SNS pagou o medicamento contra a atrofia muscular espinhal, mas não dá todas as terapias necessárias. Feita queixa à Provedoria da Justiça.
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As mães de dez crianças que sofrem de atrofia muscular espinhal (AME) e foram medicadas com Zolgensma, um medicamente que custa cerca de dois milhões de euros a unidade, pagos pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS), apresentaram uma queixa à Provedora de Justiça, acusando o Estado de não estar a garantir às crianças, com idades entre um e quatro anos, as terapias necessárias ao seu desenvolvimento.
"Estamos numa situação humilhante, que nunca imaginámos possível, em que as nossas crianças foram deixadas totalmente ao abandono pelo Estado", argumentam, certas de que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) não está a responder às necessidades das crianças, "sendo incompreensível que, tendo investido um valor tão elevado num medicamento, as tenha deixado ao esquecimento, sem qualquer apoio adequado", pode ler-se no documento, enviado à provedora Maria Lúcia Amaral e que está agora a ser avaliado.
Pagam do seu bolso
Em causa está a realização e o pagamento de atos como terapia da fala, fisioterapia motora, fisioterapia respiratória, ocupacional, hidroterapia e hipoterapia. De acordo com os pais, o SNS apenas garante terapia da fala e fisioterapia, mas realizada por terapeutas que não são especializados em crianças.
"E, mesmo assim, garante apenas uma sessão por semana, quando as nossas crianças têm que fazer todos os dias", afirmou uma mãe. "Dadas a importância determinante de terapias, fomos obrigadas a contratar terapeutas particulares com vasta experiência neste tipo de patologias", relataram as mães no mesmo documento (uma das subscritoras é Daniela Martins, mãe das gémeas Maitê e Lorena).
O Zolgensma "não é uma cura, mas um tratamento" e a reabilitação é a única ferramenta de que dispõem para tratar os filhos. "A escassíssima oferta de terapias que há, através de médico família, cinge-se a uma ou outra clínica, que, não sendo direcionadas para pediatria, tão pouco o são para crianças com patologias neuromusculares", asseguram, ainda, as mães.
Para conseguir pagar as terapias, os pais recorrem a peditórios nas redes sociais, a patrocínios de empresas e à ajuda das famílias. Cada sessão de terapia custa entre 40 a 50 euros, representando, no final do mês, um custo médio de cerca de 1500 euros.
O Ministério da Segurança Social não respondeu às questões do JN. Já fonte do gabinete de Maria Lúcia Amaral garantiu que serão pedidas todas as informações e procederão às investigações e inquéritos necessários, frisando que a provedora "não tem poderes de decisão vinculativos".
Saber mais
O que é a atrofia muscular espinhal?
A atrofia muscular espinhal é uma doença neuromuscular genética rara que afeta a parte do sistema nervoso responsável pelos movimentos musculares voluntários. A perda de neurónios motores resulta na fraqueza e atrofia muscular progressivas, com necessário impacto na parte respiratória, sendo necessário o uso de um ventilador e outros equipamentos de suporte vida. A parte cognitiva não é afetada.
Ao pormenor
Matilde e Natália foram as primeiras
Matilde e Natália foram as primeiras bebés em Portugal a receber, em 2019, o Zolgensma, um medicamento pioneiro para o tratamento da doença. O país uniu-se para custear o tratamento da bebé Matilde, mas o Estado decidiu custear o medicamento para as duas meninas.
Dezasseis crianças já medicadas
Desde 2019 até agora, 16 crianças com atrofia muscular espinhal (AME) tipo 1, o mais grave, e com idade inferior a quatro anos, já receberam a medicação que, de acordo com os pais, não é uma cura, mas o início do tratamento. Até ao Zolgensma, o AME era uma sentença de morte.