Em pouco mais de sete anos, Portugal contabiliza acima de três centenas de passageiros desordeiros em aeronaves. Insistem em beber em excesso, fumar e usar dispositivos eletrónicos a bordo de aviões, apesar de incorrerem em coimas que podem chegar aos quatro mil euros.
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Os dados, avançados ao JN pela Autoridade Nacional da Aviação Civil, revelam que, desde 2016, foram levantados processos a 335 passageiros desordeiros. O pior ano desse período foi 2018, altura em que se verificaram 111 situações de desordem. Seguiu-se 2020 com 91 casos, 2017 com 44 situações e 2019 com 36. No ano de 2016, houve 26 passageiros desordeiros. No ano passado, foram registados seis casos e, em 2021, cinco. Em 2023 (dados até 27 de abril), já foram detetadas 16 situações de desrespeito.
Só com queixa da PSP
As infrações que levaram à abertura de processos de contraordenação estão ligadas, maioritariamente, ao desrespeito pela proibição de fumar a bordo, tendo-se registado um total de 254 situações desse tipo entre 2016 e abril deste ano. Seguem-se comportamentos que comprometem a segurança, como passageiros alcoolizados (60 situações) e a utilização indevida de dispositivos eletrónicos (27 situações), nomeadamente de telemóveis. Em muitas situações de desordem a bordo, as pessoas cometeram mais do que uma infração.
Este tipo de comportamento pode prejudicar outros passageiros, originar atrasos nos voos e causar danos nas aeronaves, mas nem sempre é possível identificar os infratores. Em abril passado, por exemplo, foi notícia a destruição de casas de banho de um avião da EasyJet que fizera a ligação entre o Funchal e Lisboa. Após a aterragem na capital, a PSP foi chamada a bordo, contudo ninguém admitiu o vandalismo e não foi possível identificar o autor (ler casos).
De acordo com a ANAC, os processos de contraordenação instruídos são apenas aqueles em que existe um auto da PSP e, geralmente, circunscrevem-se a infrações no interior das aeronaves, ficando de fora muitos outros desacatos. Só no ano passado, por exemplo, os aeroportos reportaram 196 casos de passageiros com comportamentos desordeiros, mas apenas foram levantados seis processos.
o Dobro na pandemia
Em 2020, fruto da pandemia de covid-19, registou-se um decréscimo de 51% no tráfego aéreo. Ainda assim, foram detetadas bem mais do dobro de situações de desordem do que no ano anterior (91 em 2020 e 36 em 2019).
Em 2022, houve uma recuperação do setor da aviação, com um aumento de descolagens e aterragens acima dos 50% face a 2021 e uma subida de 120% no número de passageiros, embora tenha ficado aquém de 2019 (menos 3,36 milhões de passageiros). Apesar deste incremento no movimento, o número de processos a passageiros desordeiros pouco se alterou (cinco em 2021 e seis no ano de 2022).
Casos
Amarrado por agredir
Um passageiro português teve de ser amarrado, após agredir um comissário de bordo num voo da TAP entre o Porto e o Rio de Janeiro, no Brasil, em maio de 2022. O homem discutiu com um elemento da equipa e agrediu outro, depois de ter sido apanhado a fumar na casa de banho e de ter o passaporte apreendido.
Mordeu pessoas
Em 2017, num voo da TAP entre Fortaleza, no Brasil, e Lisboa, um homem mordeu outros passageiros e agrediu a tripulação de cabina que o tentou acalmar. A desordem levou o comandante a desviar o voo para o aeroporto mais próximo para fazer desembarcar o infrator. Em 2020, o Tribunal de Justiça da União Europeia, que avaliou o pedido de indemnização de outra pessoa que seguia a bordo pelo atraso provocado, considerou que a TAP nada tem de pagar, por ser uma circunstância extraordinária.
Apanhado a fumar
No ano passado, um passageiro foi apanhado a fumar na casa de banho de um avião da Ryanair, que fazia a ligação entre Lanzarote, em Espanha, e Bournemouth, no Reino Unido. O avião foi desviado para Faro e ficou imobilizado durante hora e meia.
Faz topless no voo
Em fevereiro deste ano, uma mulher de 49 anos causou grande alarme num voo da Aeroflot entre Stavropol e Moscovo, na Rússia. Trancou-se na casa de banho para fumar um cigarro e, depois, tentou invadir a cabina dos pilotos, enquanto gritava que todos iam morrer. Também mordeu um comissário de bordo e despiu-se até ficar em topless. Acabou algemada e foi detida à chegada a Moscovo.
Tentou abrir porta
Em março, um norte-americano tentou abrir a porta de emergência de um avião da United Airlines que voava entre Los Angeles e Boston, nos Estados Unidos da América. Quando se apercebeu que suspeitavam dele, o passageiro tentou esfaquear uma hospedeira no pescoço com uma colher metálica partida.
Mil euros é o valor mínimo da coima em processo de contraordenação por negligência. É considerada uma contraordenação muito grave, com multa máxima de 2500 euros. Em caso de dolo, vai de 2000 a 4000 euros para pessoas singulares. Se for reincidente, há agravamento do valor. Os passageiros podem sofrer uma sanção acessória, como a publicitação da infração e identificação do autor.