Ex-presidente do INEM, que ajudou nas urgências metropolitanas do Porto, diz que é mais seguro ter menos pontos sempre abertos do que andar a mudar.
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As urgências de obstetrícia vão continuar a encerrar por falta de médicos nos próximos meses e há quem defenda que o plano de concentração de serviços, nomeadamente na região de Lisboa e Vale do Tejo, "pode e deve avançar já". Porque é "mais seguro" definir por um período mais longo os serviços que vão estar abertos do que jogar com a incerteza semanal e correr o risco de as grávidas se dirigirem ou serem encaminhadas para pontos encerrados.
Miguel Soares de Oliveira, ex-presidente do INEM, esteve no processo de criação das urgências metropolitanas do Porto, entre 2007 e 2009, e vê com preocupação o argumento de que "no verão já não é possível fazer nada ou quase nada" para resolver o problema das urgências de obstetrícia, que pode alastrar a outras especialidades como é o caso recente da cirurgia pediátrica.
"Acho que no imediato é possível e desejável definir o tempo de distância máximo até à urgência mais próxima e fazer um plano de contingência", que passa por encerrar alguns serviços e deslocar os respetivos profissionais de saúde para fazerem urgência noutros locais. "É mais seguro para as mulheres e para grávidas, mas também para o INEM, que tem de reorientar os doentes. É mais fácil haver um plano definido e não estar sempre a mudar".
Reduzir risco ao máximo
"Reduzir o acesso não é o ideal", mas "é a resposta possível num momento de crise". O cirurgião pediátrico, que também fez parte da Comissão para a Reavaliação da Rede Nacional de Emergência e Urgência (2011), discorda que tenha de ser criada uma nova comissão para desenhar este plano em 180 dias. "Deve ser no imediato, sem prejuízo de se fazer algo estruturante paralelamente", diz.
A questão da mobilidade dos profissionais pode não ser simples. Segundo Diogo Ayres de Campos, coordenador da Comissão de Acompanhamento da Resposta em Urgência de Ginecologia/ Obstetrícia e Bloco de Partos, criada há dias, a mobilidade entre maternidades que estão próximas está em cima da mesa, mas não é, por ora, legal.
"A questão é que, durante o verão, tivemos informação por parte do ministério, não há suporte legal para estar a mobilizar os profissionais de saúde de uma maternidade para outra", disse, citado pela Lusa. A estratégia passa por assegurar que os constrangimentos nas urgências ocorrem em momentos diferentes e por divulgar online a informação dos serviços encerrados. "E se a lista contiver erros? E se não for atualizada em tempo real? Esta aleatoriedade, as dúvidas são um fator de risco e é preciso reduzir ao máximo o erro", defende Miguel Soares de Oliveira.
Alternativa
Valor/hora fixa traz desperdício e riscos para o SNS
A definição de um valor/hora fixo a pagar aos médicos prestadores de serviço harmonizado entre hospitais, a medida acordada esta semana para evitar os chamados "leilões de preço" e reduzir os "buracos" nas urgências de obstetrícia, comporta riscos e desperdício. Para Miguel Soares de Oliveira, a solução traz desperdício porque haverá muitas horas que os médicos aceitariam trabalhar por um preço inferior e porque haveria hospitais que aceitariam pagar mais do que o fixo para evitar buracos nas escalas. Por isso, sugere um modelo "alternativo" que reduz o desperdício e a injustiça da diferença de remunerações entre médicos do hospital e tarefeiros e assegura o preenchimento das escalas de urgência. A proposta passa por o hospital ir aumentando o valor/hora a pagar, começando sempre por auscultar os médicos do hospital e só depois os tarefeiros. As dúvidas sobre a solução adotada para este verão assaltam também Pedro Pitta Barros. O economista em saúde alertou, num comentário no seu blog, que a regulação de preços terá como efeitos "pagar menos às empresas de prestação de serviços" e "ter mais situações de urgências fechadas".