Projeto da Universidade do Porto acompanha famílias e conclui que falta apoio logo após seis meses.
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Um projeto coordenado por duas investigadoras da Universidade do Porto pretende acompanhar e apoiar 270 famílias adotivas durante, pelo menos, três anos. O projeto chama-se AdoPt e foi iniciado por Joana Soares e Maria Barbosa Ducharne, que trabalham na área da adoção e do acolhimento há alguns anos.
O AdoPt surgiu para dar resposta à grande carência de acompanhamento e de apoio às famílias adotivas. As dificuldades surgem, em grande maioria, seis meses após a adoção, momento que a investigadora Joana Soares chama de "pós-adoção". Após esse período, não há qualquer apoio por parte dos serviços de acompanhamento, assegura.
Joana Soares diz ao JN que não há serviços com pessoas especializadas na área da adoção, como psicólogos, psiquiatras ou mesmo médicos. Segundo a investigadora, haveria garantia de melhores relações nas famílias adotivas "se tivéssemos uma rede efetiva de pós-adoção". "Se os fatores de risco pudessem ser compensados pela existência de apoios necessários, atenuávamos os fatores para manter as famílias unidas", diz.
vêm com traumas
A iniciativa assenta numa plataforma online e pode ter diferentes níveis de apoio. Numa primeira fase, as famílias registam-se e respondem a um questionário para serem avaliadas. Segundo a investigadora, são publicados conteúdos, como vídeos de testemunhas ou estratégias com o objetivo de "formar e informar os pais adotivos".
As famílias podem contactar diretamente a universidade e esta fornece apoio com a ajuda de investigadores e especialistas. Caso as necessidades estejam para além do que o projeto pode fazer, Joana Soares diz que "são reencaminhadas para melhores apoios, de acordo com a região".
Grande parte das crianças acompanhadas passou por experiências traumáticas com a família biológica e isso tem grande influência nas relações com a família adotiva. A investigação já identificou que, nos casos de negligência parental, o impacto no desenvolvimento da criança "é mais intenso e gravoso" porque as crianças permaneceram naquele contexto durante mais tempo.
"Há crianças que estão abandonadas por causa da situação dos pais e vai-se acreditando que podem recuperar e que um dia vão ter resposta", revela a investigadora. Pelo contrário, em situações de abuso, a criança é retirada de imediato à família biológica. Quase todos os jovens em processo de adoção (97%) em Portugal estão em instituições que, segundo as investigadoras, não oferecem um acompanhamento e desenvolvimento adequados. Crescem num ambiente "com vários cuidadores, que trabalham por turnos, com muitas crianças para cuidar ao mesmo tempo e isto tem impacto no desenvolvimento".
Menos bebés
A adoção tem vindo a sofrer grandes alterações nos últimos anos em Portugal. Segundo as investigadoras, a legalização do aborto fez com que houvesse menos abandono. Antes, havia mais bebés para adotar, o que significa que não tinham experiências negativas e a construção de relações com a família adotiva tornava-se mais simples.
Mais inseguras
Atualmente, as adoções passam por crianças e jovens e é mais desafiante ultrapassar as experiências negativas. A idade de adoção é cada vez maior e os jovens têm mais vivências acumuladas, quer pela experiência na família biológica quer pela instituição. Quando chegam à adoção, por vezes são inseguras e não confiam nos adultos, o que obriga a nova família a ter capacidade de desconstrução e criar relações de confiança.