Patrícia Cunha vai votar. João Filipe Oliveira vai votar. Nuno Rocha vai votar. João Duarte não vai. Mas, se pudesse, ia. Equivale isto a dizer que, apesar de o grau de interesse de cada um deles na política variar, todos encaram o voto como um direito que deve e merece ser exercido.
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Neste contexto, a perspetiva de João Filipe - estudante de Direito na Universidade Católica do Porto, de 20 anos - não será exatamente retirada da "Juventude inquieta" de Francis Ford Coppola, mas revela um certo desconforto com o estado da nação. Pelo menos, com a parte que se dedica ao jogo político. "Estou indeciso entre o voto em branco e o voto nulo. Sei quem quero que ganhe, mas não quero contribuir para isso. Para bem da minha própria consciência". Dois anos mais velha, Patrícia, que leva os livros até à Universidade de Aveiro para concluir o curso de Educação Básica, já sabe a cor que vai atribuir ao boletim: alva. "Para mostrar o meu desagrado".
Aliás, a estudante não nutre particular apreço pela arena política. "Não me interesso. Na minha família, não fomos habituados. Quando comecei a dar mais atenção às notícias, em especial, na televisão, muitas situações não correspondiam à realidade. Desinteressei-me por achar que eles mentiam". Não está só. Segundo um estudo, de maio passado, entre 2007 e este ano, registou-se, na faixa etária dos 15 aos 24 anos, um decréscimo de 15,8 pontos percentuais no interesse pela política. (Ver infografia na página seguinte) Nuno Rocha tem 19 anos, bem como cartão de estudante da Faculdade de Economia do Porto.
E não contribuiu para a quebra referida no parágrafo anterior. "Comecei a interessar-me aos 13, 14 anos, quando ganhei autonomia em frente à televisão. Também fui um pouco influenciado pelo meu avô, que era muito crítico". Inclusivamente, a escolha de curso já implicava um pressuposto: "Economia e política são indissociáveis". João também começou cedinho. Bem, levando em conta que tem apenas 16 anos, não podia ter sido de outra maneira.
A palavra, então, ao estudante da Escola Secundária de Filipa de Vilhena, no Porto, 12.º ano, área de Economia. "Desde muito novo, procurei informar-me. Através da televisão, dos jornais online, que é informação mais acessível". Mau grado a menor idade, a intervenção pública não lhe é estranha. "Participei em debates nas escolas". E até foi à final do Parlamento Jovem. Já João Filipe não teve outra hipótese senão interessar-se pelo labirinto político. "O meu avô foi candidato a duas juntas, o meu padrinho a uma Câmara e a minha mãe sempre participou na atividade". Curiosamente, "andei lá no meio e ainda hoje não percebo muito bem como aquilo funciona".
Menos curiosamente: "A falta de transparência não me choca porque já estou habituado". Algo previsivelmente, o caráter dúbio da prática política é o que mais incomoda o quarteto. João fala em "má gestão dos fundos e os caminhos que os políticos seguem para chegar onde querem", Patrícia contrapõe com "corrupção, mentira e falta de humildade" e João Filipe adiciona "a péssima qualidade" dos intervenientes. Maus impedem bons de aparecer Nuno elabora um pouco mais: "O que mais me choca é a profissionalização dos políticos. Nos discursos e nos debates, há um excesso de palavras, sem substância. Aposta-se na "marketização" dos programas eleitorais, na estratégia para vender. Devia ser apenas debate de ideias. A ligação com a vida real não existe. Os bons não aparecem mais porque os maus não deixam".
De qualquer modo, as críticas não surgem sem a proposta de alternativas. Como a de João, que defende a "procura de maior cumplicidade entre eleitores e Governo. Os debates deveriam acontecer mais vezes ao longo dos mandatos, não só em tempo de eleições, para as pessoas terem a noção do que se está a passar, do que o Governo anda a fazer". Patrícia e João Filipe são mais pragmáticos. Ele considera que se devia "tentar incutir nos políticos o verdadeiro objetivo da governação", enquanto ela crê que bastava "cumprirem o que dizem". Nuno - que, nas legislativas de 4 de outubro, vai votar pela primeira vez - julga que é essencial "reformar o sistema político, de forma a criar condições para planear, para se criar uma base de trabalho" transversal às diversas legislaturas. Complementarmente, crê que os "políticos deviam ser mais bem pagos, para que se conseguisse cativar as melhores pessoas para decidirem melhor. Era mais despesa, mas uma despesa bem empregue".