Médicos que fazem noites, fins de semana, feriados e serviços a mais de 60 km das grandes cidades mantêm remuneração que pode ir até 70 euros por hora.
Corpo do artigo
O Ministério da Saúde vai aplicar um corte de 25% ao valor por hora do trabalho suplementar realizado por médicos durante o dia nas urgências das regiões do Porto, Coimbra e Lisboa. As noites, os fins de semana, os feriados e os serviços a mais de 60 quilómetros daquelas cidades mantêm o regime remuneratório em vigor desde julho do ano passado. O novo decreto-lei que define o pagamento das horas extra nas urgências deve ser publicado hoje em Diário da República para entrar em vigor amanhã.
O diploma, a que o JN teve acesso, prolonga a vigência do Decreto-Lei 50-A de 25 de julho de 2022 até ao final do próximo mês de julho - enquanto decorrem as negociações com os sindicatos médicos - mas faz algumas alterações, de forma a envolver a Direção Executiva do SNS e a "resolver alguns constrangimentos" que resultaram da sua aplicação.
Um desses constrangimentos terá sido o aumento da despesa com trabalho suplementar face a 2019, evolução admitida ontem por um vogal da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) no Parlamento (ler na página ao lado).
Para equilibrar a balança, o novo decreto-lei mantém, para determinadas situações, os pagamentos que estavam em vigor, mas reduz noutros casos. Assim, no período noturno, aos sábados, domingos e feriados, nos hospitais a mais de 60 quilómetros de Porto, Coimbra e Lisboa e para os médicos que asseguram urgência metropolitana num hospital diferente, o valor hora máximo continua a ser 50 euros, a partir da 51.ª hora até à 100.ª hora de trabalho suplementar; 60 euros a partir da 101.ª hora até à 150.ª hora; e 70 euros a partir de 151.ª hora.
Noutras situações, como é o caso das urgências diurnas naquelas três metrópoles, será pago 75% desse valor. Ou seja, 37,5 euros no primeiro nível de horas, 45 euros no segundo e 52,5 euros a partir das 151 horas extra. O somatório das horas de trabalho suplementar conta a partir de 1 de fevereiro.
O novo decreto-lei já foi homologado pelo presidente da República. Numa nota no site da presidência, Marcelo chama a atenção para "questões de natureza orçamental" e fala da "expectativa que este diploma abra caminhos, mais do que os feche, num futuro próximo". Recorde-se que há um processo negocial em curso e uma greve de médicos agendada para 8 de março.
"Inaplicável" mantém-se
Quando foi publicado pela ministra Marta Temido, o Decreto-Lei 50-A foi duramente criticado pelos gestores hospitalares, inclusive pelo então presidente do Hospital de S. João, que o apelidou de "inaplicável" num artigo no JN.
Fernando Araújo, agora diretor-executivo do SNS, considerou à data que não era possível pagar tais valores aos médicos sem exceder a despesa com trabalho suplementar e prestações de serviços do último semestre de 2019. Porém, o novo diploma mantém limitações à despesa, ainda que admita exceções em casos de absoluta necessidade e mediante autorização das Finanças e da Saúde.
AVISO
Quem violar as regras poderá ter de pagar por isso
Os gestores que contratarem prestadores de serviços em violação das regras do novo decreto-lei, pagando-lhes por exemplo mais do que o definido no diploma, incorrem em responsabilidade civil, financeira e disciplinar e os contratos serão considerados nulos. É um aviso pouco usual neste tipo de legislação para quem gere os hospitais.
O novo decreto-lei, a que o JN teve acesso, mantém o espírito do anterior no que respeita à valorização dos médicos do quadro de pessoal dos hospitais face aos prestadores de serviços. Nesse sentido, a contratação de "tarefeiros" para a urgência só é admissível quando os médicos da casa não possam assegurar o serviço. Naqueles casos, os contratos ficam sujeitos a um valor hora máximo correspondente ao valor hora médio pago, por hospital, por trabalho suplementar em 2019.
Em situações extremas, como o risco de fecho da urgência externa de um hospital a mais de 60 quilómetros do Porto, Coimbra e Lisboa, o valor hora poderá ser majorado em 35%, após parecer da DE-SNS.
SABER MAIS
FNAM criticou valor
Na semana passada, a Federação Nacional dos Médicos considerou "inaceitável" a proposta da tutela sobre grelhas salariais relativas ao trabalho suplementar em urgência. O sindicato alegava que estavam em causa valores que variavam, dependendo da idade do médico, entre os 20 euros por hora e os 40 euros por hora.
Menos autonomia
O novo decreto-lei permite aos hospitais celebrar contratos sem termo com médicos especialistas para assegurar o funcionamento das urgências, nomeadamente prestadores de serviços, mas a autonomia não é total: só com parecer da DE-SNS.