A manifestação foi convocada pelo movimento STOP IUC, nascido nas redes sociais. Só em Lisboa mais de 500 carros e muitas motas desfilaram, este domingo à tarde, em marcha lenta contra o agravamento de imposto que dizem "ilegal" e "injusto".
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"STOP Inaceitável Usurpação ao Contribuinte (IUC)", "Chega de hipocrisia ambiental" ou "incentivo ao abate da vigarice" são alguns dos slogans colados nos carros que, esta tarde, desceram a avenida da Liberdade contra o aumento do IUC para carros anteriores a junho de 2007
O protesto repete-se em mais 10 capitais de distrito, como Porto, Braga, Aveiro, Bragança, Faro, Castelo Branco ou Viseu. Em Lisboa, a concentração feita no topo do Parque Eduardo VII desceu, em marcha lenta a avenida da Liberdade até ao Rossio e voltou para trás. O som das buzinas era ensurdecedor para mostrar "cartão amarelo" ao Governo.
Fernando Sá, um dos organizadores, garante "que, se nada for feito, não vão ficar por aqui". Milhares nas ruas, quase 400 mil assinaram a petição. "O Governo tem de olhar para a dimensão da indignação". O movimento que defende a eliminação da norma já foi recebido por grupos parlamentares e até o PS admite pretender fazer alterações, sublinham os organizadores.
Pedro Ladeira, junto ao seu volkswagen golf de 2002, exibe num cartaz a certeza de que a medida é "ilegal". Ao JN garante que o código do IUC não prevê aumentos.
"Os carros não vão mudar de características nem emitir mais emissões entre 31 de dezembro e 1 de janeiro", defende. O Governo, acusa, está a querer aplicar uma dupla tributação e o presidente da República, deputados ou provedor de Justiça devem enviar a norma para o Tribunal Constitucional. Antes, considera, deve ser entregue uma providencia cautelar para evitar que a norma entre em vigor a 1 de Janeiro.
Valter Luís, mecânico, vai todos os dias de Torres Vedras para Lisboa trabalhar e levar os filhos à escola no seu Nissan Micra de 1993. É o que tem. A medida, argumenta, não pretende proteger o ambiente ou incentivar o abate mas agravar ainda mais os impostos. "Pago IUC para quê? Já pago seguro, portagens, estacionamento. O IUC vai ser mais caro que o valor do carro", assegura.
Paulo Carrilho, professor de EVT e "mecânico autodidata", tem o hobby de comprar carros baratos e restaurá-los "devagarinho". Tem 17, "todos anteriores a 2007". Paga de IUC entre 10 a 80 euros e, com a nova fórmula, todos os carros vão pagar mais de 100 euros por ano. A norma travão ou o argumento ambiental são "histórias da carochinha".
A seu lado está João Silva, que tem cinco carros, igualmente anteriores a 2007, e acusa o Governo de "arrogância". "É uma vergonha, um Governo do PS, que se diz de Esquerda, estar constantemente a meter as mãos nos nossos bolsos e agora até querer limitar a nossa liberdade individual. Não quero um carro novo, nem eléctrico" , diz João Silva.
A “medida tem de cair”
No Porto, nos Aliados, centenas de automobilistas e motociclistas entupiram o início da Avenida, cercando a Câmara Municipal do Porto, contra o aumento do IUC para veículos anteriores a 2007. O primeiro-ministro, António Costa, e o ministro das Finanças, Fernando Medina, foram os políticos mais visados pelos manifestantes.
Ao JN, Hugo Reis, representante do Norte do movimento cívico STOP IUC, considerou que a “medida tem de cair”, mas admitiu uma “revisão” da lei. “Não vale a pena tentar legislar em cima de uma lei que já tem muitos defeitos. Mas é possível fazer uma revisão da lei, na perspetiva de melhorar o ambiente, medindo as emissões dos carros ou os quilómetros que cada carro faz”, explicou, inovando no cálculo do IUC.
“Um automóvel que tenha sido comprado há dois anos por oito mil euros, a partir do momento em que esta lei entre em vigor, mesmo que seja 25 euros por ano, que nós temos sérias dúvidas, passa a valer metade. É o património das famílias que está a ser atacado com uma lei que não tem fundamentação lógica”, acrescentou.
Na manifestação podiam ler-se cartazes com as frases “Não é com mais impostos que vamos ter dinheiro para carro novo” ou “O ambiente não é desculpa para sustentar a corrupção”.
Daniel Silva, de 28 anos, é de Ovar e foi de propósito ao Porto para a manifestação. “Trouxe a minha mascote. É um esqueleto, é português e tem os impostos em dia e está à espera que o António Costa baixe os impostos”, ironizou. O jovem tem quatro carros antigos, com matrículas de 1984 a 1990, e está preocupado com a possibilidade de aumento do IUC nos próximos anos. “Os meus carros andam pouco, mas vou ter que pagar um balúrdio. Com os impostos que já pagamos, este aumento é insustentável”, notou ao JN.
De Oliveira de Azeméis, Tito Cardona, de 36 anos, reuniu um grupo de 10 amigos para demonstrar o seu desagrado pela medida. “Em vez de subirem os impostos, se aumentarem o poder de compra das pessoas já conseguem renovar o parque automóvel em Portugal. Não é com mais impostos que vão conseguir baixar as emissões de CO2”, adiantou.
Tito Cardona explicou que tem dois automóveis, “um de 1991 e outro de 1994”, que vão ser visados pelo aumento do imposto. “Temos que ter obrigatoriamente carros porque no interior do país não há transportes públicos. A ganhar um ordenado mínimo e a pagar a prestação da casa não conseguimos comprar um carro novo”, admitiu.
Tito Cardona também não tem grandes expectativas quanto aos incentivos do Governo para a compra de um carro novo. “Ninguém se vai entalar num crédito para comprar um carro novo. Neste momento os 25 euros fazem falta”, finalizou.