Academias multiplicaram gabinetes de apoio, sem grande adesão. Maioria dos alunos sente ansiedade.
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"É verdade que é preciso um maior apoio psicológico e que as universidades criaram estruturas para ajudar. Mas os estudantes, por uma questão cultural, têm vergonha de recorrer a essa ajuda e são poucos os que pedem ajuda especializada". Quem o admite é Cristina Canavarro, docente na Faculdade de Psicologia da Universidade de Coimbra (UC) e responsável por vários projetos de apoio aos alunos.
"Fala-se muito que é preciso ajudar, mas não há muitos alunos a pedir apoio. Toda a gente está muito cansada e isso nota-se até nos pedidos de ajuda", afirmou Alexandra Queirós, vice-reitora da Universidade de Aveiro. Desde que começou a pandemia, os estudantes universitários queixam-se de solidão, de ter que deixar as casas e os quartos onde viviam para regressar à casa dos pais e da falta de dinheiro.
De acordo com a Associação Académica da UC, mais de 90% dos estudantes revelaram dificuldades, a vários níveis devido ao impacto da pandemia. Na Universidade Nova de Lisboa, a Associação de Estudantes da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas inquiriu 483 estudantes e 90% afirmou que a pandemia afetou a sua saúde mental, aumentando a ansiedade e a falta de motivação.
Na Universidade do Minho, em 12 meses, a Linha de Apoio Psicológico SOS Covid-19 atendeu 105 pessoas. No Porto, a universidade acabou em dezembro com a linha telefónica de apoio aos estudantes e já abriu oito gabinetes, em vários polos, para ajudar os alunos.
Em Aveiro, o apoio aos alunos foi mudando ao longo da pandemia, mantendo-se sempre uma linha telefónica para aconselhamento, mas, segundo a vice-reitora, "com pouca procura". "Não temos tradição de pedir ajuda, é visto como um sinal de fraqueza e de vergonha", refere, ainda, a psicóloga Cristina Canavarro.
"Neste cenário pandémico, as respostas de instabilidade emocional e comportamental são normais, mas podem ser difíceis de aceitar e de regular", admitiu Eugénia Ribeiro, professora da Escola de Psicologia da Universidade do Minho.
Solidão ampliada
Na Universidade do Porto, à psicóloga Sílvia João chegam os mesmos medos. "O confinamento amplia o sentimento de solidão, de ansiedade de depressão. No fundo, cada jovem tem os mesmos problemas que tinha mas, com a pandemia, ganham outra dimensão".
Manuel Heitor, ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, recomendou que as instituições de Ensino Superior "desenvolvam programas próprios de mitigação e compensação dos efeitos da covid-19 nos estudantes". E pediu "particular atenção aos estudantes, devendo ser garantido, sempre que necessário, o apoio psicológico e o acompanhamento do estado da saúde mental da comunidade académica, em estreita articulação com as associações e federações de estudantes".
"Os problemas de saúde mental não chegaram com a pandemia. Já cá estavam. Com o confinamento, a saúde mental entrou-nos em casa e precisamos de estar todos muito mais atentos", finalizou Miguel Xavier, diretor do Programa Nacional de Saúde Mental. v
Constança Martins
Aluna da Faculdade de Belas-Artes, no Porto
"Não há uma preocupação com a saúde mental na nossa instituição. Na Universidade do Porto, existe um psicólogo para milhares de estudantes"
Gonçalo Silva
Aluno da Universidade do Minho
"O número de alunos a precisar de apoio clínico médico subiu no último ano"
Nuno Marques
Vice-presidente da AE da ESAD Caldas da Rainha
"Existem problemas associados à saúde mental dos estudantes. Mas são escondidos. A vergonha é o nosso maior entrave para chegarmos até esses alunos"