Conferência Episcopal não afasta suspeitos se não houver provas. PS disponível para alterar idade máxima para apresentar queixa.
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O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), José Ornelas, disse, na terça-feira, em audição parlamentar, que a Igreja só pagará indemnizações às vítimas de abusos sexuais se a lei o obrigar e que não vai afastar ninguém suspeito deste crime se a denúncia "não tiver algo plausível". Numa audição, a pedido do PS, PSD e Chega, o PS mostrou-se "disponível" a alterar a idade da vítima até à qual possa apresentar queixa, dos atuais 23 anos para os 30 anos.
Ao contrário do que aconteceu noutros países, como Estados Unidos ou França, a Igreja Católica portuguesa continua a vacilar sobre o pagamento de indemnizações. Em março passado, José Ornelas chegou a admitir o pagamento de compensações monetárias a quem sofreu abusos sexuais dentro da instituição católica, mas, hoje, ouvido no Parlamento, voltou atrás. "Indemnizar é um termo jurídico e sendo um termo jurídico, na medida em que houver um processo de indemnização, não estamos acima da lei e vamos cumprir o que a lei determinar", afirmou.
Em resposta aos deputados, que insistiram em saber o que vai acontecer às vítimas e aos suspeitos de abusos sexuais após o trabalho da Comissão Independente, o presidente da CEP referiu que não prevê afastar ninguém das suas funções se a denúncia "não tiver algo plausível".
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"O afastamento pode ser tido em conta. Uma denúncia, mesmo anónima, não me entra por um ouvido e sai por outro. Vou levar a sério a questão, mas também se não tiver algo plausível, isto é, que é possível que isso tenha acontecido, não vou afastar ninguém", assegurou.
José Ornelas apelou ainda a que as denúncias não sejam anónimas. "Aquilo que era até aqui uma prerrogativa da Comissão Independente, que era o anonimato das pessoas, agora não pode ser. Se queremos ajudar a reparar o que é possível é com pessoas reais", pediu, acrescentando que a denúncia anónima dificulta a investigação. O cardeal patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, ouvido antes por deputados de vários partidos políticos, reconheceu dificuldades na condução destes processos dentro da Igreja.
"Não podemos resolver"
"Há muitas coisas que não podemos resolver. Temos de perguntar ao dicastério romano, que tutela estas questões, o que devemos fazer. Há procedimentos canónicos em curso, mas, muitas vezes, mesmo muitas vezes, temos de apelar ao dicastério para poder levar isto por diante. Não é ao arbítrio ou sensibilidade de cada um de nós", frisou, mostrando vontade de que as denúncias sejam feitas em primeiro lugar às autoridades competentes. "No que diz respeito ao civil, encaminhamos para lá os casos e até temos pena que muitos não comecem por aí."
Nas várias audições que decorreram ontem, nas quais também foram ouvidos os membros da extinta Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja, o PS mostrou-se "disponível" para alterar a idade limite da vítima para apresentar queixa, dos atuais 23 para 30 anos, e o Iniciativa Liberal propôs os 40 anos.
A realização de um inquérito a vítimas de abusos sexuais, a criação de um provedor da criança, melhorar a educação sexual nas escolas e a realização de uma discussão alargada sobre o tema no Parlamento foram algumas das sugestões ainda deixadas por membros da Comissão Independente e deputados.
"É preciso condenar depressa"
Os membros da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais defenderam, na terça-feira, no Parlamento uma maior prevenção dos abusos sexuais e a priorização destes casos. "Preferiria que fosse atribuído a este tipo de crimes um caráter urgente na investigação e que o sistema de justiça passe a dar prioridade a estes processos", sugeriu Laborinho Lúcio, acrescentando que "a grande prevenção não está na pena, mas na rapidez da resposta". "É preciso condenar depressa quem prevaricou e não condenar muito mais tarde em pena superior. Não defendemos a alteração de penas (para mais anos)." O psiquiatra Daniel Sampaio lembrou que "os padres e freiras têm perturbações de personalidade e temos de pensar no acompanhamento dos agressores". O presidente da Conferência Episcopal disse que "uma das linhas orientadoras do recentemente criado grupo Vita é o apoio psicológico aos prevaricadores". "Não basta que a lei seja punitiva. A recuperação não é fácil, mas é possível se a pessoa se deixar ajudar."