De Guimarães a Setúbal, são muitos os que anseiam por meter as mãos na terra sem sair das cidades. Câmaras aumentam áreas para atividade, o que traz ganhos sociais e ambientais.
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Há milhares de pessoas à espera de um terreno para poderem cultivar hortaliças ou fruta nas cidades. Para muitos, é uma forma de ajudar a equilibrar o orçamento familiar de forma barata e saudável.
Nos 17 municípios (capitais de distrito ou parte das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto) que responderam ao JN dizendo ter hortas urbanas comunitárias, contam-se mais de 6000 pessoas em lista de espera. Aguardam vez para se juntarem aos mais de 4500 agricultores citadinos que já cultivam talhões nos concelhos do Porto, Gaia, Valongo, Matosinhos, Feira, Póvoa de Varzim, Guimarães, Cascais, Sintra, Setúbal, Odivelas, Sesimbra, Vila Franca de Xira, Loures, Palmela, Leiria e Coimbra, ocupando uma área total de 48 hectares.
A Câmara que tem mais interessados em meter as mãos na terra é Cascais, com cerca de 1900 pessoas a aguardar vaga. Segue-se Gaia, com 1145, Porto, com perto de 1000, Matosinhos, com 950, Sintra, com 400 e Loures, com cerca de 300. Feira e Odivelas não têm candidatos à espera de vez e em Coimbra há apenas um.
Pandemia impulsionou
Vários municípios dão primazia a quem evidencia mais necessidades. É o caso de Sintra, que dá "prioridade a famílias carenciadas, numerosas e residentes próximo do local das hortas".
A esmagadora maioria dos municípios revelaram ao JN que têm sentido grande procura, sobretudo desde que em 2020 a pandemia de covid-19 atingiu o país, pelo que têm vindo a aumentar as áreas. Matosinhos inaugurou este mês a Horta das Ribeiras e são vários os concelhos que deram nota de planos para criar novas hortas ou alargar as já existentes.
Mas nem sempre é fácil encontrar terrenos vagos nas cidades. Nas áreas "onde se verifica uma maior procura de talhões, no perímetro urbano, é onde existe menor disponibilidade de terrenos", conta a Câmara Municipal de Gaia. Ali, uma das soluções encontradas foi "a celebração de contratos de comodato com proprietários de terrenos sem ocupação que os disponibilizaram para a instalação de hortas urbanas". A utilização dos terrenos para a instalação de hortas urbanas, revela Gaia, "resultou numa requalificação dos espaços através da atribuição de uma função aos mesmos, na transferência dos custos de manutenção para os hortelãos e na melhoria da qualidade ambiental, estética e social da paisagem urbana".
Qualidade ambiental
No Porto, a Câmara sublinha que a "agricultura urbana tem estimulado a cidade com as suas multifuncionalidades, desde a produção de alimentos ao benefício no ambiente urbano. As hortas urbanas têm despertado um crescente interesse, pelo reconhecimento do seu desempenho a nível ambiental, social e económico, e potenciadores da promoção da educação ambiental".
Em Valongo, adianta José Manuel Ribeiro, presidente da Câmara e administrador da Lipor, o "objetivo é ter cada vez mais famílias, escolas e associações a praticar agricultura urbana, a fazer a compostagem dos resíduos biodegradáveis, a colher e a consumir produtos hortícolas biológicos e a usufruir de todos os benefícios da vida ao ar livre".
Ambientalistas
Zero defende espaços produtivos de proximidade
Os espaços públicos urbanos podem ser transformados em "espaços produtivos de proximidade", seja através da plantação de árvores de fruto, de culturas diversas ou ervas aromáticas, defende Pedro Horta, da associação ambientalista Zero. "A agricultura urbana e periurbana deve ser uma primeira linha de produção alimentar e as autarquias devem pensar nisso quando fazem os planos de ordenamento", acrescenta. E acrescenta que os municípios têm um "papel forte na promoção destes espaços", mas há também associações, cooperativas e outras organizações a promoverem ações semelhantes. Quem procura os terrenos, diz, tem "perfil e motivações muito diversas", sendo que, além de questões económicas, muitas vezes procura-se também o "bem-estar, convívio com a comunidade e controlar a qualidade dos alimentos".
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Simbólico ou grátis
Alguns municípios, como Porto, Matosinhos, Povoa de Varzim e Cascais, disponibilizam os terrenos gratuitamente, mas a maioria das autarquias cobra preços simbólicos, que podem ir de 1,5 euros/mês (Feira) até 7,5 euros/mês (Setúbal).
Compostagem
Nas hortas do Porto (do município ou em parceria com instituições), estão instalados "400 compostores que permitem a devolução ao solo de 120 toneladas de matéria orgânica por ano".