O Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra suspendeu o sociólogo Boaventura de Sousa Santos e o investigador Bruno Sena Martins, ambos acusados por três investigadoras de alegadas práticas de assédio sexual. Os dois pediram a suspensão à instituição, que aceitou.
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A instituição, que "está a constituir uma comissão independente para averiguação das ocorrências", aponta que se demarca "de todas as posições assumidas publicamente por Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins, nomeadamente no que respeita à intenção de avançar judicialmente contra as autoras do capítulo do livro 'Conduta Sexual Imprópria na Academia'", publicado na editora académica Routledge a 31 de março.
"Durante este processo e até ao apuramento de conclusões, o CES informa que Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins se encontram suspensos de todos os cargos que ocupavam", referiu o centro de investigação esta sexta-feira. Mais tarde, foi o próprio Sousa Santos a dizer que tomou a decisão de se "autoafastar das atividades" da instituição.
A reação do sociólogo motivou o esclarecimento por parte do CES, mais tarde. "A direção e a presidência do conselho científico do CES vêm esclarecer que a suspensão dos mesmos afeta o exercício de cargos de responsabilidade e/ou representação institucional, tendo sido solicitada pelos próprios", explicaram.
O sociólogo fez o pedido por considerar que a instituição tem de fazer "com toda a independência (...) as averiguações das informações apresentadas e dar consequência ao processo de apuração interna a partir da comissão independente estabelecida, sem que haja qualquer interferência de qualquer parte".
Tanto Boaventura de Sousa Santos como Bruno Sena Martins negaram as acusações das três investigadoras. Sousa Santos anunciou, inclusive, em carta aberta aos investigadores do CES, que iria apresentar queixa-crime contra as autoras.
Na terça-feira, soube-se que três investigadoras, de nacionalidades belga, portuguesa e norte-americana, denunciaram condutas sexuais inapropriadas numa instituição académica. As autoras descreveram as situações de assédio sexual num livro internacional, publicado a 31 de março, na editora académica Routledge.
Por ser a única instituição em comum no percurso das três mulheres, foi facilmente percetível que os casos ocorreram no CES da Universidade de Coimbra. Apesar de não referirem nomes, as descrições dos alegados autores do assédio são atribuíveis a Boaventura de Sousa Santos, diretor emérito do CES, e ao investigador Bruno Sena Martins.
Direção do CES diz não conhecer casos denunciados
O CES anunciou, depois de se saber da polémica, que iria iniciar uma investigação. A instituição garante, esta sexta-feira em comunicado, que a Provedoria (criada em 2021) "recebeu duas queixas, nenhuma delas por assédio moral ou sexual". A nota divulgada foi escrita pela direção e a presidência do conselho científico do CES, onde acrescentam não ter "conhecimento de tentativas de averiguação ou ocultação de eventuais condutas inadequadas que tenham ocorrido no passado".
"Independentemente do tipo de queixas recebidas, e sabendo da dificuldade que eventuais vítimas possam ter na denúncia de casos como estes, o CES sublinha o seu repúdio por qualquer forma de assédio ou abuso, e solidariza-se com todas as vítimas de violência desta natureza", lê-se no comunicado.
O Centro de Estudos Sociais refere ainda que os "graffiti mencionados no referido capítulo", escrito pelas três investigadoras, e que visavam Boaventura de Sousa Santos, não foram "acompanhados de participações formais". Contudo, "suscitaram na instituição a necessidade de constituir mecanismos mais explícitos de regulação e de denúncia". Nos graffiti, que surgiram nas paredes do CES, em 2018, foram escritas as frases "Fora Boaventura" e "Todas Sabemos".
Para além das três investigadoras, surgiram mais duas mulheres a acusar o Boaventura de Sousa Santos de assédio sexual e moral. Uma investigadora brasileira disse ao jornal "Público" ser uma das vítimas identificadas na obra da Routledge. Já uma ativista argentina afirmou, num vídeo publicado a 10 de junho, nas redes sociais, que o diretor emérito do CES tentou "atirar-se para cima" da própria, após ter ido ao departamento de Sousa Santos buscar uns livros.