Há medidas do pacote Mais Habitação que já estão em vigor e não serão afetadas pelo veto do presidente da República, como a atribuição do apoio às rendas e aos créditos de habitação. Mas as medidas mais polémicas, nomeadamente as restrições ao alojamento local e a contribuição paga por esse setor, continuam adiadas.
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Quando foi aprovado o pacote Mais Habitação na Assembleia da República?
Limitação ao aumento das rendas, limites ao alojamento local, alterações aos vistos "gold", mais-valias e arrendamento coercivo são algumas das medidas previstas no pacote Mais Habitação, apresentado pelo primeiro-ministro António Costa a 16 de fevereiro deste ano e que acabou por ser aprovado, no Parlamento, a 19 de julho só com os votos favoráveis da maioria absoluta socialista. O PAN e o BE abstiveram-se e todos os outros partidos votaram contra. Conheça as principais medidas do pacote Mais Habitação.
Limites à subida da renda dos novos contratos
O valor da renda inicial dos novos contratos de casas que estiveram no mercado de arrendamento nos últimos cinco anos não pode ultrapassar os 2% face à anterior. A este valor podem ser somados os coeficientes de atualização automática dos três anos anteriores (caso não tenham sido aplicados), sendo considerados 5,43% em relação a 2023. As casas cuja renda seja inferior à dos limites máximos por tipologia previstos no programa de arrendamento acessível (PAA) não ficam abrangidas por aquele limite de atualização.
Rendas antigas atualizadas pela inflação
Os contratos de arrendamento antigos (anteriores a 1990) cujos inquilinos com rendimento anual bruto corrigido inferior a cinco salários mínimos nacionais ou tenham idade igual ou superior a 65 anos ou incapacidade superior a 60% não transitam para o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU). As rendas em causa vão passar a ser atualizadas de acordo com a inflação e a beneficiar de isenção de IRS e de IMI. Está ainda previsto o pagamento de uma compensação aos senhorios.
Suspensão por dois anos para reinvestimento da venda da casa
O pacote Mais Habitação prevê a suspensão por dois anos do prazo para reinvestimento do valor da venda casa de habitação, evitando a tributação das mais-valias, com a medida a ter efeitos em 1 de janeiro de 2020. Na prática, isto interrompe durante dois anos o prazo de 36 meses que as pessoas têm para investir numa nova casa o valor da venda da habitação própria e permanente - e durante o qual se beneficia de isenção de tributação. A suspensão da contagem deste prazo de 36 meses abrange as vendas ocorridas antes de 2020.
Balcão do Arrendatário e do Senhorio
A tramitação do procedimento especial de despejo e da injunção em matéria de arrendamento passa a ser assegurada através do novo Balcão do Arrendatário e do Senhorio (BAS).
Estado paga rendas em atraso após três meses de incumprimento
O Estado vai substituir-se ao inquilino e pagar rendas com três meses de incumprimento, para reforçar o mercado de arrendamento. Desta forma, caberá ao Estado avaliar a situação do inquilino e poderá avançar para a cobrança dos valores em falta usando os meios atualmente existentes para a cobrança de outras dívidas. Sendo o incumprimento devido a carência de meios, o caso é articulado com a Segurança Social.
Mais-valias de casas vendidas ao Estado e municípios isentas de IRS
As mais-valias resultantes de venda de imóveis ao Estado ou aos municípios ficam isentas de IRS e IRC, ficando apenas de fora desta medida as auferidas por residentes na lista de territórios e países que Portugal classifica de paraísos fiscais. Igualmente de fora desta isenção ficam as mais-valias que resultem de vendas através do exercício de direito de preferência. Atualmente, 50% da mais-valia gerada têm de ser englobadas ao restante rendimento sendo sujeita às taxas progressivas do IRS.
Incentivo à mudança das casas de alojamento local para arrendamento
As casas atualmente afetas ao alojamento local (AL) que transitem para o mercado de arrendamento vão ter isenção de IRS e IRC sobre as rendas até 31 de dezembro de 2029. Para tal, o contrato de arrendamento terá de ser efetuado até 31 de dezembro de 2024, sendo que apenas os imóveis com registo de AL até 31 de dezembro de 2022 são elegíveis.
Suspensão de novas licenças de alojamento local
As emissões de novas licenças de alojamento local vão ser suspensas, com exceção das zonas para alojamento rural, cabendo aos municípios definir o "adequado equilíbrio" de oferta de habitação e alojamento estudantil que permitam o fim desta suspensão. A proposta do Governo previa, contudo, que a suspensão destes registos se mantinham nos municípios que tenham declarado situação de carência habitacional. Aliás, no passado dia 30 de março, ao anunciar as medidas essenciais do pacote Mais Habitação, o primeiro-ministro António Costa deixou claro que as câmaras do Litoral com carências habitacionais identificadas em plano municipal não teriam direito a financiamento público para a construção e reabilitação de casas, caso não suspendessem o registo de novos alojamento locais
em apartamentos.
No entanto, no Parlamento, os deputados do PS introduziram uma alteração que vai ao encontro das exigências da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Os socialistas recuaram na proibição da emissão de novos registos de alojamento local nos concelhos do Litoral, permitindo que, mesmo em concelhos onde haja carência habitacional, possam continuar a ser convertidos apartamentos em unidades de alojamento para férias. No entanto, os novos registos só avançam com o aval de todos os condóminos.
Na prática, esta mudança dá às autarquias o poder de delimitar áreas de carência habitacional nos seus territórios e continuar a ter novos alojamentos locais nas freguesias que não forem assim classificadas, sem perder o acesso ao financiamento público para dotar o concelho de mais habitação.
Caducidade e renovação dos registos de AL
Os registos de alojamento local (AL) passam a ter a duração de cinco anos, renováveis por igual período, com a proposta do Governo a determinar que os registos emitidos à data de entrada em vigor da lei que enquadra o Mais Habitação, "são reapreciados durante o ano de 2030".
Esta caducidade não se aplica nas situações em que os estabelecimentos de AL "constituam garantia real de contratos de mútuo celebrados até 16 de fevereiro de 2023 e que não tenham sido liquidados em 31 de dezembro de 2029 e "cuja primeira reapreciação só tem lugar após a amortização integral, inicialmente contratada".
Além disso, no prazo de dois meses após a entrada em vigor da lei, os titulares de registo de AL são obrigados a efetuar prova da atividade sob pena de o registo caducar.
Condóminos podem opor-se ao alojamento local
Os condóminos podem opor-se ao alojamento local em frações autónomas de edifícios ou em partes dos prédios urbanos. Tal oposição não pode verificar-se caso o título construtivo preveja essa utilização (AL).
No Parlamento, foi aprovada a proposta dos socialistas que faz depender os novos registos de alojamento local em apartamentos de habitação no Litoral da vontade dos condóminos.
Todos os vizinhos têm de estar de acordo com a instalação desse negócio para que este possa, de facto, ter licença. Ora, 75% dos alojamentos locais em Portugal estão em prédios habitacionais, garante a Associação do Alojamento Local de Portugal (ALEP).
Contribuição extraordinária para o alojamento local
O alojamento local vai passar a pagar uma contribuição extraordinária cuja base tributável é constituída pela aplicação de um coeficiente económico (que tem em conta a área do imóvel e o rendimento) e de pressão urbanística. A taxa aplicável a esta base tributável era de 35% no pacote inicial do Governo, mas baixou para 15% após o debate no Parlamento. Esta taxa aplica-se apenas sobre os apartamentos ou estabelecimentos de hospedagem em frações autónomas, excluindo moradias e os imóveis totalmente dedicados a AL. Particulares que utilizem a sua habitação própria e permanente para AL até 120 dias por ano também estão isentos.
O valor patrimonial tributário (VPT) para efeitos de IMI das casas no alojamento local é sempre igual a 1, deixando de beneficiar da redução do coeficiente de vetustez que acompanha a idade do imóvel.
Arrendamento forçado de casas devolutas
É uma das medidas que mais críticas tem gerado e que consiste na possibilidade de arrendamento forçado de casas que se encontrem devolutas há mais de dois anos e se localizem fora do Interior do país. Mas o texto final tem algumas atenuantes. A redação, aprovada pelos deputados, sublinha que este instrumento só pode ser usado em casos excecionais e cai a penalização fiscal sobre as autarquias que não queiram avançar com o arrendamento forçado, podendo, deste modo, continuar a a aplicar taxas agravadas de IMI.
As casas de férias, as que se encontram vagas por o respetivo dono se encontrar num lar ou a prestar cuidados permanentes como cuidador informal e as dos emigrantes, bem como as das pessoas deslocadas por razões profissionais, de saúde ou formativas, não são consideradas devolutas para este efeito. A proposta prevê que após dois anos, o município notifique o proprietário para fazer obras ou dar uso ao imóvel, tendo este um prazo de 90 dias para responder, findo o qual, mantendo-se a casa vazia, as autarquias podem proceder ao arrendamento forçado.
A lei que define o que é uma casa devoluta já prevê que as empresas de água, luz, gás e telecomunicações enviem às autarquias uma lista com informação sobre consumos, e a proposta do Governo acrescenta que esta lista passa a incluir obrigatoriamente a identificação matricial de cada prédio.
Conversão de imóveis de comércio e serviços em habitação
Prevê-se a possibilidade de alterar de forma automática o uso de imóveis de comércio ou serviços em imóveis para habitação, dispensando-se a revisão de planos de ordenamento do território ou da licença de habitação, desde que a custos controlados.
Fim dos vistos gold para habitação
As novas Autorizações de Residência por Investimento (ARI), ou Vistos Gold, vão acabar apenas para investimento em habitação, o que não afetará a possibilidade de renovação das autorizações já concedidas. Os pedidos de concessão e de renovação para atividade de investimento mantêm-se válidos, incluindo os que estão pendentes de procedimentos de controlo prévio nas câmaras municipais à data da entrada em vigor da lei. Também está excluída da limitação adotada a concessão ou renovação de autorizações de residência para reagrupamento familiar. A proposta inicial do Governo admitia novos Vistos Gold para investimentos ou apoios à produção artística e recuperação ou manutenção do património cultural nacional, mas o PS, partido que sustenta a maioria parlamentar, propôs, em sede de especialidade, a eliminação desta exceção.
Simplificação dos licenciamentos
Os projetos de arquitetura vão passar a ser licenciados apenas com base no termo de responsabilidade dos projetistas e as entidades públicas serão penalizadas no caso de atrasos na emissão de pareceres. O simplex dos licenciamentos foi promulgado pelo presidente da República.
250 milhões para habitação a custos controlados
O programa prevê a aprovação de uma linha de crédito, com garantia mútua e bonificação da taxa de juro, para projetos de habitação acessível, nomeadamente construção ou reabilitação e para aquisição do imóvel, tendo este de ser colocado no mercado de arrendamento.
As casas promovidas com recurso a este apoio ficam afetas ao arrendamento acessível durante pelo menos 25 anos, podendo ser fixado prazo maior no contrato de arrendamento, findo o qual os municípios e o IHRU têm direito de preferência na aquisição das mesmas.
As entidades que podem concorrer a esta medida são as cooperativas, sociedades comerciais de construção civil, municípios e misericórdias ou outras instituições de solidariedade social.
Linha de 150 milhões para municípios realizarem obras coercivas
Prevê-se a criação de uma linha de financiamento de 150 milhões de euros, através do Banco Português de Fomento, para os municípios poderem realizar obras coercivas, reforçando, assim, o cumprimento das prerrogativas das autarquias no âmbito do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.