Escolas só devem abrir se não fizerem aumentar taxa de transmissão para cima de 1, diz especialista
Especialista diz que, em setembro, o regresso às aulas teve impacto de 20% a 25% no aumento das infeções em seis dias.
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O regresso às aulas só deve ser equacionado quando a taxa de transmissão (RT) da covid-19 for de tal maneira baixa que o impacto da medida não provoque o seu aumento para um valor acima de 1.
O patamar foi defendido esta tarde de quarta-feira, na Assembleia da República, pelo professor de matemática, da Universidade de Lisboa, Jorge Buescu.
O matemático explicou que só nos primeiros seis a 15 dias após o novo ano escolar, que arrancou em setembro, se verificou um aumento de 20% a 25% na taxa de transmissão. E que, por isso, para que os alunos possam voltar a ter aulas presenciais, a taxa de transmissão terá de comportar esse aumento e permanecer abaixo de 1.
O especialista revelou ainda que um Rt acima de 1.2 antecipa a chegada de uma nova vaga da pandemia de covid-19 e que por essa razão este valor deve ser evitado a todo o custo.
Ouvido na Comissão Eventual para o Acompanhamento da Aplicação das Medidas de Resposta à Pandemia, Jorge Buesco frisou que "muito rapidamente se perde o controlo" e que as medidas de contenção da segunda vaga, no outono passado, demoraram um mês e meio a produzir resultados.
A 1 de dezembro, revelou, a taxa de transmissão era inferior a 1. No último dia do ano estava nos 1.4. "Naquele momento percebi que as coisas iam correr muito mal" sublinhou.
242 camas em cuidados intensivos
Na mesma audição, Carlos Antunes, especialista na análise e modelação de fenómenos físicos, da Universidade de Lisboa, revelou que a incidência da infeção nas idades entre os 6 e os 12 anos e entre os 13 e os 17 estava a aumentar a uma variação de 6% por dia desde o final de dezembro. Eram as faixas etárias onde a infeção por covid-19 estava a crescer mais.
O encerramento das escolas, a 22 de janeiro, segundo o investigador, começou a produzir efeitos no final do mês, altura em que as novas infeções começaram a descer no país.
Carlos Antunes apresentou aos deputados uma combinação de indicadores que poderiam ser utilizados para determinar a aplicação de medidas de contenção ou para as aliviar. Uma espécie de linha vermelha que prevê um valor de Rt igual ou interior a 1.10, uma média de incidência a sete dias igual ou inferior a três mil novos casos, uma percentagem de testes positivos média (a sete dias) igual ou inferior a 7,5%, um limite de 242 camas em cuidados intensivos e 1300 em enfermaria.
Estes patamares tanto poderiam ser aplicados a nível nacional ou por regiões, conforme o modelo de desconfinamento a aplicar, adiantou.
Sobre a testagem, João Seixas, professor do Departamento de Física do Instituto Superior Técnico (IST), considerou que não é fácil fazer rastreios de contactos com mais de 10 mil novos casos por dia, apelando a que "haja em cima da mesa uma outra forma de rastrear.
Questionados sobre os transportes públicos serem ou não um local de transmissão, João Seixas, respondeu ser "impossível fazer o nexo causal. Jorge Buesco, por seu lado, frisou que como as cadeias de contágio se perdem, há uma falha nos dados. Mas, frisou, "por não termos dados não significa que não haja transmissões".
Escolas transmitem infeção entre agregados familiares
Henrique Oliveira, professor do Departamento de Matemática, também do IST, revelou que só são conhecidos 16% dos contágios. Nas escolas, prosseguiu, "grande parte da transmissão é feita por assintomáticos ou sintomáticos antes de terem sintomas", classificando os estabelecimentos de ensino como local que serve para transmitir a infeção "de agregado para agregado familiar".
Este investigador apelou a que se pense no desconfinamento de forma a evitar "os erros de dezembro e janeiro".
O professor do IST estima que o país precisa de alcançar uma imunidade de grupo de 77,8% da população para combater a doença. Por um lado porque as vacinas não têm 100% de eficácia e por outros porque "há variantes com um Rt maior". Mas também explicou que a imunidade não se consegue só com a vacinação e que "pode haver quase o triplo" de pessoas que foram infetadas em relação aos mais de 700 mil casos recuperados de covid-19 e que esta população já tem alguma imunidade.