Cerca de 100 agrupamentos lançaram, este ano letivo, clubes desportivos abertos a pais, professores ou funcionários, revelou, ao JN, o Ministério da Educação. Cicloturismo, caminhadas, fitness, ténis de mesa ou gincanas são alguns dos exemplos. Os diretores defendem uma política de portas abertas na rede pública, porque um maior envolvimento dos pais com a escola melhora os resultados dos alunos.
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"Um dos nossos objetivos prioritários é a criação de uma identidade do nosso agrupamento. Para isso, tem de envolver-se todos os agentes da comunidade. Os professores lutam por ensinar melhor, mas não o conseguem sem o compromisso dos pais. A responsabilização tem de ser de todos", defende Benjamim Sampaio. O agrupamento Santos Simões, que dirige em Guimarães, promove, há anos, caminhadas e passeios de bicicleta, alguns com piquenique incluído, para pais, professores e funcionários. Por exemplo, na caminhada realizada no primeiro semestre, participaram entre 70 e 80 pessoas. "Os pais são uma parte essencial da escola. Em seis escolas, tenho cerca de 1500 alunos, o que significa 3000 pais", aponta, considerando que estas iniciativas, sobretudo após dois anos de pandemia, reforçam laços e contribuem para o bem-estar da comunidade escolar.
Ocasionais ou regulares
A estratégia de Desporto Escolar 2021-2025 prevê a possibilidade de as escolas criarem estes clubes abertos à comunidade. Podem ser atividades de caráter ocasional ou regular (até três tempos letivos semanais). Após o programa anterior (2017-2021) ter sido marcado pela pandemia, "pretende-se que a escola abra a porta à comunidade, fazendo usufruto dos seus recursos humanos e materiais para manter a sua comunidade mais ativa", lê-se no documento.
"É, mais uma vez, a escola pública a puxar pela sociedade, mas cada agrupamento tem de fazer o seu caminho", afirma o presidente da Associação Nacional de Diretores (ANDAEP). Abrir novos projetos, frisa Filinto Lima, requer recursos humanos. Ainda assim, admite, a medida tem o mérito de incentivar à prática desportiva numa sociedade sedentária e de aproximar os pais à escola. "Com pais interessados, temos alunos mais motivados", garante.
O agrupamento Pinheiro Rosa, em Faro, vive de "portas abertas" há anos. Tem um clube de atletismo, com instituição jurídica para atletas federados, há 20 anos e uma pista de corta-mato aberta à comunidade. O "Bike Me" incita às deslocações "verdes" através de "comboios de recolha dos alunos", explica o diretor Francisco Soares, que pedalam "cerca de quatro mil quilómetros por ano". No âmbito deste projeto, são promovidos, ainda, ciclopasseios abertos a quem quiser participar, além de cursos de iniciação à bicicleta para alunos do 1.º Ciclo e adultos. Dentro da escola funciona uma oficina, assegurada por estudantes do ensino profissional, que repara ou reabilita bicicletas para serem distribuídas por estudantes.
Sala converte-se em ginásio
A escola faz caminhadas e corridas solidárias. E, este ano, alunos finalistas do curso de Gestão Desportiva estão a converter uma sala num ginásio de fitness que, também, será aberto à comunidade gratuitamente. A campanha de recolha de material foi lançada no início do ano letivo. A escola já conseguiu uma passadeira, bicicletas, pesos e material de "step".
"É uma filosofia de vida", frisa o diretor. Os pais tendem a "divorciar-se da vida escolar" à medida que os filhos crescem, defende Francisco Soares, que considera que a comunidade educativa não deve viver numa "bolha". Por, isso, para educar cidadãos ativos e não só transmitir conhecimentos, insiste em "ter os pais dentro da escola e os professores lá fora", para que alunos nunca se desliguem da realidade.
Para o presidente da Sociedade Portuguesa de Educação Física, Nuno Ferro, este tipo de clubes são ótimos desde que as escolas tenham as condições, nomeadamente recursos humanos. "Temos professores carolas que dão muito mais do seu tempo aos miúdos. Estar a formalizar este voluntariado não é correto", alerta.
Reportagem
Pais e professores aprendem juntos ténis de mesa na Maia
O cenário repete-se todas as semanas: num ambiente de aula descontraído e de raquete na mão, uma dezena de pais e professores da Escola Secundária de Águas Santas, na Maia, jogam ténis de mesa entre si. Uns vestem fato de treino, outros praticam a modalidade com a roupa que usaram ao longo do dia de trabalho. Juntos fazem parte da equipa "Deporto Escolar Comunidade", criada em outubro pela escola, com o intuito de aproximar docentes e encarregados de educação.
Ao leme do grupo está Filomena Madureira. É professora e coordenadora do projeto. Cabe-lhe a tarefa de orientar a equipa e ensinar as regras da modalidade. Desde a forma adequada para pegar na raquete ao regulamento. "Começo por deixar os pais aprender brincando e depois vou introduzindo os gestos técnicos fundamentais ", contou.
Luís Marcelino é um dos membros da equipa. Tem 47 anos e dois filhos a estudar na Escola Secundária de Águas Santas. Apaixonado por ténis de mesa desde a adolescência, não hesitou em inscrever-se na equipa.
"Além da atividade, temos a possibilidade de conhecer outros pais e de viver a escola de uma forma diferente. E depois destes anos de pandemia, precisamos todos de nos mexermos e de conviver", disse Luís Marcelino, confidenciando ainda que, em casa, por vezes, "a sala transforma-se para o ténis de mesa".
A par do convívio ao redor da mesa de ténis, o clube permite, ainda, aos pais estarem ocupados enquanto os filhos frequentam outra atividade dentro da escola. Até então, havia pais que aguardavam dentro do carro. Sílvia Dias era exemplo disso. "Acabava por tratar dos emails e, agora, paro um bocadinho. Já consigo ter um jogo de 15 minutinhos sem fazer asneiras", brincou a mãe e presidente da Associação de Pais.
Múltiplos benefícios
Como colega de equipa, Sílvia Dias tem o antigo diretor de turma da filha. Paulo Pinho é docente na escola secundária e também pai de dois gémeos que estudam no agrupamento. "Estes projetos são extremamente importantes e valiosos ", afirmou Paulo Pinho.
Para a professora Filomena Madureira, os benefícios da atividade são múltiplos. Um deles é uma maior facilidade comunicacional entre pais e professores. Daniel Braga, coordenador do Desporto Escolar, concorda: "Muitas vezes, o ambiente escolar fecha um bocadinho a participação dos pais e este espaço vai permitir que os pais olhem para o professor de forma diferente", explicou a coordenadora.
Segundo Daniel Braga, o deporto escolar destinado à comunidade não se cinge ao ténis de mesa. Portanto, no próximo ano, poderá ser lecionada uma modalidade.
"O interesse é trazer as pessoas de fora para a escola, dar-lhes a conhecer como se trabalha dentro da escola e também desenvolver algumas capacidades que eles já tenham ou então que queiram melhorar", detalhou o docente.