Têm pouco mais de 20 anos e não veem um estalo, a perseguição nas redes sociais, o controlo do telemóvel ou o ciúme doentio como violência.
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Os episódios de violência no namoro começam cada vez mais cedo e estão a ganhar contornos mais graves. No ano passado, segundo o Observatório da Violência no Namoro, aumentaram os casos de violência sexual e ameaças de morte entre namorados. O mais recente estudo da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) revela ainda que mais de metade dos jovens portugueses já viveu situações de violência no namoro, a grande maioria sem o reconhecer.
A propósito do Dia dos Namorados, que se assinala esta quinta-feira, a Associação Plano i faz um balanço das denúncias que recebeu na plataforma online, principalmente do Porto, Braga e Lisboa. "Recebemos 101 denúncias de vítimas, ex-vítimas ou testemunhas", diz Mafalda Ferreira, criminóloga e coordenadora do Observatório para a Violência no Namoro. Mais de 90% das vítimas são mulheres, mas a violência no namoro também é feita por elas. E se em 2017 a média de idades era 29 anos, agora já está nos 22. "A violência começa cada vez mais cedo", diz.
Escalada de gravidade
Os casos acontecem em casa, na rua ou até online, e o ciúme é a principal desculpa. E estão a tornar-se mais graves. "A mais prevalente é a violência emocional, o insulto, o controlo. Depois, a violência física e social, a perseguição, que pode acontecer nas redes sociais. Mas, em 2018, tivemos um aumento de denúncias de violência sexual e de ameaças de morte. Está a ganhar contornos mais graves", explica a responsável. As denúncias de ameaças de morte no namoro aumentaram 12% num só ano e o grande problema para a escalada é a falta de reconhecimento das vítimas.
"A maioria das pessoas não denuncia junto das autoridades. Porque não reconhecem a gravidade dos comportamentos e porque têm receio da reação do agressor e da morosidade do processo", alerta Mafalda Ferreira.
Desde 2013, a Associação de Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) recebeu 680 pedidos de ajuda de vítimas de violência doméstica entre os 11 e os 25 anos. "Tem crescido o número de jovens que se queixam de violência no namoro. Mas como há dificuldade em reconhecer o que é violência por parte dos jovens, quando reportam, é porque já atingiu um nível de severidade que pode pôr em risco a própria vida", explica Daniel Cotrim, que diz que, em cada cinco raparigas, quatro acham que dar um estalo não é maltratar.
"Quando os ouvimos, percebemos que sentem que o ciúme é importante para a relação. Depois, há o forçar para ter relações sexuais, que as vítimas não relatam como agressão. O facto de não terem contado aos pais que namoram, aliado ao medo da rejeição pelo grupo de amigos, perpetua a violência", sustenta. No geral, Cotrim sente que os jovens de hoje têm um discurso de intolerância com a violência, mas, na verdade, tendem a desvalorizá-la por não a saberem identificar. "Começar a prevenção aos 12 anos já é tarde, porque já se instalaram mitos."
Protestos em 5 cidades
A Rede 8 de Março, coletivo de mais de 30 organizações, promove hoje vários protestos ruidosos contra a violência doméstica e a violência no namoro no Porto, Braga, Coimbra, Aveiro e Lisboa.
Jovens são conservadores
Mais de metade dos jovens universitários já sofreram violência no namoro e 34% assumiram ter exercido violência. O Estudo Nacional da Violência no Namoro em Contexto Universitário, da Plano i, concluiu que os jovens mantêm crenças conservadoras no namoro: há casos em que as mulheres provocam a violência e que o ciúme é prova de amor.
29.734 inquéritos iniciados, em 2018, pela Procuradoria-Geral da República por crimes de violência doméstica. Destes, só 4613 seguiram para julgamento.
118 queixas na PSP, no ano passado, referentes a violência no namoro por parte de vítimas menores. É o número mais alto dos últimos anos.
61,4% das vítimas são estudantes e na grande maioria os agressores são seus ex-namorados, segundo o Observatório da Violência no Namoro.
