Estudo acompanhou 562 pacientes de cinco hospitais do Grande Porto. Há dificuldades económicas entre os motivos para desistência dos tratamentos.
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Mais de metade dos doentes diagnosticados com dor crónica não toma a medicação prescrita pelo médico. A taxa de "não adesão" aumenta com o tempo e é justificada por dificuldades financeiras, problemas de comunicação com o prescritor e perceção de efeitos secundários e de "baixa necessidade" do fármaco.
As conclusões surgem num estudo desenvolvido por investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), que procurou compreender e descrever os motivos que levam os doentes a abandonar os tratamentos.
A investigação acompanhou durante um ano um total de 562 pacientes, que foram encaminhados para uma primeira consulta nas Unidades de Dor dos cinco hospitais do Grande Porto. Os resultados revelam que, ao final de sete dias, 37% dos doentes deixaram de seguir um dos tratamentos ou alteraram a sua toma.
Impacto da não adesão
A taxa de "não adesão" aumentou para mais de 50% durante os 12 meses de avaliação, "comprometendo a persistência dos tratamentos", notam os investigadores. A "não adesão" significa que um doente decidiu não seguir a prescrição do médico logo na fase inicial ou a meio do tratamento, quando altera as doses ou os horários das tomas, explicou Rute Sampaio, investigadora e docente da FMUP.
Estima-se que a dor crónica afete cerca de 37% dos portugueses. A não adesão à prescrição tem impacto na efetividade do tratamento e por consequência na saúde e bem-estar do doente.
Segundo a principal autora do artigo científico, há vários fatores que motivam a não adesão. "Alguns doentes" identificaram "constrangimentos financeiros". São doentes com múltiplas morbilidades que, na farmácia, optam por comprar outros medicamentos que não os da dor crónica, referiu.
A "comunicação pobre com o profissional de saúde" foi outra justificação. "Não significa que o profissional de saúde não saiba falar com o doente. Mas, por vezes, com o impacto emocional do diagnóstico de uma doença, o doente não ouve mais nada", salienta a investigadora, considerando que há um longo caminho a percorrer na área da Adesão Terapêutica. "É preciso envolver o paciente na tomada de decisão e aumentar a literacia em saúde", diz a autora do estudo, que também identificou uma relação entre a não adesão e determinados fármacos, nomeadamente os opioides e os anti-inflamatórios.
"Isto dá-nos pistas para fazermos intervenções dirigidas e promover o conhecimento dos doentes sobre os tratamentos", concluiu.
Ao detalhe
O que é a dor crónica?
É a dor que persiste para além dos três meses. Há vários tipos: primária, oncológica, pós-cirúrgica ou pós-traumática, neuropatia, orofacial, visceral e musculoesquelética (a mais prevalente).
Afeta mais de um terço
Estima-se que a dor crónica afete 37% da população. Pela prevalência e impacto é reconhecida como um problema de saúde pública.
Despesa elevada
No país, a dor crónica terá um custo anual de 4,6 mil milhões de euros, em custos diretos e indiretos.
Cinco hospitais
O estudo da FMUP foi feito com doentes das unidades de dor dos hospitais de Santo António, S. João, IPO, Gaia e Matosinhos.