Um ano após eleições, politólogos falam de um Executivo mais partidário, mais "instável" e "à deriva", com PSD de Montenegro "à procura de rumo".
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Desde as eleições que deram maioria absoluta a António Costa, há exatamente um ano, o Executivo entrou num desgaste acelerado. Para além da natural erosão de uma governação de sete anos, as polémicas dominaram os últimos dez meses. Quem mais tem ganho com este desgaste é o Chega, referem os politólogos Filipe Teles e Miguel Ângelo Vilela Rodrigues. Mas a estratégia de Costa também passará por alimentar o "fantasma" daquele partido chegar ao poder.
O avolumar de casos e casinhos tem provocado novas demissões. E forçou Marcelo Rebelo de Sousa a assumir um estilo mais exigente. Pressionou, publicamente, uma secretária de Estado a demitir-se e exigiu que o questionário a governantes abranja os atuais membros.
Marcelo criticou os erros de orgânica do Governo, mas afastou eleições por não "vislumbrar" uma alternativa forte" e porque o "experimentalismo" não é saudável para a democracia.
Filipe Teles, pró-reitor da Universidade de Aveiro, refere "surpresa pelo desgaste tão rápido" de um Governo de maioria absoluta.
Defraudada a expectativa de que Costa apostasse em independentes, nota o reforço de socialistas e pessoas próximas do PS. O que "torna o Governo mais suscetível ao escrutínio público". Está "instável" e "muito mais preocupado em defender-se das acusações do que em governar", o que "só tem reforçado a Oposição".
Para Filipe Teles, "quem mais ganhou com a maioria absoluta foi o PSD e o Chega". E "principalmente o Chega, que capitaliza muito com esta insatisfação". Já Costa "não tem sido capaz de gerir os casos e casinhos", que "transformam o Governo num espaço rotativo".
"PSD teme ser salpicado"
Miguel Ângelo Rodrigues, da Universidade do Minho, conclui, face às promessas de que a maioria absoluta traria estabilidade, certeza e confiança, que Costa "falhou em toda a linha". Após "um ano de maioria à deriva", o politólogo diz que "a estabilidade está a prazo" e "o país político vê, nas europeias, um plebiscito à continuidade do Governo de Costa". Já "a confiança dos portugueses está minada e isso reflete-se no crescimento do Chega e na abstenção".
"A Oposição não está muito melhor" e "o único partido que parece ganhar apoio popular é o Chega". A propósito, diz ser estratégia de Costa "manter vivo o fantasma de que uma alternativa ao Governo PS passa sempre pela direita radical".
"Todo este clima reforça as intenções de voto" no Chega, enquanto "o PSD de Luís Montenegro anda à procura de rumo". Miguel Ângelo Rodrigues crê que "tarda a reagir aos acontecimentos, deixa-se ultrapassar na liderança da Oposição, mas, sobretudo, tem receio de ser salpicado com os casos e casinhos". A propósito, nota a mudança de atitude quanto a uma moção de censura, a reboque das sondagens.
Polémicas num ano de governação
Sérgio Figueiredo
As Finanças anunciaram a contratação do consultor por ajuste direto. O contrato de dois anos e o salário equiparado ao dos ministros levaram a Oposição a falar de pagamento de favores e de promiscuidade entre Fernando Medina e o ex-jornalista.
Marido de Abrunhosa
António Trigueiros de Aragão, marido da ministra da Coesão Territorial, ter-se-á associado a um empresário chinês condenado por corrupção envolvendo vistos gold. Uma empresa que criou terá tido apoios de 133 mil euros do Estado.
Pizarro gerente
Três semanas após tomar posse como ministro da Saúde, soube-se que era gerente de uma empresa de consultoria técnica e aconselhamento em serviços de saúde. Renunciou, dias depois, à gerência pela situação de incompatibilidade.
Pai de Pedro Nuno
Esteve sob fogo devido ao contrato público por ajuste direto com a Tecmacal, empresa do pai onde tem uma participação de 1%. Foi acusado de violar o regime das incompatibilidades, mas a Presidência do Conselho de Ministros esclareceu que a lei só abrange concursos no âmbito do ministério tutelado pelos governantes.
"Jota" para adjunto
A ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, contratou Tiago Cunha, recém-licenciado em Direito de 21 anos e filiado na JS, para adjunto (3732,72 euros brutos).
Miguel Alves acusado
O secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro demitiu-se após saber-se que é acusado de prevaricação como autarca de Caminha por serviços de assessoria sem contratação pública e pelo caso dos 300 mil euros que pagou por um pavilhão que não existe.
500 mil euros da TAP
Alexandra Reis, secretária de Estado do Tesouro, recebeu uma indemnização da TAP de 500 mil euros por sair antecipadamente. A polémica abriu nova ronda de demissões, incluindo do ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos.
Contas arrestadas
Um dia após tomar posse, Carla Alves, com contas arrestadas na investigação que visa o marido, demitiu-se de secretária de Estado da Agricultura, pressionada por Marcelo.
Contratação polémica
Rita Marques aceitou ser administradora do "The Fladgate Partnership", que tem o WOW, a quem atribuiu o estatuto definitivo de utilidade turística como secretária de Estado. Acusada de ilegalidade, por não cumprir os três anos de "nojo", rejeitou, depois, o convite.
Cafôfo investigado
O secretário de Estado das Comunidades e ex-autarca do Funchal é visado na investigação sobre alegados crimes de corrupção, tráfico de influências e abuso de poder em contratos públicos de autarquias madeirenses com privados.
Buscas em Lisboa
Medina foi novamente arrastado para a praça pública com as buscas à Câmara de Lisboa, de que foi presidente. António Costa saiu em defesa do seu ministro das Finanças, dizendo que não é arguido. A PJ remeteu, depois, para mandatos anteriores, excluindo os dois ex-autarcas.