Desde o início de junho que a percentagem de óbitos no total de infeções está a baixar. Mudança no perfil dos infetados e melhor conhecimento por parte dos médicos são justificações possíveis.
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A diminuição do número de infeções na população mais velha, a capacidade de resposta hospitalar, o conhecimento adquirido pelos profissionais de saúde, também em relação aos medicamentos de outras patologias usados no tratamento da covid-19, podem ajudar a explicar a diminuição da taxa de letalidade em Portugal atribuída ao novo coronavírus.
Desde o início de junho que a letalidade total está a descer (percentagem dos óbitos no total de infeções), não acompanhando o recente aumento na subida de novos casos diários de infeção - que têm oscilado entre os 200 e os 400 desde a última semana de agosto. A 1 de junho atingia os 4,4%, três meses depois, a 1 de setembro, estava em 3,1%.
Fernando Maltez, diretor do serviço de Infeciologia do Hospital Curry Cabral, em Lisboa, considera que o menor número de óbitos "tem a ver, seguramente", com o aumento de novos casos "em grupos etários mais jovens e, eventualmente, em grupos não só mais jovens mas com menos comorbilidades (outras doenças associadas)".
O fenómeno não é exclusivo de Portugal: no Reino Unido, na última semana de agosto, mais de dois terços dos novos casos foram em pessoas com menos de 40 anos (no pico de pandemia eram menos de 28%) e a letalidade também está a baixar, de acordo com o "The Guardian". Em Portugal, de 1 de junho a 1 de setembro, as faixas etárias dos 20 aos 29 anos e dos 30 aos 39 anos foram as que mensalmente apresentaram maior número de infeções. Entre junho e julho, a primeira contabilizou 1871 novos casos, a segunda 1836.
Números bastante maiores do que os verificados nas idades mais elevadas. Nestes dois meses, entre os 70 e os 79 anos, verificaram-se mais 443 casos, e a partir dos 80 foram 741. Entre abril e maio, o aumento de novas infeções na população idosa foi de 1394 e 3032, respetivamente.
ventilação mais eficaz
O infeciologista, ouvido pelo JN, não afasta também o facto de "seis meses de pandemia terem trazido alguns ensinamentos relativamente ao modo de lidar com estes doentes", nomeadamente em alguns procedimentos, como a ventilação. Peso menor terão, no seu entender, os medicamentos utilizados, que "não são fármacos curativos".
José Artur Paiva, diretor do serviço de Medicina Intensiva do Hospital de S. João, no Porto, sublinha que a letalidade em Portugal "é muito baixa" comparada com outros países. Há "múltiplas razões" para esta diminuição, começando pelo "mérito dos sistemas de resposta ao doente crítico", diz.
"Aqui em Portugal não houve rutura do sistema hospitalar, como assistimos noutros países, nomeadamente em Itália e um pouco em Espanha", disse, sublinhando que a "capacidade de resposta foi construída de forma muito rápida, ocupando áreas que tradicionalmente não eram de medicina intensiva, embora as equipas fossem sempre lideradas por intensivistas". Além disso, o resultado dos tratamentos foi mais bem-sucedido do que noutros países, defendeu.
O também presidente do Colégio de Medicina Intensiva da Ordem dos Médicos acrescenta que, "nos últimos dois meses, parece haver um pendor etário de pessoas mais jovens" com a doença, o que também interfere nos óbitos.
Além disso, o facto de sermos um país que "faz uma boa quantidade de testes" tem como efeito lateral a diminuição da letalidade, pois aumenta o denominador sobre o qual é calculada.