Livrarias já sentem quebra na procura por livros novos, que só serão 30% do total este ano. Diretores queixam-se de falta de espaço e de orientações para o que fazer ao material velho.
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Este ano, a taxa de reutilização dos manuais escolares atinge os 70%, confirmou o Ministério da Educação (ME) ao JN. O programa prevê que o mesmo livro possa ser reaproveitado durante três anos. As livrarias notam a quebra na procura e há escolas sem espaço onde guardar os livros mais velhos, sem condições de reutilização ou fora de prazo. Só os alunos do 1.o ao 4.o ano vão ter todos os manuais novos, uma vez que a reutilização não se aplica a este ciclo. No início do mês, ainda sem a análise aos livros devolvidos pelos alunos do 2.o Ciclo, o ME avançou que a taxa de reutilização seria superior a 60%. Fechado esse processo e já com as escolas a entregarem os livros para o próximo ano, através da emissão dos vouchers, a tutela confirmou que só 30% dos manuais do próximo ano, distribuídos pelo programa de gratuitidade nas escolas públicas ou com contrato de associação (MEGA), serão novos.
"Já tenho permanentemente marcações, entre as 9 e as 17 horas, de famílias que vêm à escola levantar os vouchers e levar os livros para o próximo ano", explica Manuel Pereira, diretor do agrupamento General Serpa Pinto (Cinfães) e presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE). Já David Sousa, vice-presidente da associação nacional de diretores (ANDAEP) espera um pico de procura só a partir de setembro. "O aumento do trabalho é esperado com a subida da taxa de reutilização", assume o diretor do agrupamento Frei Gonçalo Azevedo (Cascais).
No ano passado, recorde-se, por determinação de uma maioria parlamentar, o programa de reutilização foi suspenso por causa do impacto da pandemia e todos os livros distribuídos por vouchers foram novos. Este ano, já há livrarias e até cadeias como a Note e o Continente que notam a quebra na procura. Até ao momento, "cerca de 40% das encomendas de manuais" nas marcas do grupo Sonae correspondem à troca de vouchers.
"Ainda estamos em agosto mas já se nota uma quebra por mais manuais serem reutilizados", afirma Margarida Moreira, proprietária da Papelaria Maia, em Paredes. Glória Rosa, proprietária da Livraria Lusíada, em São João da Madeira, concorda: "é lógico, mas a redução é muito grande em relação ao ano passado".
Os livreiros asseguram que apesar de esperarem maior procura no início de setembro, muitas famílias já optam por fazer as encomendas online. O El Corte Inglés, por exemplo, tem 50 mil manuais encomendados e uma taxa de entrega que ronda em média as duas semanas.
livros para abate
Após quatro anos de programa, há escolas que estão sem espaço onde guardar os livros velhos, já sem condições de serem reutilizados ou os manuais que deixam de estar em vigor. O Agrupamento de Manuel Pereira é um dos casos mas há muitos pelo país, garante, repetindo que a falta de espaço "é um constrangimento brutal".
O presidente da ANDE considera que especialmente os manuais que deixaram de vigorar mas estão em boas condições deviam ter um fim "mais digno". Por exemplo, sugere serem recolhidos por organizações não-governamentais e enviados para os PALOP. Há sempre livros que ficam nas bibliotecas, mas é impossível guardar todos, pelo que o destino de muitos será "o abate". Ou seja, o papelão, explica.
Sem orientações do ME, as escolas têm de ser criativas, considera David Sousa. O vice-presidente da ANDAEP concorda que a falta de espaço e a acumulação dos manuais, devido ao programa e à reutilização, "é um desafio" para as escolas. "Chegou o momento de se avançar com a desmaterialização", defende, considerando que a falta de equipamentos de informática individuais para todos os alunos e a fraca rede das escolas serão os obstáculos a superar.
"Sendo os manuais de gestão das escolas, o ME não prescreve a forma de utilização", respondeu a tutela quando confrontada com as preocupações dos diretores.
PROPOSTA
PCP quer cadernos de fichas grátis, Confap dedução do material no IRS
O PCP defende o alargamento do programa de gratuitidade dos manuais escolares aos livros de fichas. A medida pode ser uma das propostas dos comunistas no âmbito das negociações para o próximo Orçamento do Estado. "No sentido da valorização da escola pública, o PCP bater-se-á para que a gratuitidade seja alargada às fichas de exercícios para todos os alunos do ensino obrigatório, assim como outras propostas para reforço das condições de aprendizagem e de funcionamento das escolas", prometeu Jerónimo de Sousa, num vídeo divulgado este mês. O secretário-geral recorda que o alargamento do programa de manuais até ao 12.o ano "decorreu de uma proposta apresentada ao longo de anos" pelos comunistas. A Confederação das Associações de Pais defende que o material escolar volte a ser dedutível em IRS. A Confap, explica o dirigente Alberto Santos, só não coloca a gratuitidade das fichas em primeiro lugar das reivindicações por muitas autarquias "extravasarem as suas competências" e distribuírem gratuitamente esses livros, especialmente no Ensino Básico. "Mas seria o complemento perfeito", admite Alberto Santos.
À LUPA
1 milhão de vales
Os vouchers começaram a ser emitidos uma semana mais cedo do que o previsto. Até 12 de agosto, de acordo com o ME, tinham sido emitidos 1,2 milhões para alunos de todos os anos de escolaridade.
E se faltarem?
Se ao seu educando faltarem vouchers para manuais de determinadas disciplinas, não estranhe. Nem todos são emitidos numa única vez, por exemplo, explica a tutela, devido à turma ainda não estar completa ou por ainda lhe faltar entregar um dos livros do ano passado. O conselho do ME é que vá acompanhando a plataforma MEGA para confirmar atualizações.