Há mais famílias a pedirem dinheiro para pagar contas. A Diocesana do Porto está a receber pessoas encaminhadas pela Segurança Social. O Banco Alimentar apoia 440 mil.
Corpo do artigo
Num país com mais de dois milhões de pobres, a crise provocada pela pandemia veio arrastar muitos mais para aquela condição. Os pedidos de ajuda são tantos, que as instituições estão sem capacidade de resposta. Aos alimentos, somam-se pedidos monetários para saldar contas essenciais. A Cáritas já só consegue apoiar metade de quem a procura. O Banco Alimentar está a ajudar mais 60 mil portugueses. E a AMI viu as solicitações dispararem. A este ritmo, não haverá solidariedade que chegue.
A situação na Cáritas é crítica. "Apoiamos metade dos que precisam do nosso apoio. No segundo trimestre, estávamos a atender 21.410 pessoas, mas, em termos de procura, ronda as 48 mil", explica ao JN Eugénio Fonseca. Pessoas que, diz, tiveram de "reencaminhar para outras entidades por falta de capacidade".
Sem receitas - a grande fonte é o peditório anual, que este ano não se realizou -, a Cáritas libertou já mais de 130 mil euros de fundos próprios. Dinheiro que não estica. Isto porque são cada vez mais as pessoas - desempregadas, trabalhadores em lay-off, imigrantes - que pedem ajuda monetária para pagar a renda da casa ou contas de água e luz.
"O Governo criou, e bem, as moratórias. Mas as pessoas não quiseram concorrer porque iam comprar mais problemas", diz o líder da Cáritas Portuguesa. O problema chama-se endividamento, num efeito bola de neve. Porque "a partir de janeiro vão ter que pagar as despesas mais a parte da dívida, numa espiral de endividamento das famílias", prossegue. Avisando Eugénio Fonseca que "não se pagam contas com alimentos e roupa doada".
Onde pára o Estado Social?
Na Diocesana do Porto, a situação caminha para a insustentabilidade, revela o seu presidente. Segundo Paulo Gonçalves, receberam o "dobro dos pedidos relativamente ao ano anterior". E, sem os 50 mil euros que entram nos cofres via peditório, estão a acudir a todos.
Ciente de que a manter-se este ritmo, terá de se repensar a instituição, o responsável revela que irão "terminar o ano com o resultado líquido mais negativo da história". E ao prejuízo junta-se a indignação de Paulo Gonçalves com a Segurança Social (SS) que, denuncia, está a encaminhar cidadãos, concretamente imigrantes sem registo na Previdência, para a Cáritas. "O Estado, uma vez mais, não está a fazer o seu papel. Porque quando precisamos, acolhemos bem. Mas, à primeira dificuldade, não estando registado, a SS, com muita surpresa e indignação nossa, reencaminha para a Cáritas", dispara.
Banco Alimentar apoia 440 mil
Criada em março como uma resposta temporária, a Rede de Emergência Alimentar, "infelizmente, vai manter-se", frisa a presidente da Federação dos Bancos Alimentares. Pelas contas de Isabel Jonet, estão hoje a ser apoiadas 440 mil pessoas, mais 60 mil face ao nível pré-pandemia.
Na AMI [ler ao lado], a situação repete-se: findo o confinamento, o número de novos casos disparou 55%. Num total de cinco mil pessoas apoiadas no final do semestre, na sua grande maioria portugueses, sem trabalho e com baixas habilitações literárias.
Governo
Medidas excecionais para 2,2 milhões
Questionado pelo JN sobre se está a ser desenhada uma estratégia nacional de combate à pobreza, o Ministério do Trabalho destacou uma série de "medidas extraordinárias criadas no âmbito do sistema de proteção social para manter o emprego e proteger os rendimentos" que, até ao momento, "abrangeram 2,2 milhões de pessoas". Entre as iniciativas, a duplicação do programa alimentar POAPMC para 120 mil pessoas, a prorrogação automática do subsídio social de desemprego até dezembro e a aprovação de candidaturas para apoio a 583 pessoas em situação de sem-abrigo para integração em respostas habitacionais.