Doentes muito críticos internados em Cuidados Intensivos com Covid-19 e que não respondem à ventilação mecânica invasiva estão a ser indicados para ECMO, uma máquina que faz a oxigenação do sangue fora do corpo, substituindo as funções do coração e dos pulmões.
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Desde o início da pandemia, os três centros de referência ECMO do país - hospitais de S. João, no Porto, Santa Maria e S. José, em Lisboa - já usaram este procedimento "fim de linha" em 17 doentes com o novo coronavírus. Um morreu, um recuperou e outro está a apresentar francas melhorias.
Os números parecem animadores, mas "ainda é cedo para balanços", alerta Roberto Roncon, coordenador do programa ECMO (oxigenação por circulação extracorporal, na sigla inglesa) do Centro Hospitalar e Universitário S. João.
Progressão é lenta
Naquele hospital, há 12 doentes Covid-19 tratados com ECMO, sendo que um já recuperou. É uma mulher de 47 anos sem doenças associadas, que já teve alta dos Cuidados Intensivos. Para os restantes, o prognóstico mantém-se reservado. "O que podemos dizer é que, quando entram em ECMO, há uma estabilização, mas a progressão é lenta, precisam provavelmente de semanas", diz Roberto Roncon.
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Em Lisboa, há dois centros de referência ECMO. No Hospital de Santa Maria, a técnica está a ser usada em três doentes com pneumonia provocada pelo SARS-COV-2, "havendo já evidência de um doente com franca recuperação do seu estado funcional respiratório", respondeu ao JN o diretor do Serviço de Medicina Intensiva do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte. João Ribeiro acrescentou que o serviço tem oito ECMO, mas a capacidade deverá "aumentar a curto prazo para 14", estando seis máquinas em fase de aquisição.
No Hospital de S. José (Centro Hospitalar e Universitário Lisboa Central), há oito máquinas ECMO e o suporte orgânico foi usado em dois doentes: um, com 73 anos, que acabou por morrer por complicações associadas à doença; e outro, de 29 anos, que está em tratamento, informou fonte oficial do hospital.
O ECMO é uma técnica complexa e usada em último recurso, quando os doentes não evoluem com o tratamento convencional, no caso, a ventilação mecânica invasiva. As estatísticas internacionais, recorde-se, mostram que o novo coronavírus provoca doença respiratória aguda grave em 5% dos doentes.
"Há uma grande procura de ECMO na Covid-19 e isto acontece porque há doentes relativamente novos e sem patologia associada com formas muito graves da doença", sublinha Roberto Roncon. E para esses não há limites terapêuticos. No S. João, os doentes que estão a usar este suporte têm entre 33 e 64 anos. O hospital tem mais dois ECMO com doentes a recuperar de gripes "extremamente graves".
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A capacidade está quase no limite e por isso a referenciação tem de ser muito rigorosa. "Só em último recurso, quando não há alternativa e quando achamos que os doentes podem efetivamente beneficiar", explica o intensivista. Não basta ser novo, é importante não ter doenças associadas para cumprir os critérios. "Temos receio de alguém precisar e não termos ECMO disponíveis. Ainda não aconteceu, mas temos de ser extremamente rigorosos", frisa.
Dos 12 doentes tratados com ECMO no S. João, apenas três são da área do hospital. Os restantes vieram do Santo António, de Aveiro, Guimarães, Matosinhos, Viseu... "Telefonam-nos e vamos lá buscá-los porque não sobreviveriam ao transporte sem ECMO", assegura Roberto Roncon.
Técnica cada vez mais usada na Europa
É uma máquina que faz a oxigenação do sangue fora do corpo, substituindo a função pulmonar e cardíaca. Em cuidados intensivos, o sangue é extraído por uma artéria e, ao passar pela máquina, é-lhe removido o dióxido de carbono e adicionado oxigénio. Depois, volta ao corpo por outra veia. O objetivo é manter o doente vivo até que haja recuperação das funções perdidas. Em emergência pré-hospitalar é utilizada para preservar os órgãos abdominais de uma vítima mortal para transplante.
máquinas de oxigenação por circulação extracorporal nos três centros de referência ECMO: os hospitais S. João, Porto, S. José e Santa Maria, Lisboa. Este último aguarda seis novos equipamentos.
Espanha, Alemanha e, mais recentemente, Itália têm recorrido ao ECMO para tentar salvar doentes Covid-19 muito críticos. "Em todos os países da Europa, o número de utilizações ECMO está a aumentar", refere Roberto Roncon, responsável pelo programa ECMO no S. João. O hospital participa num estudo europeu (ECMOCard) que está a avaliar os resultados da utilização desta técnica em doentes Covid. "A experiência internacional mostra que os resultados da ventilação mecânica invasiva não são muito bons, há uma mortalidade muito elevada", contextualiza o especialista, considerando que "é lícito pensar que pode existir uma alternativa".