As duas mais recentes estavam a pintar um prédio em Almada quando o andaime se desprendeu de uma altura de cinco andares.
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Dois trabalhadores da construção civil morreram ontem, em Almada, quando o andaime suspenso (bailéu) onde trabalhavam na fachada de um prédio se desprendeu de uma altura de cinco andares e caiu. As vítimas, pintores da empresa que tinha começado a laborar esta semana no local, ficaram encarceradas na plataforma de alumínio e tiveram morte imediata. Com estes dois portugueses, de idades entre os 40 e 50 anos, são já 11 os trabalhadores que este ano morreram a trabalhar nas obras, revelou ontem ao JN o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção, Albano Ribeiro.
Os bombeiros de Cacilhas receberam o alerta às 14.40 horas para a queda do bailéu, um elevador suspenso apoiado na fachada do número 49 da Rua D. Francisco de Almeida, no Feijó, perto da academia de judo que Telma Monteiro frequentou em criança. No local, os bombeiros encontraram as vítimas já sem vida. Só após três horas de trabalho de desencarceramento e recolha de provas para a investigação do caso é que os corpos foram retirados e transportados para a morgue do Hospital Garcia de Orta.
Vizinho antecipou tragédia
Jorge Paulo, segundo comandante da corporação almadense, ressalvou que, apesar de a investigação caber às autoridades, o bailéu "não podia ser montado numa estrutura como aquela". Trata-se de um pequeno muro no topo do prédio composto por tijolos, que serve para escoamento da água da chuva.
Henrique Silva, morador no local e trabalhador da construção civil, conhece bem o prédio, onde já realizou obras, e ao JN disse ter antecipado uma tragédia quando de manhã passou no local. "O peso do bailéu, que é de mais de duas toneladas, e o movimento dos dois pintores fizeram com que o murete de tijolo onde este estava fixo desmoronasse", explicou o homem, de 55 anos. "Assim que passei aqui de manhã, pensei logo que isto não ia correr bem, porque este tipo de equipamentos só pode ser montado em estruturas de betão armado, que conseguem suportar o peso, não em pequenos muros de tijolo".
Durante a tarde, moradores e curiosos juntaram-se perto do local do acidente. Os familiares das vítimas foram apoiadas por uma equipa de psicólogos do INEM.
O trabalho de pintura no prédio começou na segunda-feira e o elevador foi instalado durante a tarde. Os pintores iam começar ontem a pintura da fachada, quando se deu a queda. O JN tentou telefonicamente obter declarações dos responsáveis da empresa encarregada da obra, a Manifesto Criativo, que tem sede em Almada, mas não conseguiu.
INSEGURANÇA
Sindicato culpa "patrões que não são empresários"
Este ano, com os dois de ontem, já morreram, "pelo menos", 11 trabalhadores na construção civil em Portugal, adiantou ao JN o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção. O "pelo menos", explica Albano Ribeiro, deve-se ao facto de "nem todas as vítimas da fileira da construção serem contabilizadas, porque a Autoridade para as Condições do Trabalho não tem meios para estar em todos os locais e também porque nem sempre são chamados", assegura o responsável do sindicato. Albano Ribeiro lamenta as duas vítimas mais recentes, desconhece as circunstâncias do acidente em Almada, mas não tem dúvidas de que "a maioria das mortes na construção civil se deve às insuficientes medidas de segurança implementadas por patrões que não são empresários". O sindicalista faz questão de separar as águas. "Os patrões só querem ganhar dinheiro e não se preocupam com a segurança dos funcionários, os empresários têm esse cuidado e é por causa destes que os números das vítimas mortais têm vindo a diminuir nos últimos anos em Portugal". Albano Ribeiro lembra que por altura da "Expo 98" morriam por ano cerca de 200 trabalhadores da construção, enquanto no ano passado foram menos de 30.
OCORRÊNCIA
Socorro
Estiveram empenhados nesta ocorrência um total de 35 operacionais e 15 viaturas dos bombeiros de Cacilhas, PSP, viatura médica de emergência e reanimação do Hospital Garcia de Orta, PSP e Serviço Municipal de Proteção Civil de Almada.
Investigação
A Polícia Judiciária de Setúbal e a Autoridade para as Condições do Trabalho vão investigar o caso. Em causa pode estar um crime de violação de regras de construção agravado pelas duas mortes, apurou o JN junto de fonte policial.