Cerca de 200 enfermeiros em greve concentraram-se, esta quinta-feira, à porta do Hospital Cuf Descobertas, em Lisboa, exigindo a melhoria das condições de trabalho e aumentos salariais para todos.
Corpo do artigo
Entre buzinas e vuvuzelas, duas centenas de enfermeiros do setor privado manifestaram-se, esta manhã, à porta do Hospital Cuf Descobertas, no Parque das Nações, em Lisboa, reivindicando a implementação de 35 horas semanais, o aumento salarial, incluindo subsídios de Natal e férias, para quem trabalha por turnos e o pagamento do regime de prevenção. "É tempo de valorizar, os salários aumentar", "Verdadeira negociação, só com valorização" e "35 horas para todos sem demoras", entoavam, cumprindo a greve durante os turnos da manhã e da tarde desta quinta-feira.
Entre as reivindicações estão ainda a compensação das chamadas "horas penosas", trabalhadas em noites, nos fins de semana e feriados, o aumento salarial em 10% para todos os enfermeiros, a atualização do subsídio de refeição para 8,10 euros e 25 dias úteis de férias por ano.
Esta é a primeira greve dos cerca de 4200 enfermeiros que exercem funções nas 75 unidades de saúde dos grupos privados Cuf, Luz e Lusíadas, abrangidas pela Associação Portuguesa da Hospitalização Privada (APHP), convocada pelo Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP).
"Na área metropolitana de Lisboa, o grupo Cuf foi o mais afetado, sendo que os Lusíadas tiveram cerca de 65% [de adesão], a Cuf de Viseu 100% e a Cuf da Amadora 100%. É uma diversidade enorme de instituições onde houve uma ampla adesão", avançou, em declaração aos jornalistas, no local, o presidente do SEP, José Carlos Martins.
O sindicalista denunciou que os "operadores privados continuam a ter muitos clientes, graças às deficiências do SNS, e os resultados económicos conhecidos demonstram bem as margens de lucro que dá perfeitamente para terem profissionais mais empenhados, mais motivados e mais envolvidos".
"Recebemos uma nova proposta no dia 14 da associação, contudo continua a ser altamente insuficiente porque em relação às horas de qualidade propõem pagar mais 10% por três horas de sábado. Portanto agora vamos retomar as negociações e esperamos que as entidades privadas evoluam nas suas posições de forma a termos um acordo justo para ambas as partes", afirmou.
Ainda sem uma nova data para a próxima reunião, o SEP espera que depois do dia de greve seja confrontado "com uma nova contraproposta" por parte das entidades empregadoras. Questionado se estão dispostos a ceder alguma das reivindicações, o dirigente sindical salvaguardou que será definido com os enfermeiros o que é que poderá cair e aquilo que lhes é "intransponível".
Medo de represálias
Não temos evolução na carreira, nem o devido reconhecimento
Entre a multidão, muitos profissionais de saúde preferem não ser identificados, com medo de poderem sofrer represálias. Rita, enfermeira na Clínica Cuf Alvalade, ergue uma bandeira vermelha e um autocolante no peito que diz "estou em greve". Com 20 anos de carreira, diz receber menos agora do que quando começou. "As nossas condições de vida nunca foram boas. Não temos evolução na carreira, nem o devido reconhecimento", lamenta. Numa altura em que sente os efeitos da inflação, Rita denuncia que "estão a querer tirar o subsídio de turno e de disponibilidade" aos enfermeiros.
Noutro hospital do mesmo grupo trabalham António e Madalena. Fazem greve pela primeira vez em reposta à tabela de salários proposta e aos horários. "Já estávamos a sentir a necessidade de mostrar o nosso descontentamento há algum tempo. Independentemente do sindicato que seja, sentimos que é um momento de mudança porque tem havido muito aposta na saúde privada, com os seguros de saúde, mas o volume de trabalho tem aumentado cada vez mais e não tem havido o reconhecimento por parte da entidade patronal", apontou o jovem enfermeiro. "Na prestação de cuidados não nos é pago um subsídio de risco e não nos sentimos corretamente valorizados pelo investimento que fizemos na nossa formação", afirmou Madalena.
Já depois do protesto ter terminado, em declarações aos jornalistas, Óscar Gaspar, presidente da APHP, salvaguardou que as reuniões com o sindicato estão a decorrer "com grande abertura negocial", considerando a greve "extemporânea". A APHP propôs um aumento salarial de 6%, o que significaria um aumento de pelo menos 55 euros mensais. Um valor que o responsável disse ser "razoável", sendo superior ao da função pública. "Estamos a falar de 1145 euros que podiam já estar a ser aplicados se tivéssemos chegado a acordo", salientou, mostrando-se convicto de que o acordo estará para breve.
O sindicato apelou ainda que todos os enfermeiros se juntem à manifestação nacional da CGTP pelo aumento geral dos salários e das pensões e contra a subida do custo de vida, marcada para o próximo sábado, dia 18 de março, em Lisboa.