Hospital indemniza pais devido a parto que causou deficiência permanente em bebé
Bebé nascido no Hospital de S. Sebastião, na Feira, sofreu paralisia cerebral e ficou com incapacidade de 80%. Acordo durante o julgamento.
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O Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga (CHEDV), duas médicas obstetras e uma seguradora aceitaram pagar uma indemnização de 150 mil euros a uma família de Santa Maria da Feira, como compensação por má prática na assistência prestada durante um parto da qual resultou paralisia cerebral para a recém-nascida.
O caso aconteceu em 2014. Maria do Céu, na ocasião com 31 anos, deu entrada no Hospital de S. Sebastião, grávida da primeira filha. Ao fim de quase dois dias, o parto acabaria por ter início, numa primeira fase com recurso a fórceps (por quatro vezes), sem resultados, pelo que depois as médicas decidiram utilizar ventosas (por três vezes) para retirar a criança. Novamente sem sucesso.
Só mais tarde é que tomaram a decisão da cesariana, qualificada como emergente. Maria do Céu foi levada de imediato para o bloco operatório. A bebé nasceu, mas foi necessário proceder a manobras de reanimação, tendo sido transportada para a unidade de cuidados intensivos neonatais, onde foi entubada. Com a situação a assumir maior gravidade, decidiram transferi-la para o Hospital de S. João, no Porto.
Passado todo o período de recuperação e convalescença, a criança não fala, nem reage a estímulos, ficando obrigada a usar uma cadeira de rodas. Uma junta médica atribuiu-lhe uma incapacidade de 80%. Desde logo, a família considerou que se tratou de problemas relacionados com o atraso no parto e de possíveis más práticas médicas. Contudo, nenhum dos responsáveis médicos e hospitalares as assumiu, tendo a família decidido levar o caso à justiça.
Medicina Legal decisiva
O Conselho de Disciplina da Secção Regional do Norte da Ordem dos Médicos, arquivou o processo, por considerar que não havia responsabilidade médica. E uma participação à Inspeção-geral das Atividades em Saúde não teve resultado diferente. Inconformados com estas decisões, os advogados da família não desistiram e levaram, desta vez, o caso ao Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses. Esta instituição acabaria por confirmar que na origem dos problemas da recém-nascida estariam decisões erradas tomadas aquando do parto. Concluiu que "não estavam reunidas condições da aplicabilidade de fórceps quer da ventosa" e que deveria ter sido, desde logo, tomada a decisão de fazer a cesariana.
"É possível estabelecer um nexo de causalidade entre a utilização dos instrumentos [fórceps e ventosas] e as lesões traumáticas apresentadas pela recém-nascida e o seu estado clínico na data da alta", lê-se no documento. Recentemente, com o processo judicial a decorrer, o (CHEDV), as médicas e a seguradora aceitaram pagar cerca de 150 mil euros e o Tribunal Administrativo de Aveiro encerrou o caso.
"A Justiça devia funcionar sempre desta forma. Mas nestes casos nem sempre isso acontece; nem sempre é atribuída a compensação devida e justa pelo sofrimento causado"
Ao JN, Márcio Correia, advogado da família, diz que o acordo visou que "os pais fossem compensados de forma justa e para apoiar a menina nas várias terapias que irá necessitar toda a sua vida". "Nunca desistimos. Admitimos que as médicas nada fizeram de intencional, não tiveram uma conduta dolosa. Foi um parto difícil, de opções clínicas dúbias", ressalvou.
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Centro Hospitalar não comenta
O Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga engloba os hospitais de S. Sebastião, em Santa Maria da Feira, de Oliveira de Azeméis e de São João da Madeira. Contactada pelo JN, a Administração não quis comentar o caso.
Beja
Ginecologista julgado por morte de bebé
Um médico ginecologista/obstetra do Hospital José Joaquim Fernandes, em Beja, começa hoje a ser julgado por um alegado crime de homicídio por negligência, também devido à tardia realização de parto por cesariana, em 10 de abril de 2015. Segundo a acusação, a que o JN teve acesso, a atuação "descuidada, desatenta e inadequada" do médico arguido "aumentou o risco" de morte do feto. A mulher, grávida de 40 semanas e quatro dias, teve uma rutura prematura de membranas e entrou no Serviço de Urgência ao final da tarde de 9 de abril. O MP sustenta que quando o médico esteve junto da parturiente, pelas 4.30 horas da madrugada, deveria ter determinado "a imediata intervenção cirúrgica cesariana". Mas, depois de observada pelo arguido, a mulher foi encaminhada para uma cama da sala de partos e só foi sujeita à cesariana pelas 7.05 horas, altura em que o bebé lhe foi retirado já sem vida do ventre. Um juiz de Beja pronunciou-o para julgamento. Uma médica, de 65 anos, que também tinha sido acusada do mesmo crime, não foi pronunciada para julgamento, "por não existirem indícios suficientes da prática do ilícito em causa", concluiu o juiz. O arguido, de 78 anos, já está aposentado.