DGAV não contabiliza as ocorrências. PAN pretende voltar a tentar criminalizar as agressões e a morte dos animais não de companhia.
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São "animais de ninguém". Legislação avulsa e ausência de criminalização fazem com que pouco aconteça a quem agride, maltrata ou abandona um animal que não seja de companhia, como os de pecuária. As situações mais flagrantes abrangem cavalos e burros. Ninguém sabe sequer quantos são maltratados e resgatados, nem a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV).
A maioria dos animais de pecuária resgatados do abandono ou de maus-tratos, por falta de abrigos, acaba por ir para abate. No Dia Internacional do Animal Abandonado, que se celebra este sábado, o PAN adianta que, na próxima sessão legislativa, vai insistir com a criminalização da morte e maus-tratos de todo o tipo de animais.
Num trabalho sobre "Crimes contra animais de companhia", de Ana Catarina Beirão Pereira, o Centro de Estudos Judiciários é claro: a lei de proteção animal apenas abrange animais de companhia. Ou seja, animais como cavalos, cabras, patos, burros, cães de caça ou coelhos apenas podem ser protegidos por aquele diploma quando "efetivamente sejam detidos", no momento da prática do crime, por seres humanos, "no seu lar e para seu entretenimento".
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Ou seja, maus-tratos ou morte com dolo de animais "para fins de exploração agrícola, pecuária ou agroindustrial", assim como "para fins de espetáculo comercial" só podem ser puníveis com uma contraordenação. "Se não estiver inscrito como animal de companhia, não é claro que, com a lei, se consiga sancionar os maus-tratos", confirma ao JN a líder parlamentar do PAN, Inês Sousa Leal.
Sem apoios do Estado
No último ano, a associação Animal Save resgatou mais de 300 animais de não companhia, vítimas de maus-tratos ou abandono. "São animais de ninguém", lamenta Noel Santos, criticando a legislação por praticamente conduzir esses animais "para abate".
A DGAV diz que procura sempre um abrigo nos centros de recolha oficiais (CRO). Mas não sabe dizer quantos animais de não companhia são resgatados. "A Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) não tem a informação referente a animais de pecuária resgatados trabalhada de forma a que permita quantificar estas ocorrências", assume, ao JN.
"Por regra, essas estruturas são as primeiras a ser contactadas. No caso de o CRO não dispor de espaço ou condições adequadas para alojar animais de determinada espécie, são contactadas outras entidades públicas ou privadas. A título de exemplo, a GNR, no caso dos cavalos", especifica.
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"A DGAV vê os animais como produto. Está ao lado dos produtores", acusa, porém, Noel Santos. "O tempo que nos dão para resgatar um animal é muito pouco. Já aconteceu estar no Algarve e darem-me três horas para ir buscar um cavalo a Lisboa", conta, por sua vez, Carla Sananda, da Cabana Santuário Animal.
A DGAV também assegura que os custos associados à recuperação dos animais "são suportados pelo proprietário ou detentor dos animais". Carla garante que nunca teve apoios, mesmo quando é acionada por entidades públicas. E que até já foi multada, ao transportar um cavalo, a pedido da GNR.
"Deixados a morrer à fome"
"No caso dos cavalos, as situações são flagrantes. São deixados a morrer à fome em descampados. Há cavalos agredidos até à morte. Não podemos continuar indiferentes ao sofrimento animal", denuncia a deputada Inês Sousa Leal.
Por isso, na próxima sessão legislativa, o PAN vai insistir na criminalização dos maus-tratos "a todos os animais que estão sob a proteção de um ser humano, mesmo que sejam criados para consumo".
O PAN ainda está a estudar a moldura penal que irá propor, para se garantir a "proporcionalidade". A ideia é acabar com "a manta de retalhos" de legislação e chegar-se a uma "lei-mãe" que proteja todo o tipo de animais e se puna, por exemplo, com pena de prisão quem agrida um animal de pecuária até à morte e se aplique uma contraordenação no caso de um animal abandonado, sem riscos para a sua vida.
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Abate em centros autorizados
O diploma que o PAN pretende entregar na próxima sessão legislativa só abrange maus-tratos sobre animais de pecuária como cavalos, vacas ou cabras. Ou seja, a produção e o abate em centros autorizados continuarão a ser permitidos, se a iniciativa legislativa for aprovada.
Consumo próprio continua autorizado
O projeto de lei do PAN também não vai criminalizar o abate de animais para consumo próprio, como galinhas ou coelhos. Isto é, continuará a ser possível abater uma galinha para fazer arroz de cabidela ou outro prato, desde que seja para consumo próprio.
Desinfestações de fora do diploma
A iniciativa legislativa também não visa impedir que se faça, por exemplo, desinfestação de ratos ou baratas. Visa penalizar quem cause sofrimento gratuito a qualquer animal. Por exemplo, penalizar o abandono de um animal para morrer à fome.