Primeiro-ministro vai buscar mais gente ao aparelho e assessores para as secretarias de Estado. Politólogo Miguel Rodrigues diz que a estratégia é reforçar lógica do "yes man".
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O Governo está maior, tem um perfil político reforçado, mais partidário e socialista. Nesta remodelação em circuito fechado, António Costa privilegia o seu "inner circle" e vai buscar assessores de gabinetes e um deputado para secretários de Estado. Para o politólogo Miguel Ângelo Rodrigues, que recorda a expressão "yes man", o primeiro-ministro procura fazer-se rodear de pessoas que executem as suas decisões, inclusive na escolha dos dois novos ministros.
Entretanto, se a intenção era agradar a Pedro Nuno Santos, promovendo João Galamba e Marina Gonçalves a ministros das Infraestruturas e da Habitação, a estratégia parece ter falhado, com o potencial candidato à liderança do PS a deixar o Secretariado Nacional do PS. Mas a rutura poderá custar apoios ao próprio ex-ministro, sublinhou ao JN o dirigente socialista Daniel Adrião.
Os novos ministros tomaram ontem posse. Tal como seis secretários de Estado, que reforçam o recurso ao aparelho partidário. São os casos de Hugo Pires, vice da bancada do PS que foi secretário nacional para a organização e assume o Ambiente. E também de Ana Fontoura Gouveia, para a Energia e o Clima, até agora assessora económica do gabinete do primeiro-ministro (ler ao lado).
Ao privilegiar a prata da casa - opção que desiludiu o presidente da República - e num Governo onde só um terço dos ministros são independentes, Costa é acusado de não dar sinal de que os "casos e casinhos" vão acabar. A mudança orgânica, menos de um ano após as eleições, implica o aumento de secretários de Estado (mais dois) e ministros (mais um). Fica por reforçar a articulação, como desejado pelo próprio PS e por Belém. Já a autonomização do Ministério da Habitação tem sido elogiada até por críticos internos.
Após Marcelo avisar que seria "imperdoável" desbaratar o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), Costa foi para o terreno mostrar que "está em movimento".
Escolheu fiéis executantes
Miguel Ângelo Rodrigues, da Universidade do Minho, constata que "António Costa falhou o teste do algodão". "Teve a oportunidade, com a saída de Pedro Nuno Santos, de dar um novo alento ao Governo e assinalar um virar de página", mas "optou por usar a prata da casa e promover dois secretários de Estado a ministros", reagiu.
Sem colocar em causa "a qualidade dos escolhidos", crê que Costa "não quis perder tempo procurando na sociedade civil nomes que pudessem mitigar a sensação de que este Governo está, cada vez mais, fechado sobre si e alicerçado, única e exclusivamente, no PS". A seu ver, o perfil dos novos ministros mostra que "preferiu reforçar a componente político-partidária" e ter "o reconforto de quem lhe possa executar fielmente as suas opções políticas, do que contribuir com uma nova visão ou ousar algum inconformismo".
O politólogo lembra que João Galamba terá de resolver os problemas que herda da TAP e da ferrovia, esperando que "o seu temperamento não o atraiçoe, ou que os negócios com a exploração do lítio não venham causar mais dores de cabeça" ao Governo.
Por sua vez, Daniel Adrião diz que as opções de Costa para ministros das Infraestruturas e Habitação "tiveram como propósito condicionar Pedro Nuno Santos". "Agora percebemos isso", referiu, mas "não resultou", já que o ex-ministro saiu do Secretariado do PS. A seu ver, Pedro Nuno faz uma "fuga em frente", em "rutura com o costismo", ficando "livre para fazer o seu caminho". Porém, "corre o risco de criar uma fratura na sua base de apoio", que não quererá ter os lugares no Governo "em xeque".