CNE diz que isolados e infetados não podem ser impedidos de sair de casa para votar
CNE defende que quadro legal já permite que "qualquer pessoa" vá às urnas, mesmo em isolamento. Governo quer tirar dúvidas e pondera suspender confinamentos para permitir que se vote.
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A Comissão Nacional de Eleições (CNE) entende que "qualquer pessoa", incluindo cidadãos em isolamento e infetados com covid-19, tem o direito de votar de forma presencial nas eleições legislativas de dia 30. Ao JN, João Machado, porta-voz da Comissão, afirma que a contenção da pandemia "não pode restringir" esse direito, e o constitucionalista Jorge Miranda também argumenta que, sem estado de emergência, não podem existir confinamentos. Ainda assim, o Governo quer dissipar as dúvidas: na quarta-feira, dia em que os especialistas admitiram que, no pior cenário, 12% da população poderá estar confinada dentro de uma semana, o presidente da República revelou que o Executivo pondera suspender o isolamento para permitir a ida às urnas.
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"No quadro legal vigente, o direito de voto não pode ser restringido por uma situação de confinamento", afirma o porta-voz da CNE. João Machado refere que a lei atual permite que quem esteja em isolamento ou infetado com covid-19 possa deslocar-se aos locais de voto, mas apela a que, quem se encontre nessas situações e decida fazê-lo, adote um "comportamento consciente".
Foi o presidente da República a revelar que o Governo pediu ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República "um parecer sobre se o isolamento impede o exercício do direito de voto" ou se, pelo contrário, quem está confinado pode ir votar em segurança, "suspendendo o isolamento para esse efeito". Mais tarde, no Twitter, António Costa confirmou que o tema lhe oferece dúvidas, escrevendo que pretende "saber se as pessoas isoladas estão impedidas de ir votar". Caso possam deslocar-se, o Governo irá assegurar "condições para o exercício do voto em segurança", disse.
João Machado revela que a CNE "não foi tida nem achada" quanto a esta possibilidade, mas realça que a mudança não criará "nenhum problema". Já em setembro, nas autárquicas, a CNE tinha emitido uma nota onde dava conta de que ninguém podia travar o direito ao voto "com fundamento na inobservância de requisitos que não estejam expressamente previstos nas leis eleitorais".
PR sugere retoque legal
Os partidos são unânimes em considerar que as legislativas devem contar com a participação do maior número possível de portugueses, tendo vários deles apelado à inscrição no voto antecipado.
O chefe do Estado subscreve e revela que a modalidade "está a ser acautelada" com o aumento significativo do número de mesas (serão 1303). À saída do Infarmed, Marcelo sugeriu que se deve "ponderar" se a Constituição permite algum "retoque legislativo" que facilite a ida às urnas.
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O constitucionalista Jorge Miranda entende que a participação nas eleições deve ser estimulada pela aposta no voto antecipado. "A solução está aí", refere, ao JN.
Questionado sobre as pessoas que ficarão infetadas entre o fim do prazo para a inscrição nessa modalidade (dia 23) e a data das eleições, Miranda reconhece que esses casos o "preocupam". Contudo, argumenta que "o dever de proteção de saúde é mais forte do que o de votar", já que afeta terceiros. Sobre confinamentos, é contundente: "Só se justificam havendo estado de emergência".
Para Paulo Otero, da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, "não é possível conciliar saúde pública, isolamento e o exercício do direito de voto". Se há razões para confinar um infetado, elas "impedem que se crie uma exceção a esse isolamento", refere. Caso contrário, "não se justifica a existência de isolamento".
Também ouvido pela Lusa, Pedro Bacelar de Vasconcelos afirma que a suspensão do isolamento "será bem-vinda", desde que haja "cautelas" e "formas de minimizar o risco de contágio". "O direito de voto é fundamental", defende o ex-deputado do PS. Baltazar Nunes estimou que, dentro de uma semana, entre 4% e 12% da população estará confinada.
TRÊS CENÁRIOS POSSÍVEIS
Mudar a lei eleitoral
Segundo Ricardo Baptista Leite, deputado do PSD, o primeiro-ministro colocou três cenários para permitir que quem está isolado vá votar. O primeiro é a comissão permanente do Parlamento decidir nesse sentido. De acordo com a TSF, o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, lembrou de forma ríspida a Costa, no fim da reunião no Infarmed, que a comissão permanente não pode legislar.
Isolamentos de cinco dias
A DGS está a avaliar baixar os dias de isolamento de sete para cinco. Mas "avaliar não quer dizer decidir", avisou Graça Freitas.
Regime de exceção para votar
O presidente da República e o primeiro-ministro confirmaram que o Governo pediu um parecer à PGR sobre a possibilidade de suspender os isolamentos, permitindo que os cidadãos nessa situação vão votar.