O Governo aprovou, ontem, um regime excecional em matéria de revisão de preços de obras que permite que os empreiteiros possam exigir a revisão do valor contratualizado sempre que os custos de materiais ou de mão-de-obra subam ou desçam 20%. O setor elogia a medida.
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A intenção já tinha sido anunciada na semana passada e concretizou-se, ontem, com a aprovação do decreto-lei. O novo regime excecional de revisão de preços e de prorrogação de prazos de execução da obra só vigora em 2022 e abrange "os contratos de empreitadas de obras públicas já em execução, ou aqueles que venham a ser celebrados durante a vigência do presente diploma", lê-se no documento, a que o JN teve acesso.
A diferença face ao regime de revisão de preços que vigorou até agora é que as construtoras podem exigir a revisão e os donos de obra não podem recusar, caso se verifiquem variações de preços de 20% ou mais em materiais ou meios que correspondam a, pelo menos, 3% do preço inicial. Cabe ao empreiteiro apresentar a proposta de revisão sustentada nestes critérios e o dono de obra apenas pode negociar o valor.
Contraproposta vinga
Sempre que um dono de obra, por exemplo uma câmara municipal, receba uma exigência de revisão de preços, tem 20 dias para responder, caso contrário "considera-se que a proposta foi aceite". Se não aceitar, pode optar por apresentar uma contraproposta.
Nas situações em que não há acordo, prevalece a contraproposta do dono de obra, desde que calculada com base em dois critérios legalmente definidos. A nova lei passa a permitir que os atrasos no cumprimento do plano de trabalhos possam dar lugar "a uma prorrogação do prazo de execução" sem qualquer penalização, desde que o construtor comprove a impossibilidade de "obter materiais necessários para a execução".
O novo regime visa "evitar paragens no investimento público, numa altura em que o aumento dos preços está a causar grandes pressões nas empreitadas e num momento em que Portugal tem em curso um conjunto muito vasto de obras públicas", justificou o Governo.
Bento Aires, presidente da Ordem dos Engenheiros - Região Norte, elogia o Governo pela "capacidade que teve para encontrar uma resposta", ainda que preveja "alguma litigância e alguma discórdia" entre empreiteiros e donos de obra na discussão dos preços.
Manuel Reis Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN), já tinha dito, na semana passada, que a medida "é importante" e gera "agrado" no setor.
A nova lei
Aplica-se a tudo
A forma de revisão extraordinária de preços aplica-se a todos os materiais, tipos de mão-de-obra ou equipamentos de apoio existentes na obra.
Quando não há acordo
Sempre que não haja acordo, a contraproposta do dono da obra prevalece, desde que calculada pelo método de garantia de custos ou pelo coeficiente de atualização multiplicado por uma compensação de 1,1.
Quem revê o preço
A proposta inicial do decreto-lei previa que o cálculo dos 20% de variação fosse medido pelos números trimestrais do Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção. No entanto, por haver quem defenda que os números devem ser os do Instituto Nacional de Estatística, o construtor pode escolher.
Aplicável a privados
O disposto no diploma é aplicável, com as necessárias adaptações, aos contratos de empreitadas de obras particulares e aos contratos públicos de aquisição de bens e de serviços.
Origem da crise
A escassez e escalada de preços na construção tem origem na crise energética decorrente da covid-19 e na guerra da Ucrânia. Está a deixar vários concursos públicos de obra vazios e a paralisar empreitadas já iniciadas.