Mais de 44 mil falharam renovação obrigatória do título de condução aos 50 anos em 2021. Ausência de habilitação legal cresceu nos anos da pandemia.
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No ano passado, 44 566 condutores com 50 anos deviam ter renovado o título de condução e não o fizeram, de acordo com o Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT). Isto significa que milhares de pessoas estão a conduzir nas estradas com a carta caducada e arriscam uma multa, que pode chegar aos 600 euros. Os especialistas admitem que muitos podem ter-se esquecido ou confundido os prazos. Os dados mostram que aumentou o número de condutores detetados pelas autoridades sem habilitação legal, onde se incluem situações como a falta de título para condução, as cartas cassadas e as caducadas.
"As pessoas que se esquecem de renovar aos 50 anos são aquelas que têm uma carta de condução com validade até aos 65 anos [no verso]. Mas a lei mudou", diz Ricardo Vieira, diretor do centro de exames da Associação Portuguesa de Escolas de Condução. Ao JN, afirma que é a "Polícia que chama a atenção" aos condutores de que têm a carta caducada, muitos não sabendo que estão já a cometer uma infração rodoviária.
Desde 2008 que os condutores de automóveis ligeiros e motociclos são obrigados, por lei, a renovar a carta aos 50 anos. Na altura, o Instituto da Mobilidade e Transportes Terrestres - agora Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT) - disse que ia enviar cartas de aviso aos condutores.
Em 2012, o Governo introduziu um novo Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir, que prevê diferentes prazos de revalidação para os condutores habilitados antes ou a partir de 2 de janeiro de 2013. No caso de um veículo ligeiro, quem obteve o título antes daquele ano tem de renovar aos 50 anos. Quem recebeu depois, renova conforme o ano apontado na carta. Há, ainda, diferentes datas para quem tem o título desde 30 de julho de 2016 e consoante a categoria dos veículos.
"Falha do Estado"
"Podemos dizer que há uma falha enorme do Estado em não avisar as pessoas de que a validade da carta de condução vai terminar em tal dia", aponta António Reis, vice-presidente da Associação Nacional dos Industriais do Ensino de Condução Automóvel. O IMT, por sua vez, defende que a alteração das datas de revalidação foi "alvo de ampla divulgação".
Também durante a pandemia, os prazos mudaram mais do que uma vez. A validade das cartas foi prolongada devido ao agravamento da situação epidemiológica. João Dias, responsável pelo Núcleo de Investigação de Acidentes Rodoviários do Instituto Superior Técnico, alerta que, na faixa etária entre os 50 e os 60 anos, continua a existir "muita confusão". A solução poderia passar por um "envio de um e-mail pelo IMT ou as Finanças", defende.
No ano passado, a Polícia de Segurança Pública (PSP) contabilizou 8296 condutores sem habilitação legal. Os dados provisórios mostram um aumento de 14% face a 2020 (7264) e de 81% relativamente a 2019 (4578).
Para José Miguel Trigoso, presidente da Prevenção Rodoviária Portuguesa, era importante saber mais pormenores sobre os condutores. Conduzir com a carta cassada não é o mesmo que se esquecer de revalidar a carta, defende. "A taxa de sinistralidade grave das pessoas que conduzem sem carta tem um valor superior à das restantes", sublinha José Miguel Trigoso. Também João Dias avisa que alguém com a carta cassada está "habituado a ter comportamentos de risco".
Formação
1904 pessoas tentaram reaver título expirado
O IMT deu 755 formações a condutores que deixaram caducar as cartas num período superior a cinco anos e inferior a dez anos. Desde que o decreto-lei n.º 102-B/2020 de 9 de dezembro entrou em vigor, a 8 de janeiro de 2021, 1904 pessoas inscreveram-se na formação e tiveram de realizar uma prova prática.
Saber Mais
276 crimes
Até 16 de janeiro de 2022, a Guarda Nacional Republicana (GNR) dá conta que 276 pessoas não tinham título de condução, estavam com a carta cassada ou caducada. Os distritos de Lisboa, Porto e Setúbal têm mais infrações.
781 revalidações
De acordo com o Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), estão previstas 781 566 revalidações de carta de condução durante o ano de 2022. Os condutores podem fazer o registo na plataforma IMT Online para consultar a data de validade de cada categoria de condução.
Vítor veio do Brasil e não sabia que o título não estava válido
Vítor Barros foi um dos condutores mandados parar por uma operação de fiscalização da Polícia de Segurança Pública (PSP), à saída da cidade do Porto. Tem 52 anos e veio do Brasil no ano passado. A carta de condução portuguesa tem validade até 2034. Mas a lei mudou enquanto esteve além-fronteiras.
"Quando fui ao IMT [Instituto da Mobilidade e dos Transportes] para ter autorização para ser operador de TVDE, disseram que a minha carta de condução tinha um problema", contou ao JN. Apesar da validade no documento terminar daqui a 12 anos, o português de Leça do Balio, em Matosinhos, devia ter renovado aos 50 anos. "Estava no exterior e não sabia que tinham mudado as leis", acrescenta.
Agora, deu entrada no IMT de outro processo: Vítor Barros está à espera da troca da carta de condução brasileira pela portuguesa. "É mais fácil do que revalidar a carta de condução que tinha em Portugal", refere. O agente da PSP conseguiu consultar a informação numa base de dados do IMT e mandou-o seguir viagem.
Na operação de fiscalização realizada em março e que se concentrou em dois pontos da cidade do Porto, foi detida uma pessoa por condução sem habilitação legal e foi elaborado um auto de notícia por contraordenação devido a carta caducada. No primeiro mês de 2022 , aquela força de segurança registou 595 crimes por condução sem título de condução.
"São apanhados condutores com a carta caducada com alguma frequência, sobretudo por causa da pandemia", afirmou Cátia Moura, subcomissária da Divisão de Trânsito da PSP do Porto. A prorrogação dos prazos de revalidação durante os períodos de confinamento poderá ter confundido os condutores, explicou. Outros dizem "que se esqueceram".
Polícia atenta
A retoma da atividade está a trazer de volta mais movimento às estradas. Um facto que merece atenção por parte da PSP. "A nossa principal preocupação é que as pessoas com a vontade de ter diversão noturna não se esqueçam dos cuidados que devem ter", referiu ainda.
Cátia Moura adianta que o consumo de álcool é um dos maiores focos de atenção. Naquela noite, com 45 operacionais da PSP no terreno, houve cinco detenções por condução em estado de embriaguez e 13 autos graves e um muito grave devido ao álcool. "Pretendemos alertar que a Polícia está atenta e que vai fiscalizar estes comportamentos", frisou.
Em janeiro de 2022, a PSP contabilizou 666 crimes por condução sob o efeito do álcool, punível com prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias.
Mais dados
Grupo 1
Os condutores do grupo 1 ( AM, A1, A2, A, B1, B e BE, ciclomotores e tratores) devem renovar a carta aos 50 anos (habilitados antes de 2 de janeiro de 2013); na data que consta no título (habilitados depois de 2 de janeiro de 2013); e, de 15 em 15 anos, após a data da habilitação até perfazer os 60 anos (habilitados após 30 de julho de 2016).
Grupo 2
Os condutores do grupo 2 (C1, C1E, C, CE, D1, D1E, D e DE) devem renovar aos 40 anos (habilitados antes de 2 de janeiro de 2013); na data que consta no título (habilitados depois de 2 de janeiro de 2013); e, de cinco em cinco anos, após a data da habilitação até perfazer os 70 anos (habilitados depois de 30 de julho de 2016).
Multas
Até aos cinco anos de carta caducada, a multa pode oscilar entre os 200 e os 600 euros. Acima dos cinco anos, o condutor arrisca pena de prisão até dois anos ou multa de 240 dias.
Reaver
Quem tiver a carta caducada até dois anos pode revalidar sem formação ou exame. Até cinco anos, tem de realizar exame com prova prática. Entre cinco e dez anos, o condutor tem de frequentar uma formação e realizar prova prática.