a propósito do processo de saída desta administradora. A ex-secretária de Estado do Tesouro confirmou ter sido convidada para o cargo por Medina, mas não lhe falou sobre "o processo de saída da TAP nem da indemnização". A CEO da TAP esteve sempre em contacto com o Ministério das Infraestruturas: "Não sabia que não havia coordenação com o Ministério das Finanças".