Descoberta bolha de gás a orbitar em torno do buraco negro no centro da Via Láctea
As observações feitas com um telescópio nos Andes do Chile, durante uma campanha para captar imagens de buracos negros, acabaram por confirmar uma hipótese que há muito era colocada por astrónomos: há bolhas de gás quente a orbitar a grande velocidade à volta de buracos negros. Os astrónomos responsáveis esperam agora que a descoberta abra novas portas ao estudo dos buracos negros.
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A descoberta foi feita com o auxílio do telescópio ALMA, situado nos Andes chilenos, durante uma campanha coordenada pela Colaboração Evente Horizon Telescope (EHT) destinada a obter imagens de buracos negros. O estudo publicado quarta-feira, 20, na revista da especialidade Astronomy & Astrophysics, foi liderado por Maciek Wielgus do Instituto Max Planck de Rádio Astronomia em Bona, na Alemanha.
O astrónomo acredita "estar a ver uma bolha de gás quente em torno de Sagitário A* (o buraco negro no centro da nossa galáxia), numa órbita semelhante em tamanho à do planeta Mercúrio, mas que completa uma volta em cerca de 70 minutos. Para que isso aconteça a velocidade a que se desloca tem que ser enorme, cerca de 30% da velocidade da luz!".
Em abril de 2017, a Colaboração EHT juntou oito rádio telescópios existentes no mundo inteiro, incluindo o ALMA, e conseguiu obter a primeira imagem de Sagitário A*. Wielgus e colegas, membros desta colaboração, utilizaram dados do ALMA obtidos na mesma altura em que foram feitas as observações EHT de Sagitário A*.
"Para surpresa da equipa, havia mais pistas escondidas nas medições obtidas apenas com o ALMA sobre a natureza do buraco negro", explica o estudo.
A explosão que deu a pista
Algumas das observações tinham sido realizadas pouco depois de uma explosão de energia de raios X emitida a partir do centro da nossa galáxia. A equipa entende que este tipo de explosões, observadas anteriormente por telescópios infravermelhos e de raios X, estejam associadas aos chamados "pontos quentes", bolhas de gás quente que se deslocam a altas velocidades em órbitas muito próximas do buraco negro.
"O que é mesmo novo e interessante é o facto de estas explosões estarem, até agora, apenas claramente presentes em observações infravermelhas e de raios X de Sagitário A*. Estamos, pela primeira vez, a ver fortes indicações de que pontos quentes a orbitar o buraco negro também estão presentes em observações rádio," avança Wielgus, também membro do Centro Astronómico Nicolau Copérnico na Polónia e da Iniciativa Buraco Negro da Universidade de Harvard nos Estados Unidos.
O estudo adianta que, durante muito tempo, se pensou que estas explosões de energia teriam origem nas interações magnéticas do gás muito quente que orbita muito próximo de Sagitário A*, hipótese agora confirmada pelos resultados deste estudo.
"Descobrimos agora evidências fortes para uma origem magnética destas explosões e as nossas observações dão-nos pistas sobre a geometria do processo. Os novos dados são extremamente úteis na construção de uma interpretação teórica destes eventos," afirma a co-autora do estudo, Monika Mościbrodzka da Universidade Radboud nos Países Baixos.
Novas portas para o futuro
O telescópio ALMA, um rádio telescópio que pertence parcialmente ao Observatório Europeu do Sul (ESO), do qual Portugal faz parte, permite aos astrónomos estudar emissões rádio polarizadas de Sagitário A*, as quais podem ser usadas para investigar o campo magnético do buraco negro.
As observações confirmam algumas das descobertas anteriores feitas com o auxílio do instrumento GRAVITY montado no Very Large Telescope do ESO, que observa no infravermelho. Tanto os dados do GRAVITY como os do ALMA sugerem que "a explosão tem origem num nodo (bolha) de gás que orbita em torno do buraco negro a cerca de 30% da velocidade da luz na direção dos ponteiros do relógio no céu, com a órbita do ponto quente quase de face para nós".
A equipa espera ainda conseguir observar diretamente com a Colaboração EHT as bolhas de gás, de forma a poderem investigar cada vez mais perto do buraco negro e aprender mais sobre ele.
"Talvez um dia estejamos confortáveis o suficiente para dizer que "sabemos" o que se passa em Sagitário A*," conclui Wielgus.