Especialistas realçam papel dos pais para aferir grau de responsabilidade e maturidade dos filhos menores.
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Mais jovens de 14 e 15 anos obtiveram habilitação legal para conduzir ciclomotores da categoria AM no primeiro ano da pandemia. Em 2020 (517), houve um aumento de 35% de menores naquela faixa etária com carta de condução pela primeira vez face a 2019 (383). Desde o início de 2021 e até ao final de outubro, 189 jovens podiam conduzir na estrada num veículo de duas rodas, segundo dados do Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT).
António Macedo, diretor da CR&M - Formação Ativa de Condução, reconhece que, nos dois anos da pandemia, 2020 e 2021, "houve um acréscimo" na procura de cursos para a condução de ciclomotores até aos 16 anos. "Tivemos a oportunidade de fazer mais cursos, porque os jovens tiveram muito menos aulas", explica.
A CR&M é uma das dezenas de entidades autorizadas pelo IMT, em todo o país, para dar formação a menores de 16 anos. O plano inclui aulas teóricas e práticas, num total de 15 horas, que a CR&M divide por três dias.
Devido às semanas de contenção para controlar a pandemia, a entidade adiou os dois cursos previstos para as férias de Natal. Dependendo da evolução epidemiológica, talvez só na Páscoa consigam retomar a agenda de formações.
Além da autorização dos pais, os adolescentes têm de preencher certos requisitos para poder conduzir ciclomotores. Entre eles está o comprovativo de aproveitamento escolar. Para António Macedo, a prova de matrícula no presente ano letivo afere algum grau de responsabilidade dos mais novos e permite saber quem cumpre "os seus deveres na escola".
Formação é curta
José Miguel Trigoso, presidente da Prevenção Rodoviária Portuguesa (PRP), uma das entidades também autorizadas a lecionar os cursos para jovens e a fazer exames, refere que existiram situações em que foi adiada a decisão de aprovar um aluno. "Vários não tinham maturidade", afirma.
O especialista defende que o ónus está também nos progenitores que, mais do que um formador, conhecem melhor o sentido de responsabilidade dos filhos. "Os pais têm de ter noção se os filhos têm ou não maturidade para identificar riscos", adianta.
José Miguel Trigoso lamenta que, com mais entidades autorizadas a realizar os cursos, se tenha perdido a prática de realizar consultas de Psicologia aos menores. Atualmente, e tal como nas outras cartas de condução, é exigido um atestado médico a candidatos de 14 e de 15 anos.
O responsável da CR&M, que tem um centro de formação em Palmela e outro em Mortágua, relata que a faixa etária abaixo dos 16 anos é a mais indicada para começar a aprender noções de segurança rodoviária. Também Hélder Pedro, secretário-geral da Associação do Comércio Automóvel de Portugal (ACAP), concorda que "é importante que os jovens percorram os vários escalões para tomarem contacto com as duas rodas", antes de conduzir motociclos com maior cilindrada e potência.
Os dados recolhidos por João Dias, responsável pelo Núcleo de Investigação de Acidentes Rodoviários do Instituto Superior Técnico, revelam que os acidentes em veículos de duas rodas acontecem sobretudo a partir dos 17 anos. "É quando os comportamentos de risco e a adrenalina começam a aumentar". Para o professor universitário, a formação de candidatos de 14 e 15 anos é "curta" em Portugal, mas ainda assim é "muito importante".
Entre 2010 e 2019, de acordo com a Autoridade Nacional da Segurança Rodoviária (ANSR), diz o investigador, dois condutores de ciclomotores com 14 anos morreram nas estradas. "Ambos não tinham carta de condução". Em resposta ao JN, a ANSR precisa que, desde 2011 e até 2020, foram oito os condutores entre os 14 e 15 anos que morreram na estrada, em todo o tipo de veículos.
Perguntas e Respostas
A partir de que idade se pode ter carta de condução em Portugal?
Aos 14 e até aos 16 anos, os jovens podem inscrever-se em entidades formadoras, autorizadas pelo IMT, para obter a carta de condução para ciclomotores de categoria AM. Até 2017, existia apenas uma licença.
Que requisitos deve um menor ter para poder inscrever-se numa formação de ciclomotores?
As entidades formadoras exigem a autorização dos pais, um atestado médico que comprove a aptidão física e mental e um documento que indique o aproveitamento escolar do candidato à condução.
Como é a aprovação para os cursos?
Os jovens de 14 e 15 anos têm uma prova teórica e prática para ter habilitação legal para conduzir ciclomotores. Normalmente, a formação é curta e dura cerca de 15 horas. As entidades geralmente repartem a formação por dias.
Algo muda na carta de condução, quando o jovem completa 16 anos?
Quando o jovem completa 16 anos deixa de ter a restrição 790, ou seja, a sua carta de condução deixa de estar limitada à condução de ciclomotores de duas rodas, com cilindrada não superior a 50 cc, e é alargada a todos os veículos da categoria AM.
Os jovens de 14 e 15 anos podem conduzir em qualquer local?
Não. Por só estarem autorizados a conduzir veículos com velocidade não superior a 45 km/h, os condutores desta faixa etária não podem conduzir em autoestradas nem transportar passageiros.
Se o menor cometer uma infração, quem é o responsável?
O condutor do veículo é, em primeiro lugar, o responsável pelas infrações que comete no exercício da condução. Mas, se for um jovem com menos de 18 anos, a responsabilidade recai também sobre os pais.
Venda de motas sobe durante a pandemia e supera ano de 2019
O mercado de ciclomotores, motociclos, triciclos e quadriciclos cresceu em Portugal durante o ano de 2021 e já ultrapassa 2019 em número de matrículas novas. Os dados da Associação do Comércio Automóvel de Portugal (ACAP) mostram uma variação positiva de 33,4% em dezembro de 2021 face a igual período de 2020. Para o secretário-geral da ACAP, Hélder Pedro, os números comprovam a "maior utilização dos veículos de duas rodas no dia a dia".
Em números absolutos, o total de mercado em motociclos era de 1634 matrículas novas em dezembro de 2019, tendo passado para 2129 em dezembro de 2021. Hélder Pedro garante que, há dois anos, o motociclo era já uma "alternativa" para "as pessoas que queriam deslocar-se com mais liberdade", sobretudo nos centros urbanos. O congestionamento do tráfego e a falta de estacionamento motivaram muitos a deixar o carro e a apostar na mota.
Durante a pandemia, o medo do contágio por SARS-CoV-2 nos transportes públicos, devido aos ajuntamentos, incentivou o interesse no transporte individual. "Naturalmente, a tendência [compra de mota] manteve-se" e até aumentou, estando mesmo a superar 2019, afirma.
Entre os diferentes tipos de veículos, os motociclos (até 125 cc e com mais de 125 cc) são os que reúnem o maior número de matrículas novas (1875), durante o mês de dezembro de 2021. Porém, são os quadriciclos (ATV e minicarros) a registar a variação positiva mais elevada face a dezembro de 2020 (122%).
Escapar a aglomerados
Em meados de 2020, a comissão de motociclos da ACAP lançou a campanha "Vai de Moto", após o levantamento gradual de algumas restrições para controlar a pandemia naquele ano. Para a associação, esta foi uma forma de incentivar a compra dos veículos de duas rodas, "recuperar a liberdade" de deslocação e evitar aglomerados.
"Sabemos que, com a pandemia, as pessoas alteraram os seus hábitos de deslocação", explica Hélder Pedro ao JN. O secretário-geral da ACAP não consegue precisar, no entanto, quais as faixas etárias que mais investiram em motociclos nos últimos dois anos.
Em 2021, foram registadas quase 37 mil matrículas novas de ciclomotores e motociclos, o que representa um aumento de 15% face a igual a 2020 (32 096). Em 2019, foram matriculados 33 283 veículos.