Especialistas alertam para efeitos nos comportamentos e pedem às autoridades de saúde mensagens claras centradas no essencial.
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As imagens de centenas de pessoas juntas, sem o devido distanciamento, no Grande Prémio de Formula 1, no fim de semana passado no Algarve, ou quinta-feira na Nazaré para assistir às ondas gigantes causam dano na opinião pública e podem levar a uma desvalorização da situação pandémica pela incoerência de mensagens. Especialistas ouvidos pelo JN alertam para a necessidade de se "localizar a responsabilidade nestes eventos" e de melhorar a comunicação à população.
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"É evidente que estas imagens causam dano na opinião pública. Criam a impressão de incoerência face à situação atual e isso não é bom porque é vantajoso para todos que haja confiança nos mecanismos que gerem a situação", refere Constantino Sakellarides, antigo diretor-geral da Saúde.
Realça ainda que é importante as pessoas perceberem onde está a responsabilidade, sendo que há três níveis de decisão: o Governo que legisla o que se pode ou não fazer (como eventos); a saúde pública que adapta estas decisões a situações concretas; e a organização do evento, cujo plano de contingência tem de dizer o que fazer quando algo corre mal. E aqui não tem dúvidas: "Em geral, somos maus nos planos de contingência".
Quando se trata de um evento não organizado, como o da Nazaré (ler caixa), Sakellarides admite que a Autarquia podia não prever o ajuntamento, mas "pode aprender e evitar que aconteça de novo".
Felisbela Lopes, professora de Ciências da Comunicação na Universidade do Minho, alerta também para os "efeitos negativos" das imagens da F1 e da Nazaré. Se no primeiro evento não devia ter sido dada autorização para público, no segundo - mais espontâneo mas divulgado nas redes sociais, as autoridades policiais deviam ter atuado de imediato, defende.
Calcanhar de aquiles
Mais planeada e melhorada tem de ser a comunicação para responsabilizar cada um pelos seus comportamentos. Para Bernardo Gomes, professor no Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, "a comunicação está a ser o nosso calcanhar de Aquiles". O epidemiologista frisa que "há a obrigação moral de extrair o máximo valor da responsabilidade individual, de cada um de nós, e para isso é preciso dar informação clara, transparente" e simples.
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Felisbela Lopes entende que não é altura para reduzir o número de conferências de Imprensa porque a situação epidemiológica é grave, mas pede informação clara, sucinta e rigorosa. Conferências longas não funcionam, avisa, e é preciso concentrar a mensagem no essencial e não nas exceções, como aconteceu no anúncio das restrições à liberdade de circulação entre concelhos, que entraram em vigor esta sexta-feira.
Uma mensagem menos monótona, com mais elementos não verbais para manter o interesse das pessoas e a separação da comunicação técnico-científica da política são recomendações enviadas há dias pelo Conselho Nacional de Saúde Pública à tutela.