A tristeza da partida de um filho na terra pesa em todas as conversas no Jardim Municipal de Campo Maior. Não há quem não conheça Rui Nabeiro e, no dia da sua morte, o repouso de domingo no banco de jardim é temperado pelas memórias do empresário.
Corpo do artigo
Manuel Romão trabalhou, lado a lado, com Rui Nabeiro durante 30 anos. Aos 70 anos, recorda os dias como motorista da Delta e só tem elogios a fazer ao patrão, na certeza de que a sua morte não limitará o futuro da empresa de café e de Campo Maior. "A primeira coisa que aprendi com o senhor Rui foi que, quando os outros vão para lá, nós já temos de ter chegado. Os clientes são sempre a nossa prioridade", relembra. Dos dias passados na estrada, sublinha a diferença dos motoristas da Delta para o de outras empresas.
"Os funcionários da Delta não estavam autorizados a dormir nos camiões. Em viagem, dormíamos sempre em hotéis ou em instalações da empresa", explicou. Questionado sobre o futuro da Delta, foi dos poucos que não mostrou receio. "O Rui Miguel e o Ivan, os netos, estão preparados".
Maria Pereira, de 78 anos, tem medo pelo seu filho que trabalha na empresa, seguindo as pisadas do pai, Fernando Pereira, hoje com 76 anos. "Vamos sentir a falta de Rui Nabeiro. Não sabemos o que o futuro nos espera", lança, receosa. Maria era "novinha" quando conheceu o empresário. A mãe de Maria trabalhava na casa da avó de Rui Nabeiro. "Mesmo depois de rico, era uma pessoa que falava com todos. Estamos muito tristes". Quando o marido deixou de receber o salário na empresa onde trabalhava, Maria bateu à porta de Rui Nabeiro e este não hesitou em dar-lhe trabalho. "Fui lá a casa e fui logo atendido. O mesmo aconteceu quando fiquei doente. Nunca me recusou ajuda", frisou Fernando Pereira, agradecido.
Deu cartão de saúde
Entre o grupo de amigos reunido no jardim municipal, é unânime a ideia de que sempre que uma pessoa precisava de ajuda monetária ou de qualquer outro género de apoio, como o empréstimo de um carro para ir ao hospital em Lisboa, o empresário nunca se negava a ajudar. Só não ajudava se não pudesse. Carlos Trabuco, 82 anos, dá testemunho da generosidade.
"O senhor Rui era homem de ajudar os outros. Bastava bater-lhe à porta. Falava com todas as pessoas. O dinheiro nunca lhe subiu à cabeça". Jacinta Trindade confirma e espera que os filhos e os netos seguiam o exemplo do senhor de Campo Maior. "Ele dava trabalhos a pais, a filhos e a netos. Os meus sobrinhos, logo que tiraram os seus cursos, arranjaram trabalho na Delta. Espero que o mesmo aconteça aos seus filhos".
O empresário é lembrado, também, por uma inovação que criou para os funcionários, garante, do alto dos seus 73 anos, António Sérgio. Numa altura em que quem queria ir ao médico, tinha de ir ao centro de saúde, "o senhor Rui criou o cartão de saúde para os funcionários. Foi muito inovador". António tinha 16 anos quando conheceu Rui Nabeiro. "Nessa altura, ele ainda moía o café de uma forma artesanal". E, quando percorria a pé as ruas de Campo Maior, cumprimentava sempre quem vinha. João José lembra-se bem de ver Rui Nabeiro passar na rua e de falar com todas as pessoas. "A sua morte é uma grande perda para Campo Maior e para a Delta".