Nos primeiros três meses do ano, 927 enfermeiros pediram escusa de responsabilidade devido à "degradação dos serviços", resultante da falta de profissionais, e a crescente carga horária. A Ordem dos Enfermeiros recebeu um total de 8664 declarações desde janeiro de 2021 até ao final de março deste ano.
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Vários fatores contribuem para este aumento "tão acentuado" , incluindo a "degradação dos serviços, sobretudo devido à falta de enfermeiros, o que leva ao incumprimento das dotações seguras, pondo em causa a qualidade e segurança dos cuidados prestados", alerta a Ordem dos Enfermeiros, num balanço divulgado esta segunda-feira.
Comparando com os dados agora conhecidos com os de há um ano, em período homólogo, a Ordem dos Enfermeiros recebeu mais 4400 pedidos de escusa por enfermeiros das várias regiões do país.
A Ordem dos Enfermeiros aponta que, no total, a região Centro é a mais afetada, contabilizando mais de 5300 pedidos de recusa de responsabilidade, destacando o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra com 245 só nos últimos três meses. Ao JN, a Ordem dos Enfermeiros adiantou ainda que, nesta zona do país, o Hospital de Leiria recebeu mais 138 pedidos.
A região Sul é a segunda zona do país mais afetada, com um total de 2363 declarações de escusa. Foi no Hospital Garcia de Orta, em Almada, que se registaram mais pedidos (341) nestes últimos três meses. Para dar conta da falta de condições nesta unidade hospitalar, ao JN, a bastonária dos enfermeiros, Ana Rita Cavaco, afirmou que desde que ali estiveram em visita, no final do mês passado, "foram retiradas as macas do corredor de internamento que já voltaram a ser repostas", uma vez que faltam camas para dar resposta ao número de doentes.
Segue-se o Hospital Amadora-Sintra com mais 284 pedidos. A ordem relembrou que pediu ao ministro da Saúde, Manuel Pizarro, que visitasse o serviço de urgência desta unidade hospitalar, em fevereiro deste ano, quando se encontrava "completamente sobrelotado".
A bastonária dos enfermeiros apontou ainda que, em 2020, Portugal tinha um rácio de enfermeiros de 7,3 por mil habitantes. Um valor que fica abaixo da média de 8,3 dos países da União Europeia, divulgado no último relatório Health at a Glance da OCDE e da Comissão Europeia.
Como resultado da falta de profissionais para responder ao número de doentes que têm de acompanhar, "a maioria dos enfermeiros que trabalha nos hospitais públicos faz cerca de 70 horas semanais, quando deveria trabalhar 35", alertou a ordem da classe, recordando como os vários estudos internacionais mostram que "por cada doente a mais a cargo de um enfermeiro, a mortalidade sobe 7%".
A Ordem dos Enfermeiros elencou também que "o excesso de trabalho, associado às más condições nos hospitais, leva muitos enfermeiros a trabalharem até ao limite e entrarem em situação de burnout", acrescentando que milhares emigram "à procura de melhores condições de vida e de trabalho, onde recebem uma remuneração justa e a valorização que tanto merecem".
Recorde-se que a declaração de recusa de responsabilidade foi disponibilizada - ainda durante a pandemia da Covid-19 -, para acautelar a eventual responsabilidade disciplinar, civil ou criminal dos enfermeiros face ao número de doentes a seu cargo.