Doente com Fibrose Quística aguarda tratamento inovador e já reuniu quase 200 mil euros. Associação lembra que Kaftrio é só de dispensa hospitalar.
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Constança Bradell, a doente com Fibrose Quística (FQ) que lançou um apelo dramático nas redes sociais para que seja libertado o acesso generalizado ao Kaftrio, um tratamento inovador para aquela doença, foi hospitalizada após a mediatização do caso. O apelo "não quero morrer, quero viver", publicado pela jovem de 24 anos no Instagram, tornou-se viral e gerou uma onda solidária gigante.
Uma campanha de angariação de fundos, lançada por familiares e amigos para comprar o Kaftrio para Constança - uma vez que a sua entrada no mercado ainda não foi autorizada pelo Infarmed -, atingiu em dois dias mais de 200 mil euros. A Associação Portuguesa de Fibrose Quística admite que a iniciativa pode ajudar a desbloquear o processo, mas alerta para o facto de o medicamento ser de dispensa hospitalar. Nos EUA, revela, o preço do tratamento ronda "os 21 mil euros para um doente durante um mês (252 mil euros/ano), sendo este "negociado por cada país".
Falta ok do infarmed
Após a pressão dos últimos dias, a jovem acabou por ser internada na quinta-feira, no Hospital Pulido Valente (Centro Hospitalar Lisboa Norte). "O meu estado de saúde agravou-se. Estou a ser bombardeada com muita coisa e tenho de me manter calma, mas estou super ansiosa. Estou muito feliz com todo o apoio, mas muito, muito ansiosa", disse, ao JN. "Não consigo falar muito. Estou com aparelho. Não sei nada do que está a acontecer. A minha família é que está a tratar de tudo".
57655 assinaturas na petição "Acesso imediato ao Kaftrio para pacientes com Fibrose Quística" (triplicou em 48 horas).
Constança aguarda ter acesso ao Kaftrio que, apesar de autorizado em toda a Europa, ainda não está acessível em Portugal. Carece de luz verde do Infarmed "para que possa ser utilizado e financiado pelo SNS".
Para já, o tratamento está apenas disponível de forma restrita, através de um Programa de Acesso Precoce (PAP) que, sob indicação hospitalar e aprovação pelo Infarmed, o concede gratuitamente, numa primeira fase, a 10 doentes graves. Caso de Eda Alves, uma adolescente com 16 anos, residente em Moledo, Caminha, a primeira paciente do país a ter acesso à terapia em dezembro de 2020.
Herculano Rocha, Presidente da Associação Portuguesa de Fibrose Quística, critica "a burocracia" que, em seu entender, está a encravar o processo e a levar ao desespero de doentes como Constança Bradell.
Quanto à campanha solidária, recorda que o Kaftrio apenas é produzido pelo laboratório Vertex e "é só de administração hospitalar", embora seja possível encontrá-lo à venda na Internet. Alerta para o facto de ser necessária prescrição médica para a sua aquisição.
"Com a campanha podem ter acesso ao medicamento teoricamente. Na prática nunca ninguém fez isso. Aconteceu com o caso da Matilde, mas foi mais uma pressão para o Infarmed que acabou por conceder a medicação". E faz um apelo: "Espero que, se eventualmente o Infarmed decidir, amanhã ou dentro de uma semana, fazer uma PAP para a Constança - e ela tenha o medicamento gratuitamente -, o dinheiro seja devolvido às pessoas que o deram. Senão começamos a desacreditar isto".
Ao que o JN apurou, caso isso suceda, a doente compromete-se a entregar a verba à Associação Nacional de Fibrose Quística.
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Pais de Matilde angariaram 2,5 milhões de euros
Em julho de 2019, os pais de Matilde - uma bebé que nasceu com atrofia muscular espinhal (AME) tipo 1 - pediram ajuda à população para a compra do Zolgensma (o único medicamento, ainda em fase experimental, para tratar a doença) e conseguiram reunir 2,5 milhões de euros. O Estado acabou por suportar os custos do fármaco, não só para Matilde mas também para outras crianças. Os pais comprometeram-se a usar a verba para ajudar a pagar terapias e equipamentos para outros meninos doentes, mas houve doadores que quiseram reaver o dinheiro das doações.
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