Medida aprovada em julho deveria entrar em vigor esta segunda-feira. O Ministério da Justiça diz que "o presidente da República não promulgou o projeto". A Presidência nega veto.
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O Governo anunciou que a partir de hoje seria possível realizar escrituras, divórcios, habilitações de herdeiros ou outros atos autênticos através de videoconferência. Mas, afinal, a medida não avançou. Aprovada em Conselho de Ministros a 22 de julho, o regime deveria entrar em vigor hoje. Mas, segundo o Ministério da Justiça, "o presidente da República não promulgou o projeto". Ao JN, a Presidência da República negou o veto e garantiu que o diploma não se encontra em Belém.
De acordo com o gabinete de Marcelo Rebelo de Sousa, "o diploma não foi vetado, nem promulgado, nem se encontra em Belém". Confrontado com esta afirmação, o Ministério da Justiça insistiu na resposta: como o diploma "não foi" promulgado, "não há nada para entrar em vigor".
O diploma, aprovado pelo Governo, determinava que alguns dos atos realizados nas conservatórias de registos e notários passassem a acontecer por videoconferência. Entre eles: divórcios por mútuo consentimento, habilitações de herdeiros e registo de imóveis. Estavam ainda abrangidos contratos de compra e venda, hipotecas, doações e constituições de propriedade horizontal.
De forma a permitir a realização de videoconferências e a troca de documentos em segurança, estava igualmente prevista a criação de uma plataforma informática.
Advogados estão "perplexos"
Para a Ordem dos Advogados, que deu um parecer favorável ao projeto, a não implementação desta medida é uma "preocupação".
"Os advogados estavam a contar com a entrada deste diploma a 15 de novembro. É com grande perplexidade que vemos que o diploma não está publicado, não é dada nenhuma informação sobre o mesmo e não se explica o que se passou", referiu o bastonário Luís Menezes Leitão, admitindo que, no contexto pandémico, a medida era importante.
"A nossa comissão de legislação estudou o diploma e até sugeriu que algumas medidas pudessem também ser aproveitadas para processos judiciais", recordou Luís Menezes Leitão.
Visão contrária tem a Ordem dos Notários, que deu parecer negativo. O bastonário Jorge Silva garante que não é contra o diploma ou atos à distância, mas ressalva que há aspetos a ter em especial consideração, como a "proteção de pessoas vulneráveis".
"A questão que mais nos preocupa é não haver um regime adequado para a proteção dos vulneráveis, como vítimas de violência doméstica ou pessoas idosas. Achávamos também que, numa primeira fase, deveria ser limitado a alguns atos", referiu ao JN, exemplificando: "Se uma vítima de violência doméstica estiver em casa a fazer a doação de um bem, não há forma de verificar se está a agir de forma livre".
Para Jorge Silva, neste momento, não há uma "extrema urgência" para a entrada em vigor do diploma. Defende, por isso, uma mudança "gradual". "A necessidade de atos à distância era de uma extrema urgência em março e abril de 2020 [na pandemia]", disse.
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Plataforma
Tal como o JN noticiou em agosto, o diploma previa a criação e utilização de uma plataforma informática para realizar os atos, de forma a garantir a segurança do processo. O acesso iria obrigar à autenticação do utilizador, através do cartão de cidadão ou da chave móvel digital.
Outros serviços
A Segurança Social arrancou, em janeiro deste ano, com um projeto-piloto de atendimento remoto por videoconferência, mediante marcação prévia. Em outubro, 67 balcões em todo o país contavam já com esta modalidade de atendimento. Também na saúde, a teleconsulta já é uma realidade.