Joacine Katar Moreira critica chumbo do Orçamento e admite voltar a candidatar-se. Cristina Rodrigues estreou-se no comentário televisivo e, "para já", não procura novo partido.
Corpo do artigo
Deixam o Parlamento mais cedo do que queriam, mas com o sentimento de dever cumprido. Lamentam o fim abrupto da legislatura e queixam-se das poucas oportunidades que tiveram para falar em plenário. Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues, as duas deputadas não inscritas, não serão candidatas às próximas eleições, mas não excluem vir a sê-lo "no futuro". Por agora, prosseguirão o ativismo, desta vez fora do Parlamento.
"O balanço da legislatura foi francamente positivo", afirma Joacine Katar Moreira ao JN. Embora refira que a notoriedade dada pelo cargo não lhe trouxe "nada de positivo", a deputada - que em fevereiro de 2020 deixou de representar o Livre - revela: "Aprendi a gostar do trabalho legislativo e a ver nele o centro-motor das grandes mudanças".
Cristina Rodrigues, que saiu do PAN em junho do mesmo ano, também olha com satisfação para o que conseguiu daí em diante: "Foi feito um trabalho muito importante no sentido de dignificar o trabalho dos deputados não inscritos", avalia, considerando ter ajudado a mitigar o "estigma" em torno desta condição.
Quanto às dificuldades sentidas, ambas destacam o conteúdo do Regimento do Parlamento. Joacine é mais incisiva nas críticas, argumentando que este "silencia as deputadas não inscritas" (só podem intervir em cinco debates por ano) e, assim, "dificulta sobremaneira o trabalho parlamentar".
Cristina Rodrigues acrescenta que só podia discursar durante um minuto, além de que estava excluída de participar nos debates com o primeiro-ministro. Os agendamentos para discutir projetos de lei foram outra barreira: "Apenas consegui ter um agendamento próprio", lamenta, garantindo: "Fiz o melhor que pude com as condições que tinha".
"Imensa violência"
Ambas as deputadas se sentiram apoiadas pelos funcionários do Parlamento ao passarem a não inscritas. Quanto aos colegas, Cristina diz ter tido ajuda de gente "de todos os quadrantes políticos", mas Joacine recorda uma reação inicial "de imensa violência".
"Já consigo sorrir quando penso nisso, no medo que causei à estrutura", refere a antiga deputada do Livre. "Nos primeiros tempos", chegou a ficar "confundida" com a "total falta de solidariedade" demonstrada pelos partidos de Esquerda, por oposição às várias "mensagens e palavras de apoio" endereçadas por deputados "ao Centro e à Direita".
Ainda assim, Joacine Katar Moreira admite ter "confiança" de voltar a concorrer ao Parlamento, embora não revele a sua preferência partidária. Cristina Rodrigues não tem, "para já", intenção de aderir a qualquer força política.
A antiga parlamentar do PAN teve esperança, "até ao fim", de que a legislatura iria prosseguir, apontando o "risco" de o país voltar a um impasse semelhante após as eleições. Joacine descreve o chumbo do Orçamento do Estado como "uma irresponsabilidade histórica", mas revela: "Desde a eleição que me diziam sempre que esta seria uma legislatura de dois anos e eu acreditei sempre que assim seria".
Quando terminar o mandato, Cristina - que se estreou recentemente como comentadora na SIC Notícias - irá manter-se ativa nas redes sociais e a "fazer pressão" sobre os partidos. Joacine também continuará a bater-se pelas causas que defende, mas mantendo "as rotinas de sempre".
Projetos
"Importantes conquistas" das parlamentares
Joacine Katar Moreira celebrou algumas "importantes conquistas" durante a legislatura. Em particular, medidas como a criação de um Observatório do Discurso de Ódio, a gratuitidade do processo de naturalização (Lei da Nacionalidade), a regularização da situação dos imigrantes em Odemira ou a concessão de honras de Panteão a Aristides de Sousa Mendes. Cristina Rodrigues destaca a inclusão da violência patrimonial no crime de violência doméstica, a aprovação do estatuto de vítima para as crianças, o fim da discriminação na dádiva de sangue ou a Lei de Bases do Clima.
Outros casos
Deixou PS em 2018
Paulo Trigo Pereira era o deputado único mais recente até 2020. Independente eleito pelo PS em
2015, cortou com o partido três anos depois. O processo foi "perfeitamente pacífico", segundo disse na altura ao JN.
Da Esquerda à Direita
Em 2007, Luísa Mesquita, do PCP, passou a independente. No ano seguinte, foi a vez de José Paulo Carvalho, do CDS.
Debandada em 1975
Em 1975, 21 deputados do PSD tornaram-se não inscritos - entre eles Carlos Mota Pinto, que viria a ser primeiro-ministro. Segundo escreveu o JN à época, o motivo foram as diferentes conceções "de orientação política rumo ao socialismo".