GNR "não se revê" nas críticas da Proteção Civil à Guarda nos fogos de setembro de 2024
A GNR "não se revê" no relatório da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil segundo o qual a Guarda não incrementou a disponibilidade de recursos durante os incêndios de setembro de 2024, e considera que o fim dos Comandos de Operações Distritais constituiu um constrangimento operacional.
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O comandante operacional da GNR, tenente-general Borlido da Rocha, disse, esta quinta-feira, que a Guarda “não se revê” nas críticas vertidas num relatório da Autoridade Nacional da Proteção Civil (ANEPC), citado pela deputada do PSD, Liliana Reis numa audiência da Comissão Eventual para avaliar o sistema de Proteção Civil e a Prevenção e Combate aos Incêndios de setembro de 2024, que em menos de uma semana consumiram 124 mil hectares de terreno, a terceira maior área ardida na última década. No total, os incêndios que lavraram nas regiões norte e centro, especialmente nos distritos de Aveiro, Coimbra e Viseu, ao longo de cinco dias, entre 15 e 19 de setembro, provocaram pelo menos cinco mortos e 177 feridos, 17 dos quais graves, entre estes 11 bombeiros.
"A GNR e a Força de Bombeiros Sapadores Florestais não incrementaram a sua disponibilidade de recursos, sendo de referir que relativamente ao ICNF, para além de não cumprir as determinações do comando, que solicitava o pré-posicionamento de um grupo de reforço para incêndios rurais, que nunca ocorreu, também não autorizou a relocalização das máquinas de rasto para os locais de maior risco", referiu a parlamentar social-democrata. “No relatório há, de facto, situações em que a Guarda não se revê, principalmente ao nível operacional”, admitiu Borlido da Rocha. “O comando da Guarda entendeu questionar ou solicitar à ANEPC que densificasse mais essas questões”, acrescentou.
Segundo o comandante operacional, durante na fase Delta dos incêndios, em articulação com a ANEPC, a de maior compromisso, a Guarda disponibilizaria 44 militares, mas que entre os dias 15 e 19 de setembro teve 109 elementos em permanência. “De forma bem clara, não nos revemos nisso, porque foi exatamente o contrário”, disse Borlido da Rocha, abordando outra das questões problemáticas dos incêndios de setembro de 2024, que cobriram a região norte de um manto de fumo e cinzas. “Para conseguirmos as evacuações em tempo, projetámos forças da unidade de intervenção, quer no Porto, quer aqui em Lisboa e da Unidade Nacional de Trânsito. Foi constituída uma reserva em permanência de 175 militares que eram entregues ou projetados para as áreas de maior exigência. Foi em função das necessidades de avaliação que fizemos, mas isto foi efetivo. Não se tratou apenas de números nem de planeamentos. Eles estiveram efetivamente no terreno”, acrescentou.
“Constrangimentos” com aumento dos comandos sub-regionais
Borlido da Rocha notou, ainda, "constrangimentos" no terreno com o fim dos 18 Comandos Distritais de Operações e Socorro e a constituição de 24 sub-comandos distritais, em janeiro de de 2023. "Se exponenciarmos o número de postos de comando, maior dificuldade depois a Guarda tem em interagir com todos estes órgãos, quando temos que centralizar a ação de comando e a resposta. Por consequente, também na nossa perspetiva, constitui um constrangimento objetivo, porque não há o emparelhamento que outros tempos", disse.
Borlido da Rocha respondia à deputada do PS, Eurídice Pereira, numa audiência da Comissão Eventual para avaliar o sistema de Proteção Civil e a Prevenção e Combate aos Incêndios de 2024. No total, os incêndios que lavraram nas regiões norte e centro, especialmente nos distritos de Aveiro, Coimbra e Viseu, ao longo de cinco dias, entre 15 e 19 de setembro, provocaram pelo menos cinco mortos e 177 feridos, 17 dos quais graves, entre estes 11 bombeiros. “Interagir com oito postos de comando com oficial de ligação constrange significativamente a capacidade de comando das forças no terreno”, argumentou.
“A estrutura que está a dar a primeira resposta, porque entendemos também que é necessário que quem está no terreno conheça o terreno, não basta projetar militares de Lisboa ou de qualquer outra parte do país para dar a resposta operacional, tem que conhecer o terreno”, sublinhou Borlido da Rocha. “Na região de Aveiro, e pormenorizando, chegamos a ter oito postos de comando, com comandos regionais distintos”, referiu o comandante operacional da GNR.
Borlido da Rocha identificou ainda "um segundo constrangimento" durante os fogos de setembro de 2024. "Infelizmente, os incêndios mais graves decorreram numa zona com uma rede viária extremamente complexa, a região de Aveiro. Temos ali a interseção de várias vias, de grande intensidade de tráfego. A uma hora de ponta foi um processo muito complexo, que correu bem”, disse o comandante operacional da GNR, lembrando que não se corta uma autoestrada em cinco minutos.
“O corte de vias e a evacuação, nestes eventos de maior intensidade, exigem muita celeridade de processos. Mas os nossos militares não nascem do terreno. Temos que gerá-los, temos que saber onde é que os temos, que os projetar e ter uma perceção prévia de qual é a maior probabilidade de evolução de um incêndio”, disse Borlido da Rocha. “Se tivéssemos, talvez, antecipado, se calhar, em meia hora, a capacidade de projeção, as coisas teriam sido feitas com outra dinâmica”, sustentou.
"A evacuação de populações é sempre uma operação complexa. Neste tipo de situações, os meios acabam sempre por se escassos", disse Borlido da Rocha, em resposta uma questão do deputado do Chega Nuno Gabriel, considerando que "a melhoria da capacidade de deteção e predição de incêndios, bem como a sua progressão, seriam ajudas muito significativas", no combate aos fogos e na ajuda às populações.
Incendiários são a segunda causa dos fogos
Sobre as origens dos incêndios, Borlido da Rocha sublinhou que a redução para menos de 30% das causas indeterminadas é "uma vitória moderada, que pode evoluir" e recordou que os incendiários são a segunda maior fonte de incêndios. "No período mais crítico, de 15 a 19 de setembro, na área mais afetada, ente Aveiro e Viseu, foram detidas oito pessoas e identificadas 19", disse, sinalizando que quando há "esta vontade" de atear é difícil parar estas pessoas, o que explica, também, a forte percentagem de ignições noturnas, referida pela deputada do PS, Euridice Pereira.
"Durante a noite não aligeiramos os dispositivos no terreno", garantiu Borlido da Rocha, sublinhando que quem quer atear um incêndio tem a vantagem de ver as patrulhas e de estar escondido à espera da oportunidade. Daí a importância de acrescentar "meios de asa rotativa", nomeadamente helicópteros, ao sistema de vigilância, que além das patrulhas da GNR é complementado pela videovigilância e pelos postos de vigia. "São muito importantes, pois permitem fazer a triangulação das fontes de calor e identificar e disponibilizar meios", acrescentou.
Em relação à prevenção, o comandante operacional da GNR referiu que foram monitorizados 10256 terrenos em 2024. "Quase duplicamos a sinalização além dos terrenos prioritários", disse Borlido da Rocha, salientando que "é muito significativo o cumprimento voluntário dos proprietários" quando alertados para a necessidade de limpeza dos terrenos, embora reconheça no contexto de alterações climáticas é uma operação mais difícil. "Atualmente, é preciso limpar as faixas de combustível duas a três vezes por ano", disse.