Luís Montenegro: "O PSD não pode pactuar com os complexos ideológicos do Governo do PS"
O candidato à liderança do PSD, Luís Montenegro, responsabiliza a estratégia de Rui Rio de aproximação do partido a um Governo socialista, refém de "complexos ideológicos" por ter PCP e BE como parceiros, pelo desaire eleitoral nas legislativas. E garante que, consigo, o partido terá maioria absoluta já nas eleições de 2023.
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Nesta entrevista ao "Jornal de Notícias", Luís Montenegro acusa o atual líder do PSD de apenas ter reunido uma vez com o grupo parlamentar do partido. E garante que Rui Rio "hostilizou" os deputados.
Ao apresentar a candidatura, prometeu ganhar tudo: duas legislativas, autárquicas... Como vai conseguir isso, se parte com um resultado de 27,9%?
Quem entra num processo eleitoral com a sensação de que vai perder já está derrotado, à partida. O PSD foi o partido que mais maiorias conseguiu em Portugal. Só pode ter um objetivo que é ganhar. E ganhar, conseguindo ter uma maioria absoluta que nos permita fazer as reformas estruturais que o país necessita.
E consegue uma maioria absoluta já em 2023?
Lutaremos por isso. Teremos, no próximo ano, eleições regionais nos Açores. Lá estaremos com o novo presidente do PSD/Açores, José Manuel Bolieiro. Depois, vamos dar uma especial atenção às autárquicas em 2021, eu próprio irei liderar esse processo, coordenando toda a escolha dos nossos candidatos, começando pelas câmaras de Lisboa e Porto e que são objetivos que creio puder alcançar. Não há razão alguma para não entrarmos nesse processo com candidatos fortes, numa perspetiva também de uma candidatura vencedora em 2023.
Foi isso que faltou ao partido nos últimos dois anos? Faltou ambição?
Faltou ambição, essa capacidade vencedora. Alertei em algumas alturas, de que se havia instalado no PSD um certo derrotismo que era necessário ultrapassar.
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Uma das criticas é que houve uma excessiva aproximação ao PS....
Sem sombra de dúvidas. É a grande diferença entre a minha candidatura e a do dr. Rui Rio. Não tenho nada de pessoal contra Rui Rio, mesmo quando ele me ataca pessoalmente. Preocupo-me com a política. E politicamente falando, o PSD, nos últimos dois anos, criou uma perceção nos eleitores de grande proximidade ao PS e, mais do que isso, de subalternização. Parece que o PSD está sempre dependente do que o PS vai querer ou não querer fazer connosco para definir aquilo que é relevante. Ora, o PS não quer nada com o PSD. O PS só se vira para o PSD quando não tem apoio à Esquerda e usa o PSD como uma forma de pressão. O PSD não pode ir nesse engodo. O PSD pensa de forma diferente a organização do Estado, da economia e a prestação dos serviços públicos. É do interesse nacional que haja uma alternativa política muito vincada, muito diferenciadora, muito firme, bem construída, alicerçada na social-democracia para fazer o contraponto a este socialismo estatizante de António Costa com os seus dois acólitos, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa.
É por isso que não quer acordos com o PS?
Tenho, ao longo da minha vida política, vários exemplos de acordos com o PS. Fui um dos deputados que interveio no pacto da justiça. Estive no acordo do IRC. Propus ao PS que fosse criada uma comissão na Assembleia da República para a reforma da Segurança Social e do Estado... Sempre estive disponível para fazer acordos de regime. Só que esse tempo acabou, porque o PS não quer. Não vale a pena estar a esbarrar contra uma parede. O PS não quer!
Se o PSD é um contraponto ao socialismo... faria um orçamento completamente diferente deste...
Este é um orçamento de empatas. Estamos a perder tempo. O país precisa de um governo reformista, com coragem de mudar as coisas e com a possibilidade de o fazer num tempo de normalidade. O PSD não é um partido só para arrumar a casa quando o PS desgoverna o país. Devíamos estar a aproveitar este período para sermos mais arrojados.
Qual seria a primeira reforma que avançaria?
De imediato, tinha uma baixa de impostos. É preciso aliviar a carga fiscal sobre as famílias e sobre as empresas. Falo numa redução gradual do IRS e do IRC, que seria de dois pontos percentuais por ano até atingirmos uma taxa que fosse competitiva e poderia andar aí nos 16 ou 17%. Defendo também uma simplificação fiscal, nomeadamente através da fusão da taxa intermédia e da taxa máxima de IVA, que permita que a taxa máxima possa baixar uns três pontos percentuais.
Ficava-se pela fiscalidade?
Acho que devemos colocar na agenda, como prioridade, as repercussões do mundo digital em domínios como o trabalho, discutir a subsistência da comunicação social, a temática do comércio eletrónico, a questão da habitação, sobretudo nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, para não falar no drama que é o alojamento universitário. E, depois, a magna questão do Estado social. Temos vários problemas nos transportes, na Educação, no caos em que se encontra a Saúde, quando há um relatório do Tribunal de Contas que faz uma apreciação positiva da parceria público-privada do Hospital de Vila Franca de Xira...
No programa de Governo fixa-se, contudo, que não existirão mais PPP...
O PS, fruto deste casamento com o PCP e com o BE, não confia no sistema privado e no sistema social como complementares do sistema publico de saúde. O PSD não pode pactuar com os complexos ideológicos que hoje estão na base do Governo socialista, comunista e bloquista. Temos em Portugal uma excessiva estatização. Não podemos ser cúmplices dessa estatização. Temos que apresentar uma alternativa, porque essa alternativa favorece as pessoas. Muito mais importante do que o prestador do serviço é o próprio serviço que é prestado.
"Rui Rio não teve uma bancada hostil. Foi hostil à bancada"
Critica os "casamentos" à Esquerda, mas quer "namorar" à Direita...
Teremos diálogo político com todas as forças políticas, naturalmente mais intenso com aquelas que têm posições políticas próximas das nossas. Não nos podemos esquecer que temos tido, quando vamos para a governação, um parceiro privilegiado que é o CDS. Sinceramente, desejo que o CDS ultrapasse esta situação de fragilidade que resultou das legislativas. Não tenho qualquer problema com o crescimento do CDS. O país também precisa de um CDS forte e também não tenho nenhum problema com os outros partidos que nasceram da saída de militantes do PSD. Só posso é lamentar que isso tenha acontecido. Nos últimos dois anos, três militantes do PSD, incluindo um ex-líder, saíram do partido para criar forças políticas alternativas.
A sua liderança recuperaria Santana Lopes?
Não vou particularizar. Falei de três porque foram três ex-militantes que saíram e formaram três novas forças políticas. Não tenho dúvidas de que teria sido evitável se houvesse uma liderança agregadora, tolerante e dialogante. Aliás, até de certa forma, choca-me que se tenha assistido a esse movimento de uma forma impávida e serena como se isso não fosse importante.
Como pensa governar com uma bancada "afeta" a Rui Rio? Sente que lhe foi dada uma espécie de bofetada de luva branca? Esta liderança sempre se queixou de ter tido uma bancada hostil...
O dr. Rui Rio não teve uma bancada hostil. O dr. Rui Rio foi hostil à sua bancada. Esta é que é a verdade! O dr. Rui Rio hostilizou voluntariamente a sua bancada. Aquela era a bancada do PSD, era a bancada do dr. Rui Rio. Não era a bancada do dr. Passos Coelho, 95% daqueles deputados foram escolhidos pelas estruturas locais. Da mesma maneira, esta bancada não é do dr. Rui Rio. É do PSD! Bem sei que o dr. Rui Rio interveio mais, escolheu mais, intrometeu-se mais na elaboração das listas do que o dr. Passos Coelho, mas isso não é um problema. Esta bancada é a bancada do PSD e é a minha bancada. É a bancada com quem eu vou trabalhar, com quem vou reunir, pelo menos, uma vez por mês.
É por aí que tentará marcar a diferença?
O dr. Rui Rio falou com a sua bancada uma vez em mais de um ano e meio. Eu vou estar em contacto diário com a bancada. Não vou hostilizar a bancada e tenho a certeza que a bancada do PSD também não vai hostilizar a Direção do partido.
Em que alturas a liderança hostilizou a bancada?
Em muitos momentos em que desautorizou o líder parlamentar e o vice-presidente do grupo parlamentar, em que se referiu publicamente às funções de deputado como se fossem funções menores e agora até é líder da bancada. Creio que se arrependeu, portanto. Isso aconteceu várias vezes. Aconteceu com declarações públicas. E isso não é gerador nem de um bom ambiente interno nem de uma boa relação de confiança com os eleitores. Posso garantir uma coisa ao meu partido: nunca vou dizer às pessoas que discordam de mim para saírem do PSD. Quando houver discordâncias sobre as minhas opiniões, tentarei dialogar.
No início da entrevista, falou de ataques pessoais de Rui Rio. Referia-se à questão da maçonaria?
Já fez essas acusações em janeiro. Fez agora. Não devemos pessoalizar a campanha. Isso não favorece nem o PSD nem nenhum de nós. Quero dar esse assunto por encerrado. Não faço ataques de caráter nem ataques pessoais a nenhum companheiro do meu partido. Faço discussão política.
Como vê a escolha de Rui da Silva Leal, marido de Mónica Quintela (porta-voz do partido para a Justiça), para o Conselho Superior do Ministério Público? Rui Rio considerou de "má-fé" comparar isto ao familygate. Concorda?
Dir-lhe-ei três coisas. A primeira é que estas eleições deviam ter sido adiadas para depois do dia 11 de janeiro. A segunda é que não quero fazer juízos de valor sobre ninguém. As pessoas merecem respeito. A última consideração é que o PSD tem que ter muito cuidado nas escolhas que faz. O PSD foi contra, e muito bem, o excesso de amiguismo e de relações familiares no Governo do PS. Agora, é bom, do ponto de vista da comunicação política, que não se tomem decisões que, de alguma maneira, sirvam aos olhos das pessoas para branquear essas posições ,formuladas no passado.
Perguntas e respostas rápidas
A JSD vai fazer um referendo interno sobre a legalização do consumo de drogas leves? Aceitaria?
Sou contra a legalização do uso de drogas para fins que não sejam os terapêuticos.
E a eutanásia?
Sou favorável à realização de um referendo nacional. Entendo que Portugal precisa de fazer um debate profundo sobre essa matéria. Devo confessar que tenho uma inclinação mais contrária, não escondo. Mas tenho muitas dúvidas. Acho que só um debate muito aprofundado pode ajudar o poder legislativo a tomar posição. Não vejo nenhuma outra possibilidade que não seja através de um referendo.
O Orçamento do Estado abre a porta à proibição das touradas, ao aumentar o IVA. É contra as touradas ou a favor?
Sou favorável à realização das touradas como elemento de tradição e identidade do país. Respeito aqueles que tenham opinião diferente. Há condições para termos regras de funcionamento e de organização das touradas que conciliem a opinião daqueles que são a favor com aqueles com preocupações de proteção animal.
Foi anunciada uma petição para a legalização da prostituição. Algo que chegou a ser falado na JSD. Como vê a medida?
Não concordo. Mas aguardarei que esse tema seja colocado. Não estou a ver vantagem nisso, com franqueza. Mas também não digo que tenho uma posição fechada, que vá agora acorrentar o meu partido a essa posição. Nunca o discutimos no PSD.