Perto de 20 milhões de receitas/mês são enviadas para o telemóvel. Processos clínicos e exames digitalizados. Só com a uniformização de software, a poupança pode chegar a um milhão de euros/ano.
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Em dois anos, dos 52 hospitais da rede pública, 35 já quase não usam papel, mas ainda há 13 que se recusam a aderir a esta modalidade que permite que mensalmente mais de 19 milhões de receitas deixem de ser impressas. O objetivo é fácil de entender: menos papel e informação digitalizada, acessível a utente e profissionais de saúde, em qualquer parte do Mundo, à distância de um clique. Mais segurança, menos burocracia. A ideia é simples, mas obriga a alterações profundas no funcionamento dos serviços e, sobretudo, a mudar mentalidades.
O projeto "SNS Sem Papel" nasceu em 2017 pela mão dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS). A ideia era "desmaterializar e simplificar processos e fluxos" e "privilegiar o registo eletrónico de forma a melhorar o acesso à informação, por parte dos cidadãos e profissionais" no Serviço Nacional de Saúde (SNS)".
Dois anos depois, segundo os SPMS, dos 52 hospitais existentes em Portugal, 35 já fazem parte do projeto e contam, em média, taxas de desmaterialização de 75% (quando a média nacional é de 12,4%), estimando-se que atinjam os 100% no final do ano. Nos cuidados de saúde primários, a informatização está próxima dos 80%.
O fim do papel é a face mais visível do projeto, mas a verdade é que o "SNS Sem Papel" obriga a alterar métodos de trabalho que têm décadas. E esbarra, muitas vezes, na resistência de quem tem mais dificuldades com as novas tecnologias.
"É todo um conjunto de circuitos que muda. Não é um processo simples, mas é possível e tem ganhos extraordinários", explicou, ao JN, o presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Póvoa de Varzim/Vila do Conde, Gaspar Pais.
Adesão voluntária
Se todos aderissem e trabalhassem na mesma plataforma, no Algarve ou no Minho, um médico poderia ter acesso exatamente às mesmas informações sobre o doente. Apesar de tudo, a adesão dos hospitais "não é obrigatória". Há 13 instituições que já disseram não ter interesse em participar. Inicialmente eram 25. Depois de algumas formações e reuniões com os SPMS, são 35 as aderentes, isto é 67%.
Ainda assim, os SPMS fazem um balanço positivo: "Já foi ultrapassada a parte mais difícil, que era o pensamento intrínseco de que o digital implicava desumanizar a saúde, tornando-a fria e distante. Em oposição, o que temos é a mudança de pensamento, quer dos profissionais, quer dos cidadãos que consideram fundamental o acesso à sua informação de saúde, independentemente da área geográfica, e sentem que as instituições estão mais próximas".
Poupar licenças de programas
A par, avança o trabalho com a tutela para mudar normas e despachos do que ainda não pode ser desmaterializado. Como as autorizações de cirurgia.
Atualmente, há mais de dois milhões de utentes com Registo de Saúde Eletrónico e a aplicação My SNS Carteira conta já com quase um milhão de downloads. Entre outros, permite, em qualquer lugar, o acesso ao boletim de vacinas ou às alergias diagnosticadas.
Além da redução drástica no papel - e da consequente vertente ambiental -, há outras poupanças. A título de exemplo, o Centro Hospitalar Universitário e o Instituto Português de Oncologia de Coimbra foram informatizados com software dos SPMS, o que permitiu poupar 250 mil euros/ano de manutenção de programas instalados por fornecedores externos. Se todos o fizerem, a SPMS estima uma poupança superior a um milhão/ano.
Exceção
385 inadaptados ganharam mais tempo
Em 2019, com o arranque da prescrição eletrónica médica (PEM) obrigatória, 385 médicos foram certificados pela Ordem dos Médicos como "inadaptados informáticos". Tinham "regime de exceção" até 31 de março. O prazo foi prorrogado até 31 de dezembro, dada a dificuldade de avançar com as previstas ações de formação para tirar dúvidas e ajudar na adesão à PEM Privados, PEM Móvel e Chave Móvel Digital devido à pandemia. Dos 385 inadaptados, os SPMS dizem que cerca de 30% já aderiram à PEM Privados ou à PEM Móvel". Em meados de junho, eram já mais de 13 mil os médicos registados na PEM Móvel. Para esses, receitas em papel só em caso de falência do sistema informático ou quando o utente não possa receber a prescrição via telemóvel.