Cinco pessoas, três delas da comunidade cigana, LGBTQ+ e afrodescendente, anotaram milhares de comentários considerados como discurso de ódio durante quase três anos e antes e durante a pandemia. O projeto liderado pela investigadora Paula Carvalho, do INESC-ID, cujos principais resultados foram apresentados esta terça-feira, conclui que o discurso de ódio encoberto é "altamente frequente em Portugal".
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Entre as três comunidades, os conteúdos nocivos foram mais direcionados a afrodescendentes, mas a maior quantidade foi dirigida a pessoas de etnia cigana.
"No YouTube, a comunidade mais visada pelo discurso de ódio foi a cigana. Mas, em termos globais, o discurso de ódio mais intenso, com severidade e impulsividade, foi dirigido a afrodescendentes", explica a investigadora. Foram estudados 39 vídeos e 20 590 comentários, feitos por 8485 diferentes usuários.
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Paula Carvalho chama a atenção de que o projeto é "exploratório" e tem em conta "coleções de dados" selecionadas pelos investigadores, através de vários métodos. As plataformas analisadas foram o Twitter (mais de 63 mil comentários) e o YouTube, por haver maior diversidade de utilizadores, maior acesso e por a recolha estar focada em texto. A investigadora admite que, no futuro, o discurso de ódio poderá ser analisado em redes sociais como o Instagram.
Uma das maiores conclusões do projeto - que inclui três estudos (além das plataformas, houve um grupo focal) - é de que o discurso de ódio encoberto é muito frequente. Usar o humor, o sarcasmo, a ironia ou um "falso elogio" para atingir um certo grupo de pessoas é uma estratégia.
Falar de Salazar
"Os modelos de deteção conseguem reconhecer expressões negativas e ameaças diretas, mas mais dificilmente conseguem reconhecer o ódio disfarçado". Uma das fragilidades que o projeto quer combater.
Paula Carvalho dá um exemplo recorrente contra a comunidade cigana: "alguém que responde a um comentário negativo e diz "força Chega, precisamos de ti" ou "faz cá falta o Salazar"".
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O projeto "Hate Covid-19.PT" pretendia analisar a evolução do discurso de ódio durante a pandemia, mas não obteve uma correlação entre os dois. Eventos como os insultos racistas ao jogador Marega, durante um jogo de futebol, ou a morte de George Floyd, afro-americano asfixiado por um polícia nos Estados Unidos, provocaram picos de discurso de ódio em Portugal.