Relatório "Align, Act, +", de Manuel Heitor, foi o mote para o debate sobre o futuro da economia da Europa
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A Europa tem vindo a perder terreno. O atraso tecnológico, face a economias emergentes como a China, faz temer o declínio e, com ele, a dependência externa. A inteligência artificial (IA) é uma batalha já perdida. É preciso mais investimento, um quadro legal mais favorável, mas, acima de tudo, uma Europa dos 27 a “remar em conjunto” e, como afirmou o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, “a fazer pela vida”. Inovação e ciência são palavras-chave. As universidades têm que ser “parceiros”, as startups alavancadas. Defesa, “fuga de cérebros” e envelhecimento devem ser apostas. A Região Norte do país está “bem posicionada”. Saiba ela “dar corda aos sapatos”.
Foram estas algumas das conclusões do debate “Align, Act, Accelerate - Que impacto para o Norte na Europa?”, organizado, ontem, na biblioteca Almeida Garrett, pela Universidade do Porto (UP) e pelo Instituto Politécnico do Porto (IPP) em parceria com a AEP - Associação Empresarial de Portugal e a COTEC - Associação Empresarial para a Inovação.
“É imperioso acelerar a transição digital, energética e climática, mas, para que isso aconteça, [a União Europeia] necessita de ganhar autonomia tecnológica, reduzir a sua dependência e implementar um processo sustentável de reindustrialização. A tarefa é árdua, mas não o fazer pode significar o declínio do projeto europeu”, afirmou o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira.
A Região Norte, sublinha, está bem posicionada, mas, para ser capaz de tomar a dianteira, é preciso “aprofundar a relação entre academia e empresas, ter um quadro legislativo e fiscal mais favorável e atrair mais investimento estrangeiro”.
A Europa, explica o presidente do IPP, Paulo Pereira, está a ficar para trás em áreas como os semicondutores, a IA ou a biotecnologia e “é imperioso reverter esta tendência”. Os relatórios de Enrico Letta (ex-primeiro-ministro italiano), Mário Draghi (ex-presidente do Banco Central Europeu) e, mais recentemente, o “Align, Act, Accelerate”, de Manuel Heitor, concordam no diagnóstico. É preciso reforçar o investimento em investigação, tecnologia e inovação. E aqui, lembra Paulo Pereira, o contributo da academia será “decisivo”. Agora, o Programa-Quadro de Investigação e Inovação (FP10) deve alinhar-se com as recomendações de Letta, Draghi e Heitor.
O reitor da Universidade do Porto, António Sousa Pereira, lamenta ver os fundos destinados ao Ensino Superior a descer e um quadro legal que não ajuda a captar talento e, aponta, “estamos há demasiado tempo a afirmar o óbvio, sem que nada mude”.
Manuel Heitor concorda que é preciso acelerar. A defesa é “o motor principal da competitividade europeia”, urge dar melhores condições aos jovens adultos - “e aqui o Norte de Portugal está particularmente bem posicionado” - e ter especial atenção ao envelhecimento. Por isso, no relatório recomenda um aumento do investimento em defesa, um sistema europeu de compras públicas, a reorientação dos fundos de coesão e uma revisão da cooperação científica com a China e EUA.
“A Europa já perdeu a batalha da IA”, frisa o investigador Luís Sarmento, da Indutiva Research Labs. Faltam, sublinha, formas de alavancar as boas ideias da ciência, algo em que “os EUA são particularmente bons”.
“Até hoje, a Europa encontrou sempre soluções”, frisou a representante da Comissão Europeia em Portugal, Sofia Moreira de Sousa. As ações concretas para passar “das palavras aos atos”, explica, começam a ser discutidas já em março. O desafio, diz, é manter a união.
"A alta velocidade é essencial para o Norte"
A Região Norte tem tudo para se afirmar nesta “nova” Europa, mas tem que ganhar escala - e aí a ligação à Galiza é fundamental - e batalhar mais do que nunca pelo TGV até Vigo. Quem o diz é o presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), António Cunha.
Começando pelos números, explica, as exportações a norte cresceram acima do país, há setores “muito interessantes a disparar” - equipamentos óticos e de precisão, semicondutores, indústria aeronáutica, energias renováveis (mais de metade a norte, com as eólicas offshore à cabeça) - e a indústria “tradicional” (automóvel, têxtil e agrícola) reinventa-se. O número de estrangeiros que escolhem o Norte para fazer doutoramento orgulha, lembrou o vice-presidente da AEP, Luís Seia.
Este “Norte dual” - que inova nos semicondutores, mas onde a indústria de manufatura tem peso, que tem elevadas habilitações nos jovens com menos de 30 anos e muito baixas acima dos 40 - está no cantinho da Europa, mas quer ser “o farol da nova competitividade da economia portuguesa (e europeia)”.
A aliança com o Norte de Espanha, diz António Cunha, é a solução e o TGV Porto-Vigo “essencial”. Trará centralidade e uma ligação rápida à Europa. “Discutimos muito, mas precisamos de rematar à baliza”, sintetizou Jorge Portugal, da Cotec, lembrando que todos concordam precisar de ciência e inovação, mas não canalizam para aí os investimentos e já quanto a leis, as empresas estão “afogadas no tsunami regulatório”. Mais uma vez, é preciso “dar corda aos sapatos”.