Anúncio de 100 milhões para requalificar edifícios da descentralização na Educação e Saúde está a receber críticas, pois a tutela tinha prometido fazer as requalificações.
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Os 100 milhões de euros anunciados pelo Governo, na semana passada, para requalificação de escolas e centros de saúde das câmaras municipais são, afinal, verbas de fundos comunitários que já estavam destinadas aos municípios. O anúncio feito pela ministra da Coesão, Ana Abrunhosa, foi recebido com críticas de alguns autarcas, pois o Governo tinha assumido o compromisso de fazer as obras. Há, contudo, quem elogie a opção.
Em causa estão 335 escolas e centros de saúde em elevado estado de degradação que já foram ou ainda vão ser transferidos para as câmaras municipais no âmbito do processo de descentralização. Para não onerar as autarquias, o Governo assumiu, em 2019, o compromisso de fazer as obras. No entanto, na semana passada, a ministra Ana Abrunhosa anunciou que os avisos de concurso a fundos comunitários se enquadram nos programas operacionais (PO) regionais, cujo dinheiro já tinha como destino as câmaras municipais.
"Estão-nos a dizer assim: "não se aflijam com a descentralização. Falta dinheiro? Confiem que vai haver dinheiro". Sabem onde é que vão tirar? Vão tirar nos nossos fundos de coesão", lamentou o independente Rui Moreira, na passada segunda-feira, no discurso que fez no evento "Conversas do Caldas".
Vários autarcas lamentam que o Governo tenha ido ao "porta-moedas" das câmaras buscar o dinheiro para requalificar os edifícios que se comprometeu a melhorar. Ou, como diz o autarca do Porto, "vão-nos tirar 100 milhões de um bolso e pôr no outro".
Quando o Estado se comprometeu a disponibilizar o dinheiro para fazer obras nestes edifícios, "toda a gente entendeu na altura que não seria subtraído de verbas que se dirigiam aos municípios, mas sim de verbas que eram para a administração central", constata Ricardo Rio (PSD), de Braga.
Difícil execução no PT2020
Ana Abrunhosa anunciou que os avisos de 100 milhões de euros têm "enquadramento ainda no PT 2020, mas com a possibilidade de transitarem para o PT 2030", o próximo quadro comunitário de apoio. Estas opções causam "estranheza" a Ricardo Rio pois "em circunstância alguma as obras estarão concluídas em junho de 2023" para se enquadrarem no PT 2020. Isto porque cada obra obedece a critérios de contratação pública demorados e, para além disso, a crise das matérias-primas e da inflação tem deixado vários concursos públicos desertos. Se, por outro lado, os fundos forem do PT 2030, o Governo está "a consignar verbas logo à cabeça sem que os municípios se tenham pronunciado sobre o processo", aponta Rio.
O JN contactou vários presidentes de câmara que também presidem a comunidades intermunicipais. Emílio Torrão (PS), de Montemor-o-Velho, vê o anúncio "com apreensão", ainda que seja "de elogiar" o avanço das obras. Ribau Esteves (PSD), de Aveiro, considera que é "um ato de boa gestão para garantir que o país não perde dinheiro", pois o PT 2020 está a terminar e "trata-se de tirar fundos de obras que não se vão fazer". Gonçalo Lopes (PS), de Leiria, vê o anúncio "com satisfação", pois "o importante é desbloquear logo verba para estas áreas".
Já Eduardo Vítor Rodrigues (PS), de Vila Nova de Gaia, discorda e entende que compete a Ana Abrunhosa "arranjar dinheiro para áreas que são da responsabilidade do Governo na descentralização". António Pina (PS), de Olhão, acha a medida "excelente", mas ressalva que "é determinante cancelar a portaria de custos padrão" a que chama "camisa de forças". Caso contrário, é um anúncio "votado ao insucesso".
O JN questionou o Governo, mas não obteve resposta até ao fecho da edição desta quinta-feira.